Ao contrário do que afirma o chefão da TV Globo, somos um país racista e isto se reflete no mundo do trabalho, nas escolas, no cotidiano. O racismo está presente nas instituições públicas e privadas
Se dependesse de Ali Kamel, todo-poderoso capataz da TV Globo, não haveria feriado nem manifestações no Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, em 20 de novembro. No livro “Não somos racistas”, publicado em 2006 pela Nova Fronteira, ele garante que não há discriminação racial no Brasil e que todos vivem em harmonia. Obrado em plena batalha pela implantação das cotas nas universidades, o livro de 144 páginas serviu como instrumento da direita para combater as políticas afirmativas do governo Lula.
Para o jornalista metido a intelectual, o racismo não teria peso na cultura nacional e não contaria com o aval das instituições públicas e privadas. Nesse sentido, teorizava o autor, a implantação das cotas raciais teria um efeito inverso, negativo, estimulando o racismo. As teses do chefão da Rede Globo, porém, logo caíram no ridículo e “sociólogo” global virou motivo de gozação. Nesta semana, o estudo “Vozes da Classe Média”, realizado pelo Instituto Data Popular, confirmou a visão elitista e racista de Ali Kamel.
Avanços das políticas sociais
Organizado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, o estudo revelou que as políticas sociais implantadas pelo governo Lula melhorara a renda dos negros no país. Nos últimos dez anos, ela cresceu em um ritmo cinco vezes maior do que a da população não negra. A soma dos salários dos negros (incluindo pardos) passou de R$ 158,1 bilhões, em 2002, para R$ 352,9 bilhões em 2012 – incremento de 123,2%. Também houve aumento da renda dos não negros, mas num ritmo menor – 21,1%. Ela passou de R$ R$ 272,1 bilhões para R$ 329,5 bilhões.
“Com a maior participação no mercado formal de trabalho (carteira assinada e direitos trabalhistas), mais acesso à educação e mais facilidades em conseguir crédito para o consumo, essa população viu a sua renda melhorar em um ritmo mais intenso. Além desses fatores, políticas públicas adotadas pelo governo federal –como aumento real de salário mínimo e programas sociais de transferência de renda, caso do Bolsa Família- contribuíram para o incremento”, destaca o jornal Folha deste domingo (18).
Discriminação não foi superada
“A expansão da classe média foi resultado da entrada dos grupos sociais menos privilegiados, como o dos negros, e da redução das desigualdades. Oito em cada dez entrantes da classe média são negros”, afirma Renato Meirelles, diretor do instituto Data Popular. Dos 40 milhões de brasileiros que ingressaram na chamada nova classe média, 75% são negros. “A entrada maciça de negros na classe média fez com que a participação desse grupo na classe média brasileira subisse de 38% em 2002 para 52% em 2012”.
Estes avanços evidenciam as besteiras escritas por Ali Kamel, mas não significam que a discriminação racial foi superada no Brasil. Ao contrário do que afirma o chefão da TV Globo, somos um país racista e isto se reflete no mundo do trabalho, nas escolas, no cotidiano. O racismo está presente nas instituições públicas e privadas. Daí a importância do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. É preciso lutar ainda muito mais para avançarmos na superação dos preconceitos, da opressão e da exploração em nossa sociedade.
Altamiro Borges, Correio do Brasil