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O que vi e vivi na estreia da Copa 2014

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Detalhes e curiosidades que a TV não mostrou sobre o jogo de abertura da Copa do Mundo de 2014 no Brasil: antes, durante e depois

Caio Barbosa, Ideias Cadentes

Tendo o privilégio de assistir ao jogo de abertura da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, creio ser interessante relatar algumas coisas sobre esta experiência única, detalhes que a TV não consegue (ou quer) mostrar.

Primeiro, chegar ao estádio foi tranquilo. O “Expresso da Copa”, partindo da Estação da Luz direto a Itaquera, foi tranquilo, sem percalços. Na chegada na estação Corinthians-Itaquera, uma grande multidão lentamente se dirigia ao estádio que, de acordo com as placas, ficava a uns 900m da estação. Nada muito problemático; afinal, qualquer torcedor consciente se dirigiu ao jogo com bastante antecedência. No meu caso, saí da região central de São Paulo às 13h e consegui chegar, andando tranquilamente e parando para tirar fotos do percurso, às 14h30. Nas imediações do estádio, tudo muito bem organizado e razoavelmente rápido para entrar. Bastou passar por um detector de metais, validar o ingresso e só. E nem fizeram questão de ver se tinha o meu nome escrito nele ou não.

A propósito, dica para quem quer ir a um jogo e não tem ingresso: havia várias pessoas procurando ingresso e um ou outro querendo vender. E essa estratégia funcionou, pois algumas pessoas conseguiram comprar e assistir ao jogo, e até mesmo sem pagar absurdos. Então, para quem quer tentar a sorte, vale a pena chegar cedo na estação perto do estádio, colocar uma plaquinha de que procura ingresso e negociar.

Dentro do estádio, diversas atrações eram colocadas para os torcedores, assim como stands para venda de refrigerantes, cervejas e uma disputada loja de souvenirs. As filas eram um pouco grandes, mas até que as coisas fluíam rapidamente. Um latão de Brahma 500ml era 10 reais; Budweiser era 13. Caro, mas razoável para eventos de grande porte. O mais legal era que você ganhava um copo comemorativo do jogo: uma ótima lembrança daquele dia.

Depois de pegar duas fichinhas de cerveja e comprar uma delas para levar para dentro do estádio (as latas ficavam com os vendedores, só podia levar o copo de plástico), foi tranquilo achar o meu lugar, e sentei 10min antes de começar a cerimônia de abertura. No caminho, não notei obras inacabadas ou improvisadas. Poderia até haver, mas não havia nada de chamar a atenção. Contudo, algo a se notar era a quantidade de lugares vazios quando a cerimônia começou. Alguns podem pensar que era em razão de alguma dificuldade dos torcedores de acessar ao estádio, mas não é verdade: o fato é que muitos não pareciam estar se importando muito com isso, e ficaram curtindo os arredores do estádio, ou estavam ainda nas filas para bebidas, comidas e souvenir.

Quanto à cerimônia, a impressão era a mesma: uma apresentação fraca, com exceção da parte final, com o show de Pitbull, Jennifer Lopez e Claudia Leitte, que conseguiu animar a galera. Mas até aí, não me lembro de cerimônias de abertura de Copa do Mundo que foram memoráveis. O maior destaque, e assim estava descrito no programa da abertura distribuído no estádio, seria a demonstração do projeto Walk Again do cientista brasileiro Miguel Nicolelis, no qual um paraplégico iria andar graças a um exoesqueleto controlado pelo cérebro e dar o chute inicial do dia. Entretanto, se não foi possível ver na TV, de dentro do estádio menos ainda. Não foi possível nem ver ou perceber que já tinha ocorrido. Era tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que ninguém iria prestar atenção no canto do estádio. Nem os telões deram ênfase ao momento. Uma tremenda bola fora da Fifa, que pareceu até proposital.

Não tecerei comentários em relação ao jogo em si, mas antes do mesmo, é inevitável não citar a parte do hino. Muitos me perguntaram se me emocionei ao cantar o hino junto a todo mundo. Na verdade, não. Imagino que seja que nem uma cena de guerra: se você assiste a todos aqueles guerreiros gritando juntos enquanto partem pro combate, você se emociona. Agora, se você é um desses guerreiros, você está tão compenetrado que nem consegue prestar atenção no que está ocorrendo. Se eu parasse para prestar atenção, talvez me emocionasse. Só que antes de ser um hino, foi mesmo um grito de guerra, e o grande culpado por eu estar levemente sem voz no momento. E saber que pelo menos centenas de milhões de pessoas assistiram àquilo, que emocionou tanta gente, principalmente os próprios jogadores, é algo que dá muito orgulho. É um momento que eu vou guardar pro resto da vida.

