Transcrevo relato de colega publicado originalmente no blog Atira Diária
Na madrugada deste dia 23 de abril de 2011, por volta de uma e meia da manhã, ao retornar de carro do meu trabalho, na Av. Brasil, fui seguido por uma viatura da polícia militar. Estava tranqüilo, pois a documentação estava em dia, minha habilitação na carteira e não havia ingerido bebida alcoólica. A viatura, que estava atrás de mim fez sinal com farol e eu encostei. Senti um frio na barriga.
Um de cada lado, eles surgiram me pedindo para sair do veículo, documentos e habilitação. A abordagem num tom ameaçador de quem está acostumado a ser violento foi seu cartão de visita. Desci do carro com a carteira na mão e entreguei ao primeiro policial. Logo vieram as perguntas: “Ta indo pra onde e tava fazendo o que?” Enquanto isso o segundo me pediu para abrir o porta-malas e, ao visualizar meu violão perguntou: “É músico?” Respondi que sim e a abordagem continuou. Ao perceberem que a documentação estava em dia, o primeiro olhou com atenção a placa do carro e, por esta ser de outro estado – Florianópolis – ele começou num estilo sarcástico de terrorista: “Ih rapaz, placa de fora não pode rodar no Rio, você não viu no jornal? O governador disse que isso é ilegal. Multa de R$1.200,00, apreensão do veículo e perda de 7 pontos na carteira, infração gravíssima”. Enquanto ele falava isso, o segundo foi na viatura e trouxe um jornal velho, e me mostrou uma reportagem de roda-pé falando alguma coisa sobre “falsidade ideológica”, não sei bem. Eu acabei de tirar minha habilitação, entendo de legislação e sei o que é infração gravíssima e isso não era uma.
Minha primeira reação foi: “ok, não sei do que estão falando, mas tenho certeza de que não tenho que me preocupar, já que minha mãe tem residência em Florianópolis e não caracteriza falsidade ideológica, afinal, o carro é dela” e disse: “Tudo bem, podem levar o carro, só me deixa fazer um telefonema pra minha mãe e avisar o que está acontecendo.” O segundo disse: “Que isso rapaz, vai acordar sua mãe? Olha só, a gente já falou com o tenente e ele disse que te libera, mas vai ter que fazer um acerto”
Nessa hora eu temi pelo meu dinheiro.
O primeiro pegou o telefone e fingiu (merecia um prêmio) um diálogo com o tenente. Só esqueceu de esconder o visor do seu “smart fone”, que estava na página de ‘agenda’, deixando claro que ele não estava falando com ninguém. Seu monólogo ao celular foi esse: “Isso tenente, confirmado placa de Florianópolis… ok, o mesmo está disposto a colaborar… quanto? Cinco zero zero? Ok Tenente, vou falar com ele…” virando-se para mim com aquele ar de superioridade “ Olha rapaz, o tenente falou que por R$500,00 te libera” e o segundo ainda completou: “ É que agora envolveu mais gente, tem o escrivão da delegacia também”… o ESCRIVÃO???
Comecei a argumentar: “Meu senhor (aprendi que se deve tratar polícia assim) eu sou músico, estou voltando do trabalho, tenho que pagar meu aluguel e contas para dois filhos, não tenho esse dinheiro…” o segundo: “Ué, mas e seu cachê?”
Nessa hora senti raiva.
No momento em que travávamos esse diálogo outro carro parou na nossa frente e o motorista avisou: “Ó, tem uns motociclistas armados ali atrás, eles deram meia volta quando viram a viatura!”
Achei que iriam me deixar para ir atrás dos bandidos. Não foram. E ainda me disseram isso: “Ta vendo? São esses aí que a gente quer atrasar! Com você a gente só quer ajudar, agora, se você quiser que a gente faça nosso serviço direito a gente faz…” quando ele terminou eu respondi imediatamente: “Tudo bem, pode rebocar” Eu sabia que eles não iriam fazer isso. O primeiro fingiu falar ao telefone de novo e me veio com essa “Olha, o tenente falou que te libera por um cinco zero”. Nessa altura eu já estava completamente transtornado e falei mais uma vez “Tudo bem, pode rebocar o carro”. Nisso, o segundo levantou a metralhadora e me falou “A gente não vai rebocar seu carro”
Nessa hora temi pela minha vida.
O primeiro perguntou quanto eu tinha pra ‘perder’, eu respondi que pra perder não tinha nada, pois o dinheiro que eu tinha já estava comprometido com minhas contas. Ele me olhou sério e perguntou mais uma vez quanto eu ia dar pra eles.
Dei metade do meu cachê. Cem reais. Com dor no coração, após três horas de show, num sábado à noite, longe dos meus filhos, da minha casa, fazendo a alegria de pessoas que eu não conheço, vi metade do meu ganho ir parar nas mãos de quem deveria me proteger.
Não vou ficar fazendo reflexões sobre o sistema, corrupção ou outros absurdos. Estou apenas contando minha história e peço para que vocês reflitam. Fui assaltado pela polícia, na cara de pau, sem chance de defesa, covardemente e pior, eles sairão impunes.
No dia seguinte, domingo de páscoa, eu fui numa delegacia de Niterói, onde moro, prestar queixa. O rapaz que me atendeu ouviu minha história e disse: “Olha rapaz, vou encaminhar sua denúncia para a unidade onde o fato ocorreu, provavelmente eles vão te chamar pra depor. Mas não posso te garantir que não haverá represália”. É, isso me deixou bem tranqüilo. Não registrei a queixa. Não sei o nome dos policiais nem o número da viatura, por isso, não posso usar o disk-denúncia. Aliás, que idéia a minha, denunciar polícia pra polícia.
Resolvi escrever essa carta para denunciar o ocorrido a quem eles temem: A Imprensa. Pode ser que não dê em nada, mas só o fato de outras pessoas saberem disso, já me sinto um pouco menos injustiçado.