Lula

Lula, por mais apenas 16 dias

Share

Dou-me conta que são apenas 16 dias a nos separar do fim de uma era. A imprensa já se dedica aos balanços. Área por área de governo, o que andou, o que parou, o que regrediu. Ou avaliações por região do País. Ou ainda balanços cronológicos, a lembrar grandes acontecimentos, bons e ruins.

por Celso Marcondes

Ao se encerrar a solenidade, o presidente desce do pequeno palanque e, para habitual desespero do esquema de segurança, se dirige a um grupo de turistas estrangeiros de pele branca e cabelos louros que já se preparava para entrar no ônibus. Todos se voltam para ele, atônitos. Uns sacam imediatamente suas máquinas fotográficas, outros vão logo em busca de um aperto de mão, de um contato direto. Todos sorriem. O guia da excursão, completamente perdido, não sabe se insiste para que voltem para o ônibus para manter o horário da intensa programação do dia ou vai também em busca de um abraço. Durante alguns minutos ocorre a confraternização, o presidente, suando muito dentro do seu terno azul em plena véspera de verão brasiliense, faz questão de apertar a mão de cada pessoa. Ele fala uma série de “tudo bem?” e “como vai?”.

Eles falam em inglês e alemão, pedem fotos, autógrafos. Uma confusão nada européia. Até que os seguranças o resgatam. Ele sai olhando para trás e acena sem parar, a se despedir. Aí ele passa ao meu lado e sorri, como se perguntasse “você viu isso?”. Eu digo apenas “sensacional, Lula”. Ele me dá adeus.

Aí eu acordei e fiquei com o sonho na cabeça. De imediato, recordei que já havia presenciado várias vezes algo semelhante ao longo dos últimos anos. Muitas vezes pela tevê, às vezes ao vivo. E me dei conta: daqui exatos 16 dias, isso se acaba. Não haverá mais quebras de protocolos e seguranças desesperados. Como ele mesmo afirmou em evento da CartaCapital, Lula será mais um ex-presidente.

Dou-me conta que são apenas 16 dias a nos separar do fim de uma era. A imprensa já se dedica aos balanços. Área por área de governo, o que andou, o que parou, o que regrediu. Ou avaliações por região do País. Ou ainda balanços cronológicos, a lembrar grandes acontecimentos, bons e ruins.

Enquanto faço a barba, repasso minhas críticas e frustrações com o governo, já consolidadas há tempo. Mas o que marca no final é sempre a convicção de que o País melhorou, os pobres estão menos pobres, a injustiça social diminuiu e as perspectivas são todas otimistas. E isso me basta.

Neste momento, a CBN chama minha atenção. No seu comentário diário, Lúcia Hipólito, indignada, ridiculariza as despedidas de Lula. “Ele não para de se despedir, todos os dias”. Ela diz isso logo naquele momento, em que eu havia acabado de despertar da minha despedida personalizada. Aumentei o volume do rádio.

Ela afirma que Lula não consegue se desgrudar do poder. Que como um rei, ele acha que o povo é seu, que não sobreviverá à ausência dos salamaleques e mordomias, dos serviçais “que lhe abrem as porta e fazem as ligações telefônicas”. O tom é de galhofa, ácido. “Está sendo muito doloroso para ele, está inaugurando até pedra fundamental”, ironiza. E vaticina: “Lula age como se fosse continuar na presidência, tem uma dificuldade enorme para deixar o poder e isso pode criar muitos problemas para a presidente eleita”.

Por fim, arremata: “Ele se comporta como se fosse continuar ali e não é assim que um ex-presidente se comporta. Temo que a presidente Dilma vá ter muitos problemas com o ex-presidente Lula, porque ele não soube durante seu mandato ter uma relação institucional com o poder”.

Termino minha barba, termina a premonição da comentarista. Volto ao meu sonho e creio ainda mais que será o povo quem terá maiores dificuldades com esta despedida, Lúcia.

E decido: neste espaço esta é apenas a primeira despedida de uma série.

Já que leu meu sonho, quer ouvir o que ela disse? Respire fundo antes:
http://cbn.globoradio.globo.com/comentaristas/lucia-hippolito/LUCIA-HIPPOLITO.htm

Acompanhe Pragmatismo Político no Twitter e no Facebook