Enquanto Miguel Nicolelis é achincalhado por Veja e seus leitores, as principais publicações científicas do mundo exaltam o seu trabalho
“Estou muito feliz em ver que o investimento de tantos anos resultou nessa aplicação da Ciência. É assim que a Ciência funciona. É maravilhoso.”
“Estou muito satisfeito em ver que um investimento que o NIH fez em pesquisa básica nos EUA, durante 25 anos, no laboratório do doutor Nicolelis, deu frutos no Brasil, com a pesquisa clínica financiada pelo governo brasileiro. A Ciência é global”
“Estou muito encantado, porque uma quantidade muito grande de gente, num evento esportivo, vai poder ver, pela primeira vez, uma demonstração do que a Ciência é capaz de fazer e dar esperança para milhões de pessoas no mundo todo”
As falas acima são de Francis Collins, um dos cientistas responsáveis pelo revolucionário Projeto Genoma Humano, que em 2001 fez o mapeamento do DNA e descortinou infinitas possibilidades para a Ciência. Ele atualmente é diretor do National Institute of Health (NIH), órgão financiador de pesquisas biomédicas ligado ao governo americano, que faz dele o responsável por um orçamento de US$ 38 bilhões. No mês passado, Collins veio ao Brasil para conhecer de perto uma das pesquisas financiadas por seu instituto: o Projeto Andar de Novo comandado pelo neurocientista Miguel Nicolelis. Com uma equipe formada por cientistas do mundo inteiro, o objetivo do brasileiro é devolver mobilidade para paraplégicos através de uma neuroprótese, conhecida como exoesqueleto.
Mas parece que alguns compatriotas de Nicolelis não concordam com Francis Collins. Pessoas do alto gabarito de Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi e Roger do Ultraje a Rigor, estão em franca campanha contra o resultado de 30 anos de estudos do professor.
Vejamos o que os nossos PHDs em neurociência têm a dizer. Primeiro vamos com Mainardi e a resposta à queima roupa do cientista:
Direto de seu laptop em Veneza, Diogo debocha do resultado do árduo trabalho do único brasileiro cotado para receber o prêmio Nobel. De quebra, pra engrossar mais uma vez seu declarado desprezo pelo Brasil, Diogo renega as incontestáveis contribuições de Santos Dumont para a aviação. O ex-colunista de VEJA ignora as diversas etapas de construção do conhecimento científico, em que grandes descobertas são feitas coletivamente ao longo do tempo. É o que o neurocientista tentou explicar para Mainardi.
Depois de Mainardi, foi a vez de Reinaldo Azevedo provocar Nicolelis:
A contribuição significativa de um brasileiro para a Ciência parece realmente incomodar a nova comunidade científica emergida da inteligência vejiana.
Mas se Nicolelis é achincalhado na revista VEJA, na britânica Nature – uma das mais antigas e importantes revistas científicas do mundo – seu projeto vem sendo acompanhado atentamente desde os primeiros resultados e, nesse mês, foi destaque de capa.
Mas não acabou. Ainda temos mais um gênio da raça para botar o dedo nessa cumbuca. A cereja do bolo não veio de nenhum articulista da VEJA, mas de um leitor assíduo. Roger, autor de Marilou e feliz proprietário de um elevadíssimo QI, chamou o cientista para a briga no Twitter em junho do ano passado. Depois de ser confundido com Lobão por Nicolelis, o roqueiro se enervou:
“Estimulei o pensamento e diverti milhões no meu país. Não gastei milhões num robô com tecnologia arcaica”
Munido dessas convicções, Roger mostra-se um dos líderes da campanha anti-Nicolelis nas redes sociais. Essa semana, diante da curtíssima exibição do exoesqueleto na abertura da Copa, o vocalista decretou o fiasco do Projeto Andar de Novo:
Nicolelis e sua equipe ajudaram paraplégicos a voltarem a andar, mas Roger considerou pouco prático o uso de uma tábua cuja função era meramente decorativa. A reparação científica do roqueiro, de fato, “divertiu milhões em seu país”.
Você deve estar se perguntando por que Nicolelis está sofrendo essa perseguição. É que nas cabeças brilhantes dos nossos cientistas de ocasião, o sucesso do exoesqueleto seria contabilizado como uma vitória de Lula e Dilma, e não do Brasil, dos brasileiros e da comunidade científica mundial. Assim como o governo americano, o Brasil fez alto investimento no projeto: R$33 milhões. Não fez mais do que a obrigação. Mesmo assim, oposicionistas desejam minar qualquer possível ganho político que o governo venha a ter com o sucesso do projeto. Mesmo que para isso seja necessário vandalizar essa importante contribuição do país para a humanidade. É o famoso viralatismo brasileiro, misturado com campanha política em ano de eleição.
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