Jovem revela como impediu um linchamento no Rio de Janeiro
“Uma das experiências mais aterrorizantes da minha vida. Eu me confrontei com animais”. Universitária de 22 anos conta como impediu um linchamento
A estudante de arquitetura Mikhaila Copello, que sozinha evitou que a ira de um grupo de moradores da região zona oeste do Rio matasse um um jovem que acabara de roubar um celular, contou a história em sua página do Facebook. O caso ocorreu um dia depois da morte de Fabiane Maria de Jesus, vítima de linchamento no Guarujá.
A histeria coletiva
Bom, eu não sou muito de falar sobre nada além de humor no facebook, muito menos de postar sobre política, mas hoje passei por uma das experiências mais aterrorizantes da minha vida:
Estava realizando minha primeira entrevista para a pesquisa sobre intervenções temporárias, num papo incrível com a Fernada, quando ouvi do outro lado da rua : “Pega ladrão!” , num ato instintivo aproximei meus pertences de mim, achando que tudo aquilo que ali acontecia, mesmo que atravessando a rua, estava longe de mim, quando cercaram o tal do sujeito, e ele , no desespero, voltou correndo na direção do bar que eu estava.
Nisso, um jovem, de uns 20 poucos anos, forte, deu uma banda no sujeito, que voou com a cara no chão, ficando com o rosto completamente dilacerado, sendo recebido então com chutes e pontapés na cara, e eu não aguentei. Pode-se falar de instinto, mas eu levantei.
Fui até o sujeito, separei a briga, aos berros, enquanto uma multidão se reunia aos gritos de “mata! mata!”, e ouvi “sorte sua que você é mulher, se não apanhava também”. Deixei o sujeito – branco, entre 25-35 anos – na parede, pedi que ligassem para a polícia e pedi um pano pra estancar aquelas poças de sangue que escorriam no chão.
Nisso surgiram as ameaças. “Se fosse com você, você ia deixar que ele apanhasse” ou você não deve ser moradora da freguesia”. Que adiantava eu dizer que já fui assaltada diversas vezes? Ou que a própria assaltada não permitiu que seu namorado machucasse o homem? Por quantas vezes eu tive que gritar “vocês não são Deus, e não podem decidir a morte de um ser humano”, e ser recebida com o adjetivo de “defensora de bandidos”.
Por mais que eu berrasse “Vocês não entendem nada, eu não defendo o que ele fez! Que sociedade é essa que acabamos com bandidos virando assassinos? Eu não vou deixar ninguém morrer”, e eu tremia, e tremo até agora, tive medo de ser espancada por ele, de ver tanto ódio nos seus olhos, de ouvir que eu não poderia chegar perto dele não, porque ele é bandido, e precisa morrer. O cara ainda falou: “Ele deu sorte de você estar aqui, porque eu ia deixar meu cachorro matar ele”
Que chegue logo a polícia, e chegou.
O pior foi que os que tanto queriam matar o homem, criticaram muito nossa polícia, porque “ela não faz nada, não funciona”, e a primeira frase do policial, ao chegar, foi dizer: “ esse devia ter apanhado mais; gosta de bandido, então leva pra casa”, recebendo aplausos da maioria que estava ali.
Vocês entenderam tudo errado. Quem defende essas pessoas não é defensor de bandido ou de monstros, mas está te dando uma chance de não se tornar um monstro como eles.
E faria tudo de novo.
informações de Mikhaila Copello. Edição: Pragmatismo Político