Em troca, a atuação brasileira na África pode representar uma grande oportunidade comercial e de investimentos, principalmente no setor agrícola
Tecnologia brasileira e know-how em programas sociais podem colaborar na luta para erradicar a desnutrição no continente africano. O enorme potencial agrícola da África desperta o interesse comercial do Brasil. O continente africano tem um longo histórico de fome e desnutrição. Desde os anos 1960, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), formada principalmente por países desenvolvidos, já destinou cerca de 650 bilhões de dólares em ajuda aos países da África Subsaariana.
Ainda assim, de acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o número de pessoas subnutridas na África aumentou de 175 milhões para 239 milhões nos últimos 20 anos.
Nos últimos anos o Brasil também se juntou à luta pela erradicação da fome no continente, principalmente devido ao know-how do país no próprio território. O relatório da FAO mostra que o Brasil conseguiu reduzir o número de subnutridos de 14,9% para 6,9% da população desde 1990.
Em troca, a atuação brasileira na África pode representar uma grande oportunidade comercial e de investimentos, principalmente no setor agrícola.
No final do mês de novembro de 2012, o diretor-geral da FAO, José Graziano, a presidente da Comissão da União Africana (UA), Nkosazana Dlamini Zuma e o ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva — em nome do Instituto Lula — reuniram-se em Addis Abeba, capital da Etiópia, para discutir a ajuda ao desenvolvimento e marcaram para março de 2013 uma reunião sobre “novas abordagens unificadas para acabar com a fome na África”.
Esforços e interesses brasileiros
Na opinião do coordenador executivo para a África do Instituto Lula, Celso Marcondes, os programas sociais desenvolvidos nos últimos anos ajudaram a “desenvolver a imagem do Brasil como um país que combate a má distribuição de renda com intensidade”. Segundo ele, os programas podem ser utilizados, com as devidas adaptações, nos países africanos.
Para as empresas brasileiras, o mercado africano em expansão abre boas oportunidades. “A balança comercial no Brasil cresceu muito fortemente em relação à África. Empresas brasileiras estão indo [para o continente] com cada vez mais força, tanto as grandes empresas, como também as pequenas e médias, que começam a descobrir esse novo mercado”, afirmou Marcondes em entrevista à DW Brasil.
Para o diretor de programas da ADRA-Moçambique (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais), Armindo Salato, que atua no país africano desde 1987, o diferencial da atuação brasileira no projeto está na experiência e na tecnologia.
Para ele, que já presenciou três grandes projetos quinquenais de agricultura contra a fome, não houve mudanças significativas nos investimentos tecnológicos. “Nunca vi trazerem um trator para esses projetos. Foi sempre a enxada com cabo curto, trabalho manual. Eu esperava que em algum momento pudéssemos começar, pouco a pouco, a mecanizar a agricultura nesses 15 anos.” Com a nova parceria, Salato espera que a agricultura industrializada se desenvolva.
Investimentos em agricultura industrial
De acordo com dados da União Africana, o continente tem potencial para aumentar consideravelmente sua produção agrícola, uma vez que quase 60% da terra cultivável ainda não é utilizada.
Uma das medidas a ser debatida na reunião em 2013 será a necessidade de se investir na produção agroindustrial, em vez da simples produção agrícola de subsistência. Para Salato, a “mecanização da agricultura poderá resolver de fato, em pouco tempo, o problema da fome”, mas alertou para a necessidade de se incluir os pequenos agricultores no programa.
Outra preocupação está nos tipos de culturas agrícolas a serem produzidas em larga escala. Salato teme que a industrialização da agricultura foque apenas na exportação e não invista no cultivo de alimentos.
“Temos que olhar primeiro para as necessidades da própria África, e a primeira necessidade é a alimentar. Antes de sermos produtores para vender para fora, temos que olhar para o consumo interno”, afirmou Salato.