Secretário usa prefeitura ilegalmente e dispara: "povo tem que se f..."
Secretário usou estrutura da prefeitura para campanha e disse que “povo tem que se f…”
O ex-secretário municipal de Obras de Blumenau (139 km de Florianópolis) Alexandre Brollo utilizou a estrutura da pasta e as prerrogativas do cargo para fazer campanha eleitoral para o candidato a vereador Fábio Fiedler (PSD), segundo investigação do MPE (Ministério Público Estadual), em Santa Catarina.
Brollo foi o coordenador da campanha de Fiedler, que se reelegeu com 5.542 votos, o segundo melhor desempenho dos candidatos a vereador do município. Escutas feitas pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) de Itajaí –subordinado ao MPE–, com autorização judicial, mostram que a participação dele na campanha começou antes mesmo do seu afastamento do cargo para por 80 dias, para concorrer nas eleições, iniciado em 13 de julho de 2012.
As investigações apontam que, em diversas ocasiões, Brollo saiu em horário de serviço para visitar eleitores ao lado de Fiedler, além de utilizar o celular funcional principalmente para tratar de assuntos relacionados à eleição.
Procurado pela reportagem, Brollo pediu para que as perguntas sobre as investigações do MP fossem encaminhadas por e-mail. Os questionamentos foram enviados ao ex-secretário, mas ele não os respondeu até o fechamento da reportagem.
Investigadores do Gaeco flagraram, em 2 de julho de 2012, Brollo e Fiedler juntos, no horário de expediente da secretaria, visitando supostos eleitores. Na visita, o ex-secretário utilizara um carro da prefeitura, de placa MHZ 3385.
Depois de se afastar temporariamente, Brollo continuou utilizando funcionários e a estrutura da pasta, além de fazer reuniões da campanha ao vereador dentro da secretaria, segundo o MPE.
A atuação de Brollo está ligada a um megaesquema de corrupção instalado em Blumenau, com o objetivo de desviar dinheiro público. Segundo o MPE, o esquema já teria sido responsável por um prejuízo de pelo menos R$ 100 milhões aos cofres públicos, o equivalente a 7% do orçamento de 2012 da cidade catarinense.
Interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, que constam na apuração de pelo menos 3.500 páginas, mostram indícios de práticas criminosas como fraudes em licitações, contratação de funcionários fantasmas, desvio de recursos e equipamentos do poder municipal e uso de cargo público para o favorecimento de particulares. Em 2012, o esquema teria alimentado o caixa de campanhas eleitorais.
Direcionamento de obras
De acordo com o MPE, Brollo determinava os locais das obras de asfaltamento que poderiam trazer mais votos para Fiedler. Em três ligações interceptadas no dia 2 de maio de 2012, Brollo conversa com um interlocutor não identificado e pede a indicação de ruas para asfaltar que possam beneficiar a candidatura do vereador.
Na conversa, Brollo afirma que várias vias que serão asfaltadas irão beneficiar candidatos do grupo político de Fiedler –o mesmo do então prefeito João Paulo Kleinubing (PSD)–, mas que é necessário escolher uma rua que beneficia diretamente o candidato a vereador.
“E uma pontual nossa, que nós queremos ser ‘pai da criança’, porque isso tudo que a gente tá falando vai ter um monte de pai. Um tiro pequeno que a gente possa fazer para a comunidade, dá para fazer a continuação do rancho ali, do lado da creche”, disse.
Segundo as investigações, várias vias asfaltadas em troca de votos não tinham autorização dos órgãos competentes, nem projeto, e foram mal executadas.
As escutas indicam ainda que Brollo repassava material de construção da prefeitura para terceiros, também de modo a angariar votos ao vereador.
Fraudes em medições
A Promotoria sustenta ainda que Brollo ajudava a fraudar medições de obras. Em uma das conversas transcritas, com data de 26 de abril de 2012, Brollo e Eduardo Jacomel, diretor-presidente da URB (Companhia de Urbanização de Blumenau), conversam sobre uma obra de asfaltamento na rua Dois de Setembro, à qual foi feito um aditivo de R$ 86 mil para a conclusão dos serviços.
Para o recebimento do valor adicional, seria necessário adulterar a medição do que já havia sido feito na obra, mas o responsável havia feito a medição correta. Na conversa, Brollo se prontificou a falar com o engenheiro que mediu a obra para que ele refizesse e medição de modo a permitir o desvio de parte dos recursos.
“Povo tem que se foder”
Em outra conversa, em 26 de junho de 2012, um interlocutor não identificado faz uma reclamação a Brollo a respeito de uma declaração de Fiedler, que questionou a aprovação, na Câmara Municipal, de R$ 1,4 milhão para a compra de vacinas para a gripe A. Na ocasião, o vereador disse que não haveria logística para distribuir as vacinas. Em resposta ao interlocutor, Brollo disse que “o povo tem que se foder.”
O interlocutor afirmou que Fiedler “às vezes peca pelas besteiras que fala”.
Interlocutor: “Ele não pode falar essas coisas… A população tá morrendo, já tão tudo revoltado e o Fábio fala um negócio desses. Ele tem que mentir um pouco de vez em quando.”
Brollo: “Ele sabe que não vão comprar.”
Interlocutor: “Dá um toque pra ele mentir um pouco mais… Ver um pouco mais o lado humano, do povo…”
Brollo: “O povo tem que se foder. Vão se fuder, vão pagar R$ 60 pila pra fazer as coisas (tomar a vacina).”
Para o Ministério Público Estadual, há indícios de que Brollo praticou os crimes de peculato apropriação (pelo uso do celular funcional e de carro oficial em campanha), compra de votos, além de improbidade administrativa.
Vinícius Segalla e Guilherme Balza, UOL