Diferente do que apregoam certos colunistas, os machos não estão em extinção, muito pelo contrário, os machões que espancam e matam mulheres e homossexuais ainda estão por aí
Fabricio Longo, d’Os Entendidos
Brochar, falir, chorar, demonstrar sensibilidade, tratar as mulheres com respeito e de repente lavar a louça. Não gostar de futebol e quem sabe, preferir cuidar do visual e talvez dividir a conta ao invés de pagar tudo sempre. Essas são as conquistas do homem moderno, influenciadas provavelmente pelo feminismo. Não seria lamentável que alguém considerasse tudo uma frescura, e visse esse novo homem como um “fracassado ressentido”?
É, tem gente para tudo.
Realmente, o “macho” que carregava o mundo nas costas sem direito a vacilar está em extinção. É claro que o machismo persiste e impede pais e filhos de se beijar ou faz com que homens feitos se prestem ao ridículo de comparar tamanho de pau no vestiário. Os meninos – coitados – ainda são criados para competir de maneira voraz. É necessário ser bom de finanças, bom no volante, bom de cama e ainda ter tempo pra um bom Chopp, que se por acaso descambar em briga ainda vai exigir a vitória. Graças aos céus, o Complexo de Atlas está fora de moda. Mas calma, há muito machão por aí…
A PROPÓSITO: Colunista de Veja reclama da ‘falta de machos’
A “homenidade” é apenas uma piada publicitária, por sinal muito sem graça. Porém, há vários “cabras machos” que dão porrada em mulher ou que expulsam o filho de casa porque o garoto tem um “jeitinho estranho”. O espantoso é que ainda exista gente canalha para defender isso e ficar de mimimi porque “a virilidade está sendo atacada”. Ué, o “macho-macho” não consegue se defender? Se os privilégios da dominação machista fossem tão legítimos, não seriam ameaçados tão facilmente, não é? E que ironia, por bichas, por mulheres e por comunistas! Deve estar sendo difícil segurar o choro mesmo.
Os homens estão cansados de serem vigiados. Estão cansados de sofrer opressão para aprender a oprimir, na manutenção de um sistema que não beneficia ninguém. Estão cansados dessa vigilância constante, que transforma amigos em “patrulheiros do comportamento”, já que uma olhadela ou um gosto diferente podem ofender a “santa masculinidade”. É essa droga de “pode, não pode” que é uma frescura! Que fortaleza é essa que se abala com um salto alto, com uma unha pintada, com uma roupa ou com uma lágrima? É sério que o patriarcado – que se mantém vigente há séculos – treme por tão pouco?
É preciso ser muito macho ao assumir seus desejos, admitir fraquezas ou lutar por um ideal. Homens gays, mães solteiras, feministas, vadias, travestis e transexuais são “mais macho que muito homem”, pois desde cedo levam pedradas – muitas vezes, literalmente – sem poder gozar de privilégios. Ao contrário do que parecem temer os “guardiões da macheza”, não há perda de espaço para ninguém em um futuro igualitário. Há apenas – que surpresa – igualdade!
O homem não precisa “satisfazer sexualmente a mulher” ou “garantir o leitinho das crianças”. Não estamos em 1950. Mulheres são perfeitamente capazes de dividir as despesas da casa e dos filhos, sem falar nas várias que arcam com isso sozinhas. E quanto ao sexo, parece até piada! Mulheres não precisam de homens para se satisfazer, pois possuem dedos. Geralmente, cinco em cada mão. Um homem só se torna necessário por escolha afetiva, e aí cabe apenas escolher o parceiro ideal. E quanto à diferença entre “machos” e “gays”, fico feliz em informar que não existe!
Apesar da homofobia internalizada e reproduzida por muitos homossexuais, o ideal do “homem macho” exclui igualmente os discretos e os afeminados. E é justamente por isso que todo gay é um herói, nem que seja por ter salvado apenas a si. Para ser gay, é preciso abandonar a zona de conforto do privilégio e dar a cara à tapa. Mesmo sem intenção, a demonstração de afeto, o uso de um gíria ou qualquer coisinha, transforma o gay em agente político. Em ator da mudança. E uma vez que o progresso é inevitável, só resta aos conservadores ganir num cantinho, feito um animal acuado que sente a proximidade do fim.
É preciso ser muito homem – e muito mulher – para fazer como o Laerte e virar a vida de ponta cabeça em busca da felicidade. As bichas, aliás, fazem isso quando se assumem e quando enfrentam a hostilidade do machismo todos os dias. Ao “moderno homem heterossexual” ainda falta um longo caminho, mas que felizmente começa a ser percorrido. De fato, a virilidade masculina como valor se aproxima do fim. Já vai tarde. E sobre quem ainda luta contra isso… Bem, não estamos aqui para falar em “fracassados ressentidos”.
Permita-se. Seja livre. Seja fabuloso.