Marina Silva é a nova candidata da Assembleia de Deus
Maior igreja evangélica do Brasil, com 12,3 milhões de fiéis, Assembleia de Deus abandona Pastor Everaldo e abraça candidatura de Marina Silva
A maior igreja evangélica do país, com 12,3 milhões de fiéis, já trocou de candidato de forma extraoficial e deve anunciar oficialmente a mudança de posição em favor de Marina Silva (PSB) nesta semana, quando pastores da Convenção Geral das Assembleias de Deus do Brasil (CGDB) se reunirão com o Pastor Everaldo (PSC), até então o presidenciável oficial.
Parte do grupo espera externar um movimento que já ocorre nos vários templos da igreja, onde seus membros são orientados a votar na ex-senadora. Há até bordão: “Irmão por irmão, votem em quem pode ganhar a eleição.” Assim como Everaldo, Marina é da Assembleia de Deus.
O presidente do Conselho Político da CGADB, pastor Lelis Washington Marinhos, confirmou o encontro com os candidatos e afirmou que o fato de Marina pertencer à igreja “terá peso na decisão”.
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Ele afirma ainda que, após as eleições, a denominação dará início ao recolhimento de assinaturas para a criação de um novo partido, no qual possa abrigar congressistas da igreja ou que defendam seus princípios religiosos. Nesta legislatura, a Assembleia de Deus tem 26 deputados federais espalhados por vários partidos. A CGADB espera eleger, além dos atuais, mais oito candidatos para a Câmara.
“Existe, sim, a ideia (de criação da legenda), onde poderemos alinhar nossos parlamentares e na qual eles possam defender nossas agendas com liberdade”, admite o pastor.
A opinião interna é de que não haverá dificuldade no recolhimento das assinaturas, pois a denominação é bastante capilarizada no país. “Não queremos colocar a igreja no poder. O que queremos é que assumam o poder candidatos que creiam em Deus e que defendam nossos princípios”, explica ele, listando o aborto e a oposição ao casamento entre pessoas do mesmo sexo como agendas inegociáveis.
Se levar a cabo a ideia, a Assembleia de Deus se juntará à Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), que, com 1,8 milhão de seguidores, tem sua própria legenda, o PRB.
Entretanto, a influência dos líderes religiosos sobre a escolha do candidato a presidente é limitada, na opinião do cientista político Paulo Baía, da UFRJ. Para ele, a opção do eleitor evangélico para os cargos executivos é mediada por outros fatores, além da própria experiência.
Um exemplo disso é a vendedora Claudia Vieira Cavalcante. Todos os domingos, ela atravessa a rua de casa, às 19h, para ir ao culto na Assembleia de Deus Cristo Vive, em Belford Roxo, onde mora.
Com 32 anos, ela quer ser pastora e estuda Serviço Social, numa universidade particular, graças a bolsa do ProUni. Votará na presidenta Dilma Rousseff (PT), embora seu pastor tenha inicialmente pedido voto para Everaldo e, mais recentemente, para Marina.
“Claro que levo em consideração o que diz o meu pastor, mas sua autoridade sobre mim está nas questões espirituais. Como cidadã, voto com minha consciência”, diz.
Religião não influencia na hora do voto
Como Claudia, a empreendedora Janaína Aparecida Tadeu, 39, de Duque de Caxias, diz que votará na presidenta Dilma, e garante que sua escolha é orientada exclusivamente pela própria consciência.
Evangélica, ela frequenta a Iurd. Segundo ela, a igreja ainda não sugeriu candidato para a Presidência. “Só ao governo do estado, o Marcelo Crivella”, afirma ela, citando o bispo licenciado, que também é sobrinho de Edir Macedo.
Claudia e Janaína estão dentro da faixa dos 22,2% da população brasileira, segundo o Censo 2010 do IBGE, que se declaram evangélicos. São 42,3 milhões de pessoas, cujos votos são disputados pelos candidatos.
Um estudo do cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC-RJ, cruzando mapas e resultados das eleições de 2002, 2006 e 2010, mostrou que, onde a maioria era evangélica, o voto em Anthony Garotinho, Marcelo Crivella e Marina ficava acima da média. Ele considerou apenas escolhas dos grupos pentecostais e neopentecostais, indício de que, para este segmento, “irmão vota em irmão”.
O cientista político Paulo Baía chama atenção para o fato de o segmento ser fragmentado e com interesses diversos. “É difícil que votem em bloco para presidente”, diz ele, para quem “é preconceito acreditar que fiéis aderem automaticamente ao candidato do pastor ou que escolham candidatos ao Executivo só por serem ‘irmãos’”.
A opinião é compartilhada pelo teólogo Marcos Botelho. Pastor da Igreja Presbiteriana, ele diz que não é regra alinhar voto pela religião do candidato. “Não pensamos e não agimos em grupo”, diz.
‘IRMÃO NÃO VOTA SEMPRE EM IRMÃO’, diz pastor Marcos Botelho
Só temas são capazes de unificar o voto de evangélicos. Candidatos, não. É a opinião do teólogo Marcos Botelho, pastor da Igreja Presbiteriana, que estuda o assunto. Para ele, por princípio, os protestantes são heterogêneos e, portanto, não agem em bloco nas eleições.
1. É possível tratar politicamente evangélicos como bloco?
Não. Somos heterogêneos. Existe a lenda de que crente vota em crente, mas isso não é regra. O que chega ao público é o pensamento daqueles que estão pregando na TV. O grande público só ouve sobre os evangélicos por esses telepregadores. Conheço centenas de pastores que trabalham, com pequeno salário, que cuidam de pessoas comuns no dia a dia, e seus posicionamentos não aparecem como os dos midiáticos. Somos divididos, por característica do próprio protestantismo, onde cada um tem o dever de ler a palavra e interpretá-la. Não formamos uma igreja institucional única, nem temos o pensamento único.
2. Há alguma coisa que consiga unir os evangélicos em defesa de algo?
Na defesa de um candidato, não. Mas há temas, sim, capazes de unificar os segmentos evangélicos, e até mesmo os católicos. Acredito que a liberdade religiosa e o aborto sejam dois deles.
3. E a oposição ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo?
Não. Os direitos civis da comunidade LGBT não são algo que necessariamente vai unificar os evangélicos em oposição. Muitos defendem o pleno acesso aos direitos civis a todos, pois o estado é laico.
4. E um projeto de poder pode unificar os evangélicos? Alguns pastores recorrem ao “irmão vota em irmão
Algumas igrejas ou líderes têm projetos de poder. Não todas. Gosto muito de ver que o candidato pastor Everaldo (PSC) não tenha emplacado. Isto mostra que aquelas igrejas com projeto de poder não conseguem unificar. Os evangélicos nunca votaram para presidente por causa da religião. Foi assim com o Lula, com Fernando Henrique Cardoso, com Dilma.
5. Silas Malafaia não pensa assim. O discurso dele é de quem representa o segmento.
Ele não exerce liderança nem na Assembleia de Deus. Tanto assim que não faz parte da Convenção da igreja. Ele não representa os evangélicos, ninguém nunca vai representar.
Jornal O Dia