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Uma hipótese para a queda do avião de Eduardo Campos

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Estol: uma possibilidade para a queda do avião que matou o presidenciável Eduardo Campos e mais seis pessoas

Estol pode ter provocado queda do avião que matou Eduardo Campos e mais seis pessoas (