Foi naquela noite
Uma das qualidades dos jornalistas Renato Terra e Ricardo Calil é contribuir para reabilitar a figura do cantor e compositor. Num raro depoimento, ele relembra com serenidade o ato disparatado ao tentar cantar Beto Bom de Bola e reconhece que ali vitimou sua carreira. É apenas um dos tentáculos do trabalho de pesquisa do filme. Os demais dizem respeito a imagens pouco divulgadas de bastidores da final do festival e contemplam entrevistas hilárias com os participantes, como a que Caetano tenta explicar o que é pop ou as referências a Coca-Cola e Brigitte Bardot em Alegria, Alegria. As canções em concurso dão a dimensão da qualidade e impacto do momento, com Edu Lobo e Maria Medalha defendendo Ponteio, Chico Buarque por Roda Viva, Gilberto Gil e os Mutantes por Domingo no Parque e Roberto Carlos por Maria, Carnaval e Cinzas.
O clima era propício à revolução musical e dali sairia reconhecido em definitivo o Tropicalismo e consagrada a divisão entre a nova e a antiga receita da MPB, com a influência do rock e a guitarra elétrica. Esse contexto, ainda que um tanto destacado no filme do cenário político recrudescente da ditadura, é relembrado por quem o vivenciou, sejam os músicos sejam os especialistas como Sérgio Cabral, jornalista integrante do júri daquela noite de glória que até agora não parecia devidamente esmiuçada.
Orlando Margarido