Serve de introito a este artigo uma decisão do Supremo Tribunal Federal, proferida em vinte e nove de abril de 2010.
Pretendo contribuir, através deste escrito, para uma discussão ética, que não se prende no tempo, não se localiza no calendário, porque é perene.
No infeliz nove de abril de 2010, o Supremo, por maioria, entendeu terem sido abrigadas pela lei de anistia todas aquelas pessoas que, durante o regime de exceção instaurado em 1964, torturaram opositores do regime.
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Parece-me que, neste caso, a razão esteve com a minoria, ou seja com os dois ministros derrotados no seu entendimento: Ayres Britto e Ricardo Lewandovski. Entenderam esses magistrados que a tortura é crime comum, não é crime politico, daí que não foi abrangido pela anistia.
A decisão do Supremo, que tivesse posto a tortura fora da anistia, não levaria os torturadores do antigo regime, de imediato, para a prisão. Eles estariam ao desabrigo da anistia, mas teriam de ser submetidos a processo, com direito de defesa. A efetiva participação nos atos de tortura, relativamente a cada um dos acusados, teria de ficar configurada.
O que a consciência ético-jurídica nacional esperava do Supremo Tribunal é que decidisse: “Tortura não é crime politico, os torturadores não foram anistiados. Prossigam-se os processos para julgamento de todos aqueles acusados de terem praticado a tortura ou de terem sido coniventes com essa prática ignóbil.”
O que fica, do lamentável aresto do mais alto tribunal do país, é a afirmação de que a tortura, amplamente praticada numa fase de nossa História Contemporânea, teve a ressalva de crime politico, razão pela qual os praticantes da tortura foram anistiados.
Na verdade, e isto deve ser proclamado com todas as forças, em homenagem ao Brasil de amanhã – a tortura não é crime politico. Nenhuma razão política, nenhum credo, nenhum motivo que se alegue, nenhuma causa de qualquer natureza, nenhuma excludente, nada, absolutamente nada justificou, no passado, ou autorizará, no futuro, a prática da tortura. A tortura é um crime contra a humanidade, é sempre um escárneo à dignidade humana. Fere o torturado e degrada o torturador.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos repudia, de forma absoluta, a tortura: Ninguém será submetido a tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. Observe-se o uso do pronome ”ninguém“, no texto. O mesmo pronome de significado total é utilizado nas diversas linguas em que a Declaração Universal é proclamada. Confira-se, por mera curiosidade, o repúdio à tortura, em seis idiomas:
NADIE será sometido a torturas ni a penas o tratos crueles, inhumanos o degradantes. (Espanhol).
NUL ne peut être soumis à la torture ni à des traitements ou peines cruels, inhumains ou dégradants. (Francês).
NESSUN individuo potrà essere sottoposto a tortura o a trattamento o punizioni crudeli, inumani o degradanti. (Italiano).
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