Nelson Jobim ironiza Dilma e diz ter votado em Serra; por que não é demitido?
Jobim, ministro de Dilma, revela que votou em Serra em 2010 |
Quase um mês depois, ao iniciar a entrevista ao jornalista Fernando Rodrigues no programa on-line do Grupo Folha, Jobim sinalizava uma distensão. A primeira pergunta remetia à comparação: “Olá ministro Nelson Jobim. O senhor foi ministro de três governos sucessivos. Com quem é mais fácil trabalhar: Fernando Henrique, Lula ou Dilma?”.
E Jobim rodeou: “Todos são fáceis de trabalhar. Cada um tem o seu estilo. A questão não é fazer comparações. Se você for fazer comparações, não dá solução e só cria problema. O Fernando [Henrique] tinha um estilo. O Lula tinha outro estilo. A presidente Dilma tem outro estilo. Mas são estilos absolutamente razoáveis. Pelo menos comigo as relações são absolutamente extraordinárias”.
A seguir, na comparação entre sua rotina com FHC, Lula e Dilma, Jobim retoma a busca pela distensão e diz que falava sempre “com os três”. Mas a sequência de sua resposta começa a esclarecer com qual desses líderes o ministro é realmente mais afim:
Com o presidente Lula a mesma coisa, com menos intimidade. Eu frequentava a casa do Fernando e aquela fazenda que ele tinha aqui perto [de Brasília], aos finais de semana. Com o Lula tinha uma intimidade muito boa, sem nenhuma dificuldade. E a mesma coisa se passa com a presidente Dilma.”
Até que lhe perguntaram em quem Jobim votou nas eleições presidenciais do ano passado, e o ministro passou recibo. Lembrou sua relação com Serra, “amigo íntimo”, “meu padrinho de casamento”. Disse que expôs sua preferência ao governo, ao próprio Lula. E, no arremate, debitou parte de sua decisão na conta do ex-presidente. Tudo se resume, diz Jobim, a “manter a minha coerência histórica com o Serra”. Eis a resposta:
Aí o Lula disse: ‘Olha Jobim, fique fora disso. Eu sei claramente das suas relações com o Serra. Sei que você tem uma amizade íntima com o Serra de muitos anos’. E avisou ao Padilha: ‘Olha, não envolvam o Jobim na campanha’. E eu votei no Serra.”
E o que Dilma teria achado disso? Segundo Jobim, sua própria postura foi a mais irrepreensível. Não só Dilma sabia do serrismo do ministro como até teria lhe atribuído mais respeito por sua heroica sinceridade. A tal ponto que a relação entre eles não azedou depois da eleição.
FHC não cansa de olhar para trás: merece mais uma chinelada
“Azeda quando você esconde”, ensina Jobim. “Quando você não esconde, quando você é transparente, não tem como azedar. Tem como se resolver. O problema é quando você esconde, fica fazendo dissimulações. Daí dá problema. Eu não costumo fazer dissimulações, então não tenho dificuldades.”
O ministro também flerta com os militares. Embora não chegue ao ponto de praguejar contrariar a Comissão da Verdade, Jobim volta a dizer que, em sua gestão na Defesa, as Forças Armadas foram as primeiras a abrirem os arquivos da ditadura militar (1964-1985) — ou, pelo menos, os documentos sigilosos que ainda perduram. E se proclama como o ministro que, de fato, lutou pelo restabelecimento do direito à verdade.
A Força Aérea inclusive colocou à disposição alguns documentos que ela havia encontrado nos seus arquivos. Mas o Exército e a Marinha disseram que não havia mais nenhum documento. Haviam sido incinerados há algum tempo.
Depois, essa comissão [presidida por Dilma] determinou que o Ministério da Defesa abrisse um inquérito. Na época, [o ministro] era o Valdir [Pires]. O Valdir acabou atrapalhado com o problema da aviação civil e não tomou providências. Eu tomei providências nesse sentido. Mandei abrir os inquéritos.
Vieram então as respostas das três Forças. A Força Aérea informou que tinha aqueles documentos que tinha posto à disposição. Entregou os documentos. Os demais informaram que os documentos tinham sido incinerados. E, quando eles tinham informado que tinham sido incinerados, a ministra Dilma pediu então que se apresentasse o termo de incineração.
Só que o termo de incineração, pela legislação vigente, exigia que os documentos fossem sigilosos. Eles informaram que não eram sigilosos e que foram incinerados normalmente. (…) Como você não tem formalização do processo de incineração, você não tem como identificar de quem partiu o ato.”
Há um mês, Jobim “comemorou” o desaparecimento de arquivos ultrassecretos e, pouco depois, disse se sentir cercado de “idiotas”. Agora, o ministro que se diz desacostumado a “fazer dissimulações” revela ter sido habitué da fazenda de FHC e do Palácio dos Bandeirantes sob Serra. Com tanta polêmica, votar no “amigo íntimo” em 2010 talvez seja mesmo o episódio menos ruidoso na saga de Nelson Jobim.
André Cintra para o sítio Vermelho