“Se a América Latina é na atualidade a região mais avançada do mundo na luta por uma alternativa à barbárie estadunidense, a Venezuela é seu ponto mais importante. Daí o alcance mundial dos resultados da eleição de 7 de outubro próximo”, diz jornalista
Quando Hugo Chávez ganhou as eleições presidenciais de 1998 na Venezuela, a perspectiva da América Latina e do Caribe parecia ser a recolonização total por Washington mediante o Acordo de Livre Comécio para as Américas (Alca). O neoliberalismo se impunha na maior parte do mundo e em nossa região apenas Cuba resistia contra o império a um custo humano verdadeiramente inexplicável se não se conhece a fundo sua épica história de luta pela independência e a justiça social.
Esta situação começaria a mudar com a dinâmica ação de Chávez, que através de um grande processo democrático impulsionou a aprovação esmagadora da primeira Constituição antineoliberal do continente americano (1999). Seu texto assentava as bases para o pleno exercício da soberania popular e nacional com a democracia participativa, assim como para encaminhar trasformações sociais profundas que podiam conduzir ao socialismo. Ato contínuo, com o apoio da maioria parlamentar, o líder venezuelano decretou 49 leis que abriam o caminho ao controle pelo Estado dos hidrocarburantes em benefício direto da sociedade, assim como às reformas agrária e pesqueira. A nova Carta Magna estabelecia o direito cidadão a revogar o mandato das autoridades eleitas, algo insólito nas democracias representativas.
As posições sustentadas por Chávez a favor da verdadeira independência, a unidade e a integração da América Latina, e as duras provas a que seu apoio popular resistiu, acrescido e fortalecido com a épica vitória sobre a contrarrevolução no referendo revogatório de 2004 foram elevando-o à categoria de líder continental. Naquela altura, ele já era o único presidente latino-americano que, graças principalmente a esse respaldo, tinha sido capaz de vencer um golpe de Estado e outras ações de força orquestradas pela oligarquia nativa com o estímulo e apoio dos Estados Unidos. Mas a adesão popular continuou crescendo com as missões sociais que, rompendo com a burocracia herdada do Estado oligárquico, fizeram chegar a educação, a saúde, o emprego e canais de participação política aos marginalizados de sempre.
Enquanto isso, movimentos populares muito diversos mas identificados por sua oposição ao neoliberalismo tinham levado Lula ao governo no Brasil, Néstor Kirchner na Argentina e Tabaré Vázquez no Uruguai. De modo que na Cúpula das Américas de Mar del Plata (2005), se pôde conseguir a contundente derrota da Alca mediante a ação concertada de um incontível Chávez, principalmente com os dois primeiros, unida à poderosa mobilização popular nas ruas com a presença de líderes como Evo Morales, ainda por chegar à presidência, e João Pedro Stédile.
A derrota da Alca marcou um ponto de viragem decisivo na história latino-americana. Se, ao contrário do que ocorreu, a Alca tivesse sido aprovada, Washington já teria engolido a América Latina e o Caribe com a extensão para o sul dos tratados de livre comércio, equivalentes à anexação. Não teria sido possível consolidar o polo de unidade, integração solidária e paz do Caribe à América do Sul articulado em torno da Venezuela. Não existiria Petrocaribe, nem Alba, nem Unasul, nem Celac.
A Venezuela avançou de maneira sustentada no bem-estar social e na criação de um consenso nacional anticapitalista e em grande medida favorável ao socialismo. Este consenso se baseia na pregação incessante de Chávez, no quadro de uma realidade de verdadeiras possibilidades de participação política e ascenso social, ao contrário da crescente pobreza e despojo de direitos cidadãos no Estados Unidos, Europa e seus vasalos. Baseia-se também na intensa batalha política que fez Fidel Castro dizer recentemente: Poucas vezes, talvez nunca, se pôde refletir, tão nitidamente, uma luta de ideias entre o capitalismo e o socialismo como a que se expressa hoje na Venezuela.
Se a América Latina é na atualidade a região mais avançada do mundo na luta por uma alternativa à barbárie capitalista, a Venezuela é seu ponto mais importante. Daí o alcance mundial dos resultados da eleição de 7 de outubro próximo. É fundamental que este fato seja compreendido pelas forças populares dentro e fora da Venezuela. Washington sim, compreende isso muito bem e por isso conspira contra Chávez o tempo todo.
Não basta ganhar, mas ganhar por nocaute, de modo esmagador, a presidência e todos os cargos.
Angel Guerra Cabrera, jornalista cubano residente no México, colunista do jornal La Jornada e do site Cubadebate.