O que não deu tanto orgulho foram as vaias e xingamentos à presidente Dilma Rousseff. Ela ocorreu pelo menos umas quatro vezes, o que é lamentável. O motivo para isso tinha uma origem ainda mais nefasta: quem olhasse os torcedores do estádio poderia pensar que o Brasil é um país de gente branca, com muitos loiros, e um ou outro japonês. Negros? Não existem. Sim, havia um ou outro no estádio, mas nenhum entre os mais ou menos 500 torcedores à minha volta. Portanto, as vaias e xingamentos partiam claramente de uma elite branca e despolitizada, que de educada não tinha nada. Mas, se serve de consolo, o ato não era consensual: enquanto muitos ficavam quietos, uma minoria criticava quem estava xingando, e diziam frases como: “se veio xingar a presidente, vai pra casa, está fazendo o quê aqui?”, “coxinhas!”, “torcedores de pay-per-view!”, e até mesmo “ei, Aécio, vai tomar no c…”.

Por outro lado, ainda de notável em relação ao comportamento da torcida foi o apoio incondicional à seleção brasileira em campo. Não era o torcedor típico de estádio, então a animação era contida, mas as vaias ao campo eram só para a Croácia, para tentar desestabilizar o time rival. No gol contra de Marcelo, uma cena bonita: um choque inicial, seguido de gritos de “Marcelo, Marcelo!” para animar o jogador. O incentivo ao time só era interrompido por momentos de tensão. Houve diversas tentativas de “ola”, mas a maioria, frustrada. Perto do fim, até houve uma rápida e estúpida briga entre dois torcedores brasileiros, mas foi criticada pelos outros e separada pelos seguranças no local de imediato.

Durante o jogo, algumas falhas. Aparentemente, alguns refletores desligaram no meio do jogo, mas eu nem percebi, já que (felizmente) ainda era dia. Ainda assim, é uma falha grave. No estádio, era possível ver algumas pessoas com lata, e até mesmo um ou outro com isqueiros e fumando, o que não era permitido. Só que o problema mesmo foi no intervalo: havia poucos pontos de venda de bebida dentro do estádio, o que formou filas que se mantinham mesmo após o 2º tempo começar. Pra piorar, fui pegar a outra cerveja que tinha comprado, e tive que ouvir em duas ocasiões, após duas filas diferentes, que a ficha não era válida ali, em uma evidente desorganização. Felizmente, após reclamar bastante com a atendente, que não tinha culpa de nada, ela foi compreensiva o suficiente de aceitar a ficha por conta própria e fornecer a minha cerveja. Portanto, houve falhas, mas são erros facilmente consertáveis para os próximos jogos, se a organização do evento aprender com eles.

No final, saída tranquila do estádio. Conversei um pouco com algumas pessoas que trabalharam no estádio, querendo saber a opinião sobre a organização e o jogo. Um deles me perguntou quem fez os gols. Infelizmente, os seguranças precisam ficar virados de costas para o campo, apenas observando a torcida, então não conseguiam ver os lances. Eles fizeram algumas leves críticas à organização, mas, no geral, estavam felizes. Perguntei a um voluntário se tinha valido a pena, e a resposta foi rápida e curta: “Muito”. Inclusive, os voluntários fizeram uma bela cena na saída: formaram uma linha em torno do estádio, dando tchau para os torcedores e cantando com um sorriso no rosto: “Eu sou brasileiro/com muito orgulho/com muito amor”. Um tapa na cara de quem criticou quem iria trabalhar de graça, pois não teriam benefícios.

E assim, a impressão geral é de que tudo correu bem e de que o Brasil tem, sim, condições de organizar uma copa. Houve falhas e atitudes deploráveis de parte da torcida elitizada, mas há pontos positivos. E se há algo que compensa tudo de errado é o povo brasileiro. Os brasileiros cumprimentavam, faziam graça e tiravam fotos com os croatas, além de estarem sempre dispostos a ajudar. Se havia algum estrangeiro perdido, logo surgia um brasileiro para ajudar, mesmo sem solicitarem ou mesmo sem falar alguma palavra de inglês. Um deles, após explicar sobre as linhas de metrô, apertou a mão dos croatas e disse com um sorriso: “Welcome to Brazil”. Então se há uma coisa que deve nos dar orgulho é a recepção calorosa e hospitaleira do nosso povo. Essa é, certamente, a lembrança mais valiosa que os estrangeiros vão levar daqui.