Eleição presidencial: Especialistas apontam tendências de cada candidato na política econômica e analisam preparo para os debates
Faltando menos de cinco meses para o primeiro turno das eleições, os pré-candidatos à Presidência da República dão sinais de como serão seus programas de governo em relação à política econômica. As candidaturas oficiais, contudo, só estarão disponíveis a partir de 6 de julho. Especialistas oferecem uma análise dos discursos que mais têm se destacado nos últimos meses e traçam um perfil do eleitorado que cada um deles buscar atingir.
Em relação à atual presidenta, Dilma Rousseff (PT), que lidera as pesquisas de intenção de voto, Marcus Ianoni, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), comenta que o “campo do PT está um tanto quanto ocupado pelo próprio PT”, no sentido de articular um modelo de desenvolvimento voltado para a atividade produtiva, que interesse tanto aos capitalistas do setor produtivo quanto aos trabalhadores, além de propiciar arrecadação de impostos para a oferta de políticas sociais.
Heron do Carmo, professor no Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP), por sua vez, acredita que o discurso do governo atual é mais voltado para o público de baixa renda, que se beneficia do Bolsa Família. “O foco do discurso do governo atinge mais de perto essa população, se preocupa com a questão da adequação do discurso, sempre se posiciona com o ‘nós fizemos’ e ‘vamos continuar a fazer’, no presente.”
O candidato que tem aparecido em segundo lugar nas pesquisas, Aécio Neves (PSDB), foca, principalmente, no mercado financeiro, conforme explica Marcus Ianoni. Ele ressalta que o coordenador do programa econômico do Aécio é Armínio Fraga, o que “já diz muito”, devido à trajetória de Fraga no mercado financeiro, como executivo e como empresário, que já foi presidente do BCB.
“Seu discurso é, em primeiro lugar, para os grandes capitalistas do mercado financeiro e para os rentistas. Tem falado, por exemplo, em fazer reforma tributária logo no início do mandato e em convergir as metas de inflação para o centro da meta. Obviamente, seria uma reforma tributária que aumentaria o caráter regressivo da estrutura tributária brasileira. Por outro lado, a política de conduzir as metas de inflação para o centro seria implementada com a elevação das taxas de juro, de modo que haveria um desestímulo às atividades de produção e consumo e um estímulo ao rentismo associado aos títulos públicos, com o que as instituições financeiras, a começar pelos bancos, também se beneficiariam”, pontua Ianoni.
Heron avalia que Aécio tem um discurso mais voltado à questão das reformas, com foco no ajuste do Plano Real, na queda da inflação, em uma busca de distanciamento do PT. Discursos como o do Plano Real, no entanto, salienta o professor da USP, não atraem os mais jovens, por exemplo, que pouco usaram as moedas anteriores ou nem chegaram a usá-las.
“Em termos de eleição, você tem que agradar o eleitorado e o eleitorado que você tem que agradar não está nem aí com o mercado. O mercado é importante para menos de 1% da população. (…) aplicação, os juros, isso está muito fora da realidade de 95% da população brailiera. A tentativa de agradar o mercado é para conseguir financiamento”, pondera Heron, que lembra, todavia, que um discurso voltado à inflação é importante também, no sentido de agradar o eleitor de renda média e até de baixa, pela necessidade da responsabilidade salarial, discurso que deve estar no programa de Aécio.
Quanto ao terceiro colocado nas pesquisas, Eduardo Campos (PSB), que contará com Marina Silva como vice, Ianoni destaca que um dos principais assessores de candidato é Eduardo Gianetti da Fonseca, um economista liberal. “O candidato tem falado em formalizar a independência operacional do BCB, que hoje funciona de modo informal. Essa medida sinaliza comprometimento com os interesses dos agentes dos mercados financeiros. Além disso, ele também fala em focar a inflação no centro da meta, embora implementaria isso ao longo de seu eventual mandato. Propõe também uma reforma tributária a ser feita em prazo mais longo, oito anos.”
Ianoni considera que, como há dois grandes campos em disputa política no Brasil, o social desenvolvimentismo e o neoliberalismo, o primeiro ocupado pelo PT, qualquer projeto de oposição tende a convergir no sentido do campo neoliberal. “Aécio Neves já é vinculado ao PSDB, partido que colocou em prática as políticas neoliberais, após a tentativa fracassada de Collor. Essa mesma tendência a ocupar o campo liberal observa-se em Eduardo Campos, talvez em um grau um pouco menor que o de Aécio, mas fica claro que o candidato do PSB tende muito mais a se afastar do PT e a se aproximar das propostas do PSDB do que o contrário.” Eduardo Campos, todavia, com ajuda de Marina Silva, vem se empenhando para realçar suas diferenças em relação às propostas de Aécio.
Para Heron, o discurso político econômico de Eduardo Campos é o que parece mais interessante, por propor inflação de 3%. “Eu tenho notado que os governos prometem reformas que não dependem do executivo e esquecem de algo que é fundamental para colocar o país nos eixos, que é o controle da inflação, que depende do executivo. Não adianta fazer reforma, sem pensar na inflação. É uma questão de acertar a política fiscal e monetária”, explica.
O problema, no entanto, é que trata-se do tal discurso que não faz sentido para a maior parte do eleitorado, que percebe que o preço do tomate subiu, mas não compreende os mecanismos do IPCA. “Falar em IPCA com o eleitor, mesmo o bem instruído, não quer dizer nada”.
O discurso adotado pela vice Marina na semana passada, acrescenta Heron, no entanto, acabou encantando os jovens.
Heron também destaca que o discurso econômico do pastor Everaldo Pereira, candidato do PSC, surpreendeu por seu caráter liberal e inédito, muito próximo das ideias da igreja calvinista, de apontar que cada um dos eleitores é responsável pela sua vida, e que é preciso “fazer por merecer”, o que se encaixa na ética protestante.
O professor da USP pondera, contudo, que ainda não foi possível ver um candidato com propostas realmente novas, como Jânio Quadros com sua vassoura ou Collor com a caça aos marajás. “Falta alguém com uma metáfora mais contundente. Se alguém achar isso, o governo está perdido, as pessoas estão à espera disso.” Dilma e Aécio, acredita, estariam tomando “muito cuidado” com o que dizem, e por isso pareceria que “falta alguma coisa”.
Uma distinção maior entre as diversas linhas de política econômica dos candidatos, completa Heron, só será possível em um período mais próximo da divulgação do programa eleitoral.
Jornal do Brasil