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Consciência Negra: Sabão que promete branquear a pele só enaltece o racismo

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O apelo ao embranquecimento como único valor desejável diz muito de por que o 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, tem razão de existir no Brasil

Por Fátima Oliveira

Na tarde do feriado do dia 15, fui bater pernas num shopping, coisa não habitual, pois gosto de comprar em lojas de rua! Todavia, foi uma das coisas prazerosas que fiz ultimamente. Dei de cara com duas lojas puro encanto. Tem razão quem diz que, mesmo para quem não é de natureza consumista – o meu caso; sou de poucos desejos -, olhar vitrines tem valor terapêutico.

O dia da Consciência Negra tem razão de existir. (Foto: reprodução)

Nada comprei, mas desejei quase tudo na L’Occitane. Estar ali é passear pela Provença e seus cheiros. Embora aconchegante, o ambiente é minúsculo e falta um banquinho para a gente sentar e se envolver nas fragrâncias provençais… Na Granado, fundada em 1870 pelo português José Antônio Coxito Granado, foi uma imersão no passado. Diante do Polvilho Antisséptico Granado, criado em 1903, vi vovó passando-o em meus pés de criança antes de dormir à noite – coisa obrigatória para não ter chulé! Saí cheia de latinhas, uma colônia e dois sabonetes de alfazema, meu cheiro de adolescência antes de ser viciada em Promessa, da Myrurgia, e Fleur de Rocaille, da Caron.

Não perguntem como chegava ao sertão do Maranhão um legítimo perfume francês… É o mesmo que indagar como Lampião fazia bailes perfumados com a sua fragrância francesa predileta, Fleurs d’Amour, da Maison Roger & Gallet.

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À noite, em casa, olhando os mimos da Granado, bateu saudade apertada e até senti o cheiro do Sabão Aristolino, que, bem antes da existência e da popularização do xampu, era a única coisa líquida espumante para banhos e para lavar cabelos. No internato do Colégio Colinense, cada menina possuía o seu Aristolino, até para escovar os dentes e como medida número um de higiene “naqueles dias”; e até quem não gostava do cheiro usava-o, obrigatoriamente, durante a menstruação!

O Sabão Aristolino foi criado pelo médico de Paquetá dr. Aristão Gonçalves Neves (1891-1934), que também era “prático de farmácia”, ofício que exerceu, desde quase menino, até a formatura em medicina. Continuou a manipular os remédios que receitava. Ficou famoso graças a duas fórmulas de sua lavra: o Xarope Broncholino e o Sabão Aristolino.

Saudosa, passeei com o Google e encontrei vários reclames (publicidade no rádio) e anúncios em revistas desde o começo do século XX. O Sabão Aristolino era pau para toda obra: “Para aformosear a pele, para o banho das crianças e para a barba, use sempre Sabão Aristolino”.

Uma de 1918: “Não estraga a pelle e o cabello. O melhor para manchas, sardas, espinhas, rugosidades, cravos, vermelhidões, comichões, frieiras, caspa, queda do cabello, erysipelas, darthros, queimaduras. O preferido, o mais perfumado, antisséptico, antiparasitário”.

“Sabão Aristolino: o tipo ideal para a senhora ou a senhorita não é o loiro ou o moreno, é o cavalheiro de bom gosto que possui cabelos sedosos e brilhantes, pele fresca e acetinada.

Assegura para si o tipo ideal, entregando ao Sabão Aristolino a tarefa de embelezar sua pele e
os seus cabelos. Sabão líquido medicinal Aristolino evita cravos, espinhas e manchas, que tanto prejudicam sua beleza, ao mesmo tempo em que limpa sua cabeça e dá maciez aos seus cabelos. Aristolino, sabão de beleza, sabão de saúde”.

Vi várias publicidades, até despertar do sonho saudosista: “Para branquear a pele, usai o sabão Aristolino!”. Um susto, porque eu desconhecia a suposta propriedade, que, no fundamental, é racista e de forte e falso apelo ao embranquecimento como único valor desejável e diz muito de por que o 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, tem razão de existir no Brasil.