Lázaro Ramos conta que às vezes tem de dar "dez respiradas" para não se contrariar sempre com o problema do racismo. Ator também comentou sobre a representação do negro na TV, entre outros temas
O ator baiano Lázaro Ramos disse que quebrar barreiras tem sido uma constante na carreira. Lázaro afirmou que às vezes tem de dar “respiradas” para não se contrariar sempre com o problema do racismo.
“Às vezes tenho que dar dez respiradas, mas é uma tentativa. Cansa, mas você vê que é necessário continuar essa luta, pois o resultado será importante. Podemos aproveitar a diversidade do país e escrever uma nova história cultural. O Brasil é muito diverso para nos apegarmos à velha fórmula por tantos anos. E sou otimista ao ver tantos talentos que apareceram nas últimas décadas, como a Sheron Menezes, o JP Rufino. É essa identificação do público que faz com que as coisas mudem e evoluam. Eu vou dizer uma coisa… sou grato aos investimentos que a TV fez em mim. “Ó pai, ó” (séria exibida em 2008) trouxe um grupo de teatro inteiro para um seriado. E “Lado a lado” é tudo o que eu sonhei fazer na TV”, relatou.
Questionado sobre o papel da teledramaturgia no debate, o ator que foi revelado pelo Bando de Teatro Olodum, foi reticente. “O racismo na televisão não tem um caminho só. Falar do assunto, às vezes, é não tocar no assunto. É um problema que se apresenta de forma complexa e tem que ser tratado como tal”, comentou.
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Confira abaixo trechos da entrevista extraída do Jornal O Globo:
Você acha que, de fato, houve uma mudança na forma como o negro é representado?
Alguma mudança houve, sim: o aparecimento de novos atores, o protagonismo mais constante. Obras com dramaturgia diferenciada e inédita têm aparecido. “Lado a lado” é um marco histórico, mas vou citar “Aquele beijo”, do Miguel Falabella, que tinha vários negros no elenco. Mas, algumas questões ainda temos que refletir: Fala-se muito numa ascensão da classe C, de que a dramaturgia está indo em busca disso, mas eu sinto falta de ver uma família negra completa. Há um potencial riquíssimo a ser explorado. Por outro lado, acho que a gente sempre fica avaliando essa questão pelo lado dos atores, mas ainda não temos uma quantidade de produtores e diretores negros pensando numa dramaturgia. Acho que o microfone é importante, mas a caneta também. A gente traz a vivência naquilo que a gente faz. O olhar diverso é natural e bom. Dá conta da diversidade naturalmente, e do potencial do nosso país.
Qual a primeira vez que você, como espectador, ficou satisfeito ao ver o negro na TV?
A novela “A próxima vítima” (1995) inovou, é marcante. Em “Pecado capital” (1998) Antônio Pompêo inovou como um psicanalista, era bonito ver a maneira como fazia, assim como fez a Cacau Protásio em “Avenida Brasil” (2012). Como espectador, acho que “Lado a lado” foi importantíssima. Eu me identifico cada vez que é mostrada uma coisa nova, um novo caminho.
Para você, os autores precisam ser mais ousados?
Temos sempre que ressaltar os atores que vieram antes da gente e que fizeram uma militância importantíssima, nos alertaram e abriram os olhos dos autores para essa questão. O público foi mostrando e dizendo que se identifica, através da audiência. A presença de negros em papéis de destaque em novelas como “Cobras & lagartos” e “Da cor do pecado” (protagonizada por sua mulher, Taís Araújo, em 2004) é o espectador dizendo: eu gosto, eu quero isso. O verdadeiro sucesso é dar a ele algo que ele nem sabia que queria. E alguns autores entenderam que essa ousadia era totalmente possível.
Novelas históricas que mostram que mostram escravos no tronco depreciam a imagem do negro na TV?
Há jeitos e jeitos para isso ser mostrado. “Lado a lado” abordou a Revolta da Chibata, o cara tomou chibatadas e se tornou herói. Você vê um cara numa situação de sofrimento e quer ver ele sair dali. É um passo importante. As coisas têm que continuar sendo feitas, a audiência pode ficar contrariada, mas é importante se chegar a um ponto entre o artístico e a observação social para que a gente possa ter uma dramaturgia justa e rica.
Quebrar barreiras como “o primeiro protagonista negro” é cansativo?
Quebrar barreiras é cansativo, sim. Às vezes tenho que dar dez respiradas, mas é uma tentativa. Cansa, mas você vê que é necessário continuar essa luta, pois o resultado será importante. Podemos aproveitar a diversidade do país e escrever uma nova história cultural. O Brasil é muito diverso para nos apegarmos à velha fórmula por tantos anos. E sou otimista ao ver tantos talentos que apareceram nas últimas décadas, como a Sheron Menezes, o JP Rufino. É essa identificação do público que faz com que as coisas mudem e evoluam. Eu vou dizer uma coisa… sou grato aos investimentos que a TV fez em mim. “Ó pai, ó” (séria exibida em 2008) trouxe um grupo de teatro inteiro para um seriado. E “Lado a lado” é tudo o que eu sonhei fazer na TV.
É papel da teledramaturgia discutir o racismo?
O racismo na televisão não tem um caminho só. Falar do assunto, às vezes, é não tocar no assunto. É um problema que se apresenta de forma complexa e tem que ser tratado como tal.
Acha que João Vicente, seu filho de 2 anos, vai ver uma TV diferente da sua?
Eu espero que sim. Eu, como pai e consumidor, procuro dramaturgia que vá fortalecer a autoestima dele. Meu filho vai ver o “Karatê Kid” estrelado pelo filho do Will Smith. Já está guardado.
com O Globo