Proprietário de latifúndio em Araquari, SC: “Se colocarem índios aqui, a bala vai comer solta. Que não sejam loucos”
Por Conceição Oliveira, em Maria Frô
O texto abaixo tem tanta declaração nonsense, é praticamente porta-voz dos ruralistas, não tem uma voz dos povos indígenas, nenhum depoimento de representantes da FUNAI, só tem a voz dos ruralistas, dos deputados ruralistas e dos advogados dos ruralistas. O texto também expressa os juízos de valor expressos do jornalista que considera os latifundiários os verdadeiros donos da terra, observem o título que ele deu à reportagem, observem os sujeitos que ele resolveu dar voz, observe que ele se apropria do discurso ruralista pra dizer que é ‘muita terra pra pouco índio, não resisti e fiz algumas intervenções em vermelho no texto do jornalista. Ele escolheu um lado, eu também.
JOINVILLE: Donos de terra de Araquari são alvo de desapropriação
Por: Sandro Alberto Gomes (@SandroGomes_ND), Notícias do Dia
O ouro é visível, desde o medalhão que carrega no pescoço ao relógio e ao anelão. É a herança dos tempos em que garimpou em rios infestados de piranhas, como o Madeira, Negro e Solimões. Mergulhador, chegava a extrair 1,5 kg de ouro por dia, a 70 metros de profundidade. No dia em que encontrava menos que um quilo, ficava possesso. Com o grama valendo em torno de R$ 100, ganhou dinheiro e expandiu seu ramo de atividades.
Apesar do pouco estudo – só foi até a “segunda cartilha” –, aprendeu espanhol, italiano e enrola o guarani. Homem de negócios, o ex-garimpeiro Claudino Garbin, 58 anos, tem empresa de terraplanagem, comprou terras no Paraguai e uma propriedade de 33 hectares no entroncamento das BRs-101 e 280, em Araquari, pela qual diz que pagou R$ 1,6 milhão, há 12 anos. Sua intenção é fazer um condomínio industrial no imóvel, cujo registro é de 1917, mas há anos vem enfrentando problemas com a Funai (Fundação Nacional do Índio).
Em suas andanças por países como Bolívia, Chile e até a selvagem Amazônia, onde contraiu 28 malárias, três hepatites e duas dengues, nunca teve problemas com índios. Muito pelo contrário. Dos 13 casamentos, um foi com uma índia. Por ironia do destino, depois que voltou ao Sul do Brasil, região que considera mais “civilizada” do país, trava uma batalha ao lado de outros 200 proprietários contra a demarcação de suas terras como reservas indígenas.
Impasse afasta bons negócios
Garbin não esconde a indignação. Dos 330 mil m2 de sua propriedade, a Funai quer demarcar 200 mil, incluindo uma área de reserva legal. “Não é pouco o prejuízo. É grande. Falei com o senador Luiz Henrique da Silveira, que disse para não me preocupar. Mas a gente está sofrendo. Se colocarem índios aqui, a bala vai comer solta. Que não sejam loucos”, protesta. (grifos nossos)
Segundo ele, sua propriedade é avaliada em R$ 150 o metro quadrado. Ele já teria perdido grandes negócios, inclusive com investidores italianos, que se desinteressaram pelas terras tão logo souberam da demarcação. “Aqui era para ter se instalado cinco ou seis empresas, mas desistem quando sabem que querem transformar em terra de índio”, reclama.
Garbin considera que Araquari é a cidade que mais cresce no país em termos industriais, ainda mais com o anúncio da instalação de uma fábrica da BMW. Mas o processo de expansão econômica, entende, pode sofrer interferências. “A área que eles querem doar para 300 e poucos índios é maior que Joinville”, dimensiona.
“Por que não levam estes índios para a Amazônia? Em cem anos de registro destas terras nunca teve índio aqui. Esta é a nossa guerra. Estamos há 12 anos de briga entre proprietários e Funai. Aqui, nunca teve índio e não deixo entrar. Não são loucos de entrar”, avisa.
90 km2 de terras pretendidas não podem mais receber benfeitorias
De acordo com a notificação da Funai, novas construções devem ser evitadas nas áreas em litígio, mas ninguém será “retirado coercitivamente” de suas terras até que o processo demarcatório seja concluído. Da mesma forma, nenhum proprietário está proibido de cultivar sua terra.
A declaração não acalenta os proprietários, que não concordam com a demarcação nem pretendem entregar as terras para os índios, principalmente considerando a baixa população indígena – cerca de 330 distribuídos em quatro aldeias –, para uma área gigantesca pretendida. (gozado que não é gigantesca pra os poucos proprietários mas é gigantes para 330 indígenas?)
Os 30,65 km² de terras que envolvem as aldeias Tarumã e Morro Alto, em Araquari, Balneário Barra do Sul e São Francisco do Sul foram homologados pelo Ministério da Justiça, ainda no governo Lula. Resta apenas assinatura da presidente Dilma Rousseff, para que as áreas sejam desapropriadas e as benfeitorias indenizadas. É justamente isto que a Aspi (Associação dos Proprietários de Terras Pretendidas para Demarcação Indígena do Norte de Santa Catarina) tenta impedir.
O estudo antropológico contratado pela Aspi será o terceiro realizado na região. O primeiro foi feito a pedido da Funai, que apresentou a região como habitada originalmente pelos Guarani. O segundo estudo, da Aspi, provou o contrário, mas os argumentos foram indeferidos pelo Ministério da Justiça. Agora, os donos de terras tentam mais uma vez sustentar sua tese.
As portarias que tratam sobre as terras da aldeia de Piraí (30 km² em Araquari) e de Pindoty (duas áreas que juntas somam 32,9 km² em Barra do Sul e Araquari), ainda não foram homologadas. Em dezembro, deve começar um novo estudo antropológico para tentar provar que mais de 90 km2 de terras de Araquari, Balneário Barra do Sul e São Francisco do Sul não foram ocupadas originalmente por índios da tribo (sic) Mbyá-Guarani, como atesta a Funai. O estudo foi contratado pela Aspi (Associação dos Proprietários de Terras Pretendidas para Demarcação Indígena do Norte de Santa Catarina), que reúne cerca de 200 donos de pequenas a grandes propriedades.
A perícia antropológica foi a forma encontrada de fazer frente à Funai, que nos últimos meses emitiu notificações aos donos de áreas especuladas, para que não construíssem mais nada, sob o risco de não serem indenizados pelas novas benfeitorias. Apenas benfeitorias já existentes nas áreas que podem ser desapropriadas serão indenizadas.
“A Funai espalhou terror”, acusa a advogada Priscila Dalcumuni, da Martinelli Advocacia Empresarial, que representa a associação. (É realmente impressionante como os representantes dos latifundiários invertem a lógica da violência no campo, quem espalha o terror de acordo com a advogada dos latifundiários não são aqueles que ameaçam usar da violência das armas contra os indígenas, mas a FUNAI!) Ela explica que diante das notificações apresentou pedido à Justiça Federal solicitando explicações da Funai. Esta, por sua vez, esclareceu que o único objetivo é evitar ainda mais prejuízos aos proprietários, embora o processo de demarcação esteja longe do fim.
A advogada reforça que agora o objetivo é comprovar que as áreas nunca foram ocupadas por índios, principalmente da tribo dos mbyá-guarani, originária da Argentina e Paraguai (sic).
Colatto é contra a demarcação
No dia 23 de outubro, a Funai concluiu licitação para contratação de empresas especializadas em agrimensura, cartografia e geodésia para serviços de demarcação e aviventação (operação que se faz para determinar em data mais recente, os rumos dos alinhamentos de um levantamento feito em data anterior de limites) para 20 terras indígenas, entre elas, Guarani do Araça 1, em Cunha Porã e Saudades, Pindoty, Piraí e Tarumã, em Araquari, Balneário Barra do Sul e São Francisco do Sul, além de Xapecó e Pinhalzinho Canhadão, em Ipuaçu, todas citadas pela nomenclatura indígena em Santa Catarina.
O deputado federal Valdir Colatto (PMDB/SC) repudia a atuação da Funai, (grifos nossos) uma vez que, com a suspensão da portaria 303/2012 da AGU (Advocacia-geral da União) não existem parâmetros para as demarcações indígenas no país. Em recente audiência com o ministro substituto da AGU, Colatto foi informado que os processos de demarcação haviam cessado até o julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal) do processo demarcatório da Reserva Raposa Serra do Sol.
“A portaria 303 determinou que todas as entidades respeitem o marco regulatório dos 19 pontos decididos na criação da Raposa Serra do Sol, aprovado pelo STF, e que em qualquer demarcação seja ouvido o município ou Estado, o que a Funai não está fazendo”, afirmou Colatto.
O parlamentar é contrário a qualquer ocupação indígena que subtraia do produtor rural a posse de terras. (Seria surpreendente se a bancada ruralista fosse a favor da demarcação de terras indígenas) Em Santa Catarina, segundo ele, 40 áreas estão sendo reivindicadas pela Funai. Colatto cita as dificuldades que vivem as famílias donas das terras em Cunha Porã e Saudades, Abelardo Luz, Seara, Paial, Arvoredo, Chapecó, Ibirama, São Francisco do Sul, Araquari e Joinville. (Curioso que em nenhum momento ouvimos a voz dos indígenas e nem da Funai nesta reportagem)
Nestas propriedades, cita, há escrituras públicas que datam 100 anos. Segundo ele, cabe ao governo federal adquirir terras e adotar um modelo de política indigenista que dê condições de assistência social, saúde, educação e segurança. “O índio é cidadão como qualquer outro que reside no campo ou na cidade. Não adianta dar terras se eles não têm condições… Continuaremos obrigando-os a se tornarem pedintes nas cidades”, destaca. (o cinismo destes ruralistas travestidos de deputados não tem limites)
O que prevê a Constituição
O parlamentar cita que a Constituição Federal definiu terra indígena como aquela ocupada permanentemente pelos índios até sua promulgação, em 1988. “A Constituição determinou que as terras deveriam ser demarcadas até cinco anos da promulgação, portanto as terras que não foram demarcadas nesse período não são indígenas e não necessitam de regulamentação”, justifica Colatto. Segundo ele, onde não existia ocupação até aquela data não deve haver reconhecimento indígena. (E quanto a função social da terra que também está expressa na Constituição o deputado ruralista nunca ouviu falar e o repórter pelo visto também não).
Na Câmara dos Deputados, tramita a Proposta de Emenda a Constituição 215, que determina que as áreas indígenas sejam aprovadas apenas com a homologação do Congresso Nacional. “Defendo que o reconhecimento de terra indígena seja aprovado pelo Congresso Nacional e não por portaria da Funai que não respeita o direito à propriedade”, disse. (Se este projeto passar podemos dar adeus aos povos indígenas e aos povos quilombolas e adeus ao que resta de reservas naturais em nosso país, viraremos um deserto verde de cana, milho e soja pra biodiesel)
Colatto orienta que todos os produtores rurais entrem na Justiça defendendo seu direito de propriedade.