Eles morreram enquanto brincavam de esconde-esconde em uma praia de Gaza. Um dos garotos sobreviveu para contar a história, e um jornalista do The Guardian testemunhou tudo
Kiko Nogueira, DCM
Tem uma grande cena em “Era Uma Vez Na América”, do imenso Sergio Leone, em que a gangue de garotos encontra o inimigo Bugsy nas ruas de Nova York.
Saem correndo. Um deles, Dominic, fica para trás. Dominic é atingido por um tiro. Nos braços do amigo Noodles, pouco antes de morrer, ele só encontra tempo de sussurrar: “Eu escorreguei”.
A seqüência me veio à mente quando li o relato de Peter Beaumont (leia aqui), correspondente do Guardian em Gaza, sobre a morte dos quatro meninos palestinos numa praia.
É graças e eles o cessar-fogo de cinco horas — cinco horas.
“Estávamos brincando de esconde-esconde quando fomos atingidos”, contou um sobrevivente do ataque, Hamad Bakr. “Eu não ouvi o primeiro míssil que matou um de nós, mas ouvi o segundo enquanto estávamos correndo na praia. Aquele matou mais três.”
Eles estavam brincando de esconde-esconde. Esconde-esconde.
Beaumont estava sentado no terraço do hotel al-Deira, onde, segundo ele, a internet funciona melhor, e viu tudo acontecer. “Eu ouvi o barulho da explosão no píer”, diz.
Nas palavras de Beaumont, depois desse primeiro míssil, figuras podiam ser vistas correndo, as silhuetas esfarrapadas. “Mesmo a uma distância de 200 metros, era óbvio que eram crianças”.
“Eles acenaram e gritaram para os jornalistas enquanto passavam pela fileira de barracas de praia coloridas, usadas por banhistas em tempo de paz”, escreveu.
“Ali a segunda bomba atingiu a praia”. Os jornalistas que estavam no terraço gritaram: “Eles são apenas crianças”.
Em quarenta segundos, quatro garotos que tinham ido brincar entre barcos de pescadores estavam mortos. Dois deles se chamavam Mohammad, um Zakaria e o último Ahed. As idades eram entre 7 e 11 anos.
O quarteto virou o símbolo da forma como os ataques aéreos israelenses estão matando inocentes num pedaço de terra estreito e miserável do Mediterrâneo. Eram inocentes, totalmente inocentes, uma turma querendo se divertir em sua praia, onde suas famílias mantêm seus barcos.
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O Exército de Israel declarou que estava investigando o incidente. Um porta-voz admitiu que o segundo foguete foi resultado de uma identificação equivocada dos meninos como soldados do Hamas.
De acordo com a ONU, 75% das vítimas fatais, até, agora, são civis. Calcula-se que haja pelo menos 200 mortos do lado palestino e um israelense.
“Nós estávamos brincando de esconde-esconde”, contou Hamad Bakr, hospitalizado com estilhaços no peito.
Brincando de esconde-esconde.