Durante o ataque, os indígenas estavam reunidos com o antropólogo do MPF, Marcos Homero, representantes da Funai e agentes da Força Nacional. Comunidade já havia sido atacada no dia 10 de agosto, e ameaçada no dia 23
Pistoleiros atiraram na tarde dessa terça-feira (28) contra o tekoha Arroio Korá, do povo Guarani Kaiowá, localizado no município de Paranhos, fronteira do estado do Mato Grosso do Sul com o Paraguai. Por enquanto, não há notícias de feridos, mas a violência imposta pelos jagunços dessa vez não respeitou ao menos órgãos federais.
Durante o ataque dos atiradores, a comunidade indígena estava reunida com o antropólogo do Ministério Público Federal (MPF) do estado, Marcos Homero. Com ele estavam representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e agentes da Força Nacional. Em Arroio Korá vivem cerca de 400 Guarani Kaiowá.
Os tiros foram desferidos contra o grupo reunido, que se dispersou. “Ficamos assustados. Acontece sempre de atirarem contra nós, por cima do acampamento. Hoje estava o Ministério Público, a Funai. Eles viram como acontece”, declarou a liderança de Arroio Korá, Dionísio Guarani Kaiowá.
Ameaçado de morte, o indígena não pode se locomover livremente pela Terra Indígena de sete mil hectares homologada em 21 de dezembro de 2009, mas que nunca teve os não-índios retirados pela Funai. Conforme decisão do Aty Guasu, grande reunião Guarani Kaiowá, a situação não poderia mais se manter.
No último dia 10 de agosto, a comunidade decidiu iniciar a retomada da área, e desde então Dionísio está marcado para morrer, além de seguir exigindo das autoridades providências quanto ao desaparecimento de Eduardo Pires Guarani Kaiowá, levado pelos pistoleiros durante ataque no dia do movimento de retomada.
“Aqui estamos vivendo assim, porque os invasores de nossas terras estão todos aqui dentro e não aceitam que estamos retomando o que é nosso. Estamos aqui e não vamos sair”, decretou Dionísio. Na última semana, o indígena entrou para o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos da Presidência da República.
Violência é recorrente
O Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso do Sul solicitou a instauração, pela Polícia Federal de Ponta Porã, de inquérito policial para averiguar a violência sofrida pelos Guarani Kaiowá e Ñhandeva durante reocupação da Terra Indígena Arroio Korá.
Uma criança morreu durante o ataque dos pistoleiros, ocorrido logo após o movimento de retomada. Um indígena chamado Eduardo Pires ainda está desaparecido e conforme testemunhas ele teria sido levado pelos pistoleiros. Segundo o MPF, o objetivo da investigação, além de apurar a ocorrência de crimes, é também o de preservar o local dos fatos para futuros exames periciais.
Relatório de Identificação da Terra Indígena, realizado pelo antropólogo Levi Marques Pereira e publicado pela Funai, atesta, em fontes documentais e bibliográficas, a presença dos guarani na região desde o século XVIII.
Em 1767, com a instalação do Forte de Iguatemi, os índios começaram a ter contato com os “brancos”, que aos poucos passaram a habitar a região com o objetivo de mantê-la sob a guarda da corte portuguesa. A partir de 1940, fazendeiros ocuparam a área e passaram a pressionar os indígenas para que deixassem suas terras tradicionais.
Os primeiros proprietários adquiriram as terras junto ao Governo do, então, Estado de Mato Grosso e, aos poucos, expulsaram os índios, prática comum naquela época. Contudo, os indígenas de Arroio Korá permaneceram no solo de seus ancestrais, trabalhando como peões em fazendas.
Homologação contestada
No dia 21 de dezembro de 2009, o presidente Luís Inácio Lula da Silva homologou os sete mil hectares da Terra Indígena Arroio Korá. Desrespeitando o recesso do STF, o ministro Gilmar Mendes, oito dias depois do ato de homologação, embargou 184 hectares da área a pedido dos fazendeiros.
“O que perguntamos é: por que o processo ainda está parado e qual a razão da Funai não retirar os invasores de todo o resto da terra que não foi embargada? A guerra que nos declaramos é contra essa morosidade. Não vamos aceitar mais tanta demora em devolver nossas terras”, disse Eliseu Guarani Kaiowá.
Ameaças de morte ocorreram em 23 de agosto de 2012. Por que nenhuma providência foi tomada?
Informativo/carta da comunidade Guarani-Kaiowá de tekoha Arroio Kora-Paranhos-MS.
Nós comunidades de Tekoha Arroio Kora, vimos através deste, informar que no dia 23 de agosto de 2012, recebemos uma nova ameaça de morte, ocorreu uma barraca destruída e um novo ataque dos pistoleiros da fazenda conhecida de fazenda Porto Domingos e o atual proprietário é o Sr. Luiz Bezerra. Um coordenador/articulador dos pistoleiros desta fazenda Porto Domingos é conhecido como Francisco Paraguai.
No dia 23/08/2012, este mesmo Francisco Paraguai veio juntamente com os pistoleiros destruíram uma barraca e ameaçou gritando, “ficam sabendo que vocês índios vão morrer tudo, vão morrer!! “Vim avisar vocês que vão ser atacados e todos serão mortos.” Eles estão todos armados, vieram de carro por meio de uma estrada de chão do fundo da fazenda do Luiz Bezerra.
Além disso, do outro lado, já na área antiga Arroio Kora reocupada, os 04 homens não-índios de duas motocicletas sem placa, vieram procurar os principais líderes de tekoha Arroio Kora, perguntaram e procuram por Dionizio Gonçalves dentre outros. Falaram queriam conversar com urgência com as lideranças de Arroio Kora e do conselho da Aty Guasu, perguntaram, onde se encontram essas lideranças indígenas. Disse: “ estão aqui? avisam eles (lideranças) que nós queremos conversar com eles”.
Assim, fizeram a ameaça e avisaram nos e retornaram à cidade de Paranhos. Diante da nova comunicação e ameaça de morte dos pistoleiros, mais uma vez, retornamos a repassar os avisos dos pistoleiros, para que sejam investigados, com urgência, principalmente o Francisco Paraguai da fazenda Luiz Bezerra e outros. Queremos que essa estrada de fundo da fazenda Domingos por onde chegam e atacam os pistoleiros seja bloqueada imediatamente.
Os pistoleiros não estão vindo pela estrada pública (asfalta), eles criam e utilizam várias estradas clandestinas pela faixa de fronteiras para enganar as policiais brasileiras. Assim, continuam agindo e nos atacando nos, de modo muito tranquilo e poderoso. Eles tentam enganar e escapar da equipe da policia do Brasil. Importa destacar que enquanto as Polícias do Brasil investigam e observam os pistoleiros, parecem que os pistoleiros também fazem mesma coisa, observam e vigiam a equipe da polícia. Por isso mesmo, quando a polícia sai da região , e os pistoleiros chegam e atacam nos.
Por isso, os fatos ocorridos no dia 24/08/2012, por meio deste informativo/carta, relatamos e encaminhamos aos conhecimentos de todos (as).
Atenciosamente,
Tekoha Arroio Kora, 24 de agosto de 2012. Com Renato Santana, Cimi
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