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Os corpos negros que assustaram o Shopping Vitória

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Shopping Vitória: corpos negros no lugar errado. Presos, achincalhados e sob os aplausos dos ‘consumidores’

No dia seguinte ao tumulto que assustou clientes e lojistas por volta das 18 horas de sábado, o movimento no Shopping Vitória estava tranquilo, e em nada parecia com a confusão presenciada menos de 24 horas antes. Mas, nos corredores, o assunto ainda repercutia.

A assessoria de comunicação do Shopping Vitória descartou a ocorrência de um arrastão no interior do estabelecimento e afirma que nenhuma loja foi roubada ou danificada durante o tumulto.

Uma lojista, que pediu para não se identificar, estava nas proximidades da praça de alimentação e presenciou a abordagem dos policiais e conta que viu agressões aos suspeitos. “A maioria dos jovens abordados eram menores de idade. Vi um policial dando um soco, de baixo para cima, em um garoto”, afirma.

Confusão no Shopping Vitória (Reprodução / Facebook)

O técnico em informática Eduardo Elias estava na praça de alimentação e viu a ação policial. Apesar dos momentos de susto com a invasão do shopping, ele diz que a polícia agiu com truculência. “Parte dos que estavam sendo revistados era menores de idade. Vi um garoto sendo jogado no chão por um policial”, afirma.

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Confira abaixo texto de Douglas Belchior sobre o incidente no Shopping Vitória:

Shopping Vitória: corpos negros no lugar errado

Sábado, 30 de novembro, fim de tarde. Várias viaturas da Polícia Militar, Rotam e Batalhão de Missões Especiais cercaram o Shopping Vitória, na Enseada do Suá, no Espírito Santo. Missão: proteger lojistas e consumidores ameaçados por uma gente preta, pobre e funkeira que, “soube-se depois”, não ocuparam o shopping para consumir ou saquear, mas para se proteger da violência da tropa da PM que acabara de encerrar a força o baile Funk que acontecia no Pier ao lado.

Amedrontados, lojistas e consumidores chamaram a polícia e o que se viu foram cenas clássicas de racismo: Nenhum registro de violência, depredação ou qualquer tipo de crime. Absolutamente nada além da presença física. Nada além do corpo negro, em quantidade e forma inaceitável para aquele lugar, território de gente branca, de fala contida, de roupa adequada.

E a fila indiana; e as mãos na cabeça; e o corpo sem roupa, como que a explicitar cicatrizes nas costas ou marcas de ferro-em-brasa, para que assim não se questione a captura.

A narrativa de Mirts Sants, ativista do movimento negro do Espírito Santos nos leva até a cena:

“Em Vitória, a Polícia Militar invadiu um pier onde estava sendo realizado um baile funk, alegando que estaria havendo briga entre grupos. Umas dezenas de jovens fugiram, amedrontados, e se refugiaram num shopping próximo.

Foi a vez, entretanto, de os frequentadores do shopping entrarem em pânico, vendo seu ‘fetiche de segurança’ ameaçado por “indesejáveis, vestidos como num baile funk, de tez escura e fragilizando o limite das vitrines que separam os consumidores de seus desejos”. Resultado: chamaram a PM, acusando os jovens de quererem fazer um arrastão.

A Polícia chegou rapidamente e saiu prendendo todo e qualquer jovem que se enquadrasse no ‘padrão funk’. Fez com que descessem em fila indiana e depois os expôs à execração pública, sentados no chão com as mãos na cabeça. E isso tudo apesar de negar que tenha havido qualquer arrastão, “exceto na versão alarmista dos frequentadores”.

Se chegou a haver algo parecido com uma tentativa de ‘arrastão’ ao que parece é impossível saber. Para alguns dentre os presentes, a negativa da PM teve como motivo “preservar a reputação do shopping como templo de segurança”. Se assim foi, a foto acima, com os jovens sentados no chão sob vigilância, e o vídeo abaixo, mostrando-os sendo forçados a descer em fila indiana sob a mira da Polícia, se tornam ainda mais graves como exemplos de arbítrio, violência e desrespeito aos direitos humanos. E isso só se torna pior quando acontece ainda sob os aplausos dos ‘consumidores’…”

O suposto disparo, a dita “confusão” e o inevitável corre-corre só houve após a chegada da polícia no baile Funk.

O secretário de Segurança Pública do Estado, André Garcia, mente. Afirma não ter havido abuso. “Havia um tumulto e algumas pessoas relataram furtos na praça de alimentação. A polícia agiu corretamente. A intenção era identificar quem invadiu o shopping”, diz ele.

Invasão? Muitos relatos afirmam que os jovens se “abrigaram” no shopping para se proteger! Testemunhas disseram que as pessoas se assustaram foi com a presença e a forma de atuação da polícia dentro do shopping.

E mente ao dizer que “a polícia entrou no shopping após receber informações de que pessoas armadas estariam no local”, algo que não foi constatado pelas revistas feitas no interior do estabelecimento. Os únicos armados, caro secretário, eram seus homens.

Lojistas e consumidores relataram agressões aos ‘suspeitos’: ” Vi um policial dando um soco, de baixo para cima, em um garoto”; “o clima ficou mais tenso ao serem vistos policiais entrando armados no shopping”; “Parte dos que estavam sendo revistados era menores de idade. Vi um garoto sendo jogado no chão por um policial”.

A própria assessoria de comunicação do Shopping Vitória descartou a ocorrência de um arrastão no interior do estabelecimento e afirmou que nenhuma loja foi roubada ou danificada;

Mas ao final, o Secretário assume sua tarefa racista: “Quando se encontra uma atitude suspeita, a abordagem é uma ação normal. A polícia está autorizada a fazer isso. A população tem que entender”, disse ele a um jornal, afirmando que o critério para uma abordagem depende das circunstâncias, perfil das pessoas e quais queixas são apresentadas.

Sim, e é verdade, “Sr. Secretário”: circunstâncias, perfis e queixas, que sempre tem como principal objeto de provocação o corpo negro. Alguma novidade?

REAÇÃO

Lula Rocha, importante militante do movimento negro do Espírito Santo, em conjunto com diversos outros ativistas e organizações do movimento negro e movimentos sociais da capital prometem reagir e organizar um mega baile funk ao ar livre em frente o Shopping Vitória.

Criminalizado como um dia fora a capoeira, o futebol, o samba a MPB e o RAP, o funk moderno é tão contraditório em seu conteúdo quanto o é resistência em sua forma e estética. E se está servindo também para fazer aflorar o racismo enraizado na alma das elites hipócritas – muito mais vinculadas aos valores da luxuria e ostentação que a turma do funk, declaro pra geral: Sou funkeiro também!

Vídeos:

com NegroBelchior e A Gazeta