Eric Gil Dantas
Colunista
Economia 08/Jan/2014 às 22:40 COMENTÁRIOS
Economia

Quando o mínimo não é o mínimo

Eric Gil Dantas Eric Gil Dantas
Publicado em 08 Jan, 2014 às 22h40

A partir deste mês, já está em vigor o novo aumento para o salário mínimo no Brasil. A presidente Dilma havia assinado o decreto no dia 23 de dezembro de 2013, e o novo valor de R$724 entrou em vigor no dia 1º de janeiro deste ano. O aumento foi de 6,78%, o que significa um aumento real de 0,75%, considerando a previsão para o IPCA do último Boletim Focus – pesquisa feita pelo Banco Central – que prevê inflação de 6,03%.

O aumento do salário mínimo foi um dos principais discursos feitos pelos governos do PT, com isto, a ideia deste artigo é discutir avanços e limitações do salário mínimo nos últimos anos.

A história do salário mínimo

O salário-mínimo foi produto do debate na Era Vargas de criação da CLT, em meados da década de 1930. Ele foi regulamentado pela primeira vez através da Lei nº 185 de janeiro de 1936 e do Decreto-Lei nº 399 de abril de 1938, e fixado seus valores em 1º de maio de 1940, pelo Decreto-Lei nº 2162. Até o golpe militar de 1964, seu valor era definido por comissões tripartites (empresários, trabalhadores e governo), sendo eliminada esta forma no governo ditatorial.

Segundo estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), publicado em 2011, “Salário mínimo, instrumento de combate à desigualdade”, quando foi instituído em 1940, o salário-mínimo, que na capital paulista era de 220 mil réis, equivalia a R$ 1.202,29 em valores corrigidos pela inflação, levando em conta a atualização com base no Índice do Custo de Vida (ICV) para a capital paulista, bem acima do atual. Em 1959, durante um período de crescimento econômico acelerado, no governo de Juscelino Kubitschek, o mínimo chegou ao seu auge de R$1.732,28 em valores de 2011. Já em janeiro de 1996, chegou ao equivalente de R$266,17 em cifras corrigidas.

O salário mínimo era calculado de acordo com a região em que o trabalhador residia e deveria atender somente às necessidades básicas do trabalhador e de sua família.  Para a definição do valor foram considerados os salários praticados na região e também uma referência de cálculo do custo do trabalhador por meio de uma cesta básica. Hoje, o IBGE considera o padrão de família sendo composta por quatro pessoas, que é a média da população brasileira dividida pelo total de domicílios, número utilizado pelo governo para a definição do salário.

O salário mínimo na era do Real

Desde a instauração do Plano Real até 2013, intervalo de 19 anos, o salário mínimo no Brasil cresceu em termos reais (subtraindo o IPCA) 119,04%. O maior aumento deste período aconteceu em 1995, sendo de 31,93%, período ainda em processo de estabilização monetária (neste ano, o IPCA foi de 22,41%). O ano de maior retração também foi no governo FHC, em 1999, quando o salário mínimo caiu, em termos reais, 4,32%.

gráfico salário mínimo
Fonte: IBGE [Elaboração própria]

Em períodos presidenciais temos que de 1995 a 2002, no governo FHC, o crescimento real do salário mínimo foi de 53,83%, já para os oito anos do governo Lula foi um pouco menor, 53,58%. Os dois primeiros anos de Dilma, o aumento foi de 11,62%.

O salário mínimo do DIEESE

O DIEESE calcula, mensalmente, o salário mínimo necessário para uma família média brasileira viver de acordo com a Constituição de 1988, com gastos relativos à alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte, ou mais especificamente da seguinte forma:

A constituição, promulgada em 5 de outubro de 1988, define o salário mínimo como aquele fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender às suas necessidades vitais básicas (do trabalhador) e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, …(Constituição Federativa do Brasil, art. 7º – IV).

Para calcular o Salário Mínimo Necessário, o DIEESE considera o preceito constitucional de que o salário mínimo deve atender às necessidades básicas do trabalhador e de sua família e que é único para todo o país. Usa como base também o Decreto de lei 399, que estabelece que o gasto com alimentação de um trabalhador adulto não pode ser inferior ao custo da Cesta Básica Nacional. (DIEESE, 1993, p. 6)

O último valor disponibilizado pelo departamento é o do salário mínimo necessário para novembro de 2013, que seria de R$2.761,584. A diferença para o vigente, atualmente, seria de R$2.037,58, ou de 3,8 vezes o valor atual. Podemos considerar que é menor do que quando promulgado o Real, em Julho de 1994, em que a diferença estava em 9,1 vezes, um absurdo ainda maior.

No entanto, ainda estamos muito longe do que poderíamos entender como um piso digno para um trabalhador e sua família. O que o DIEESE calcula que seria o mínimo para uma família brasileira viver dignamente não é, sequer, a realidade de um trabalhador médio, que ganha, segundo o Ministério do Trabalho, R$2.080,07. Mas a política de valorização do salário mínimo continua urgente, tendo em vista que cerca de 48,2 milhões de pessoas ainda têm rendimentos referentes a este nível.

Bem, mas com um piso salarial tão baixo, não parece estranho termos uma concentração de renda tão alta, ganhando de países como Zâmbia, Papua Nova Guiné e Sri Lanka.

Referências

DIEESE. Cesta Básica Nacional: Metodologia. 1993. Disponível em: <http://www.dieese.org.br/metodologia/metodologiaCestaBasica.pdf> Data de acesso: 06 de janeiro de 2014.

*Eric Gil é economista do Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) formado pela Universidade Federal da Paraíba, mestrando no Programa de Pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná; escreve quinzenalmente para Pragmatismo Político

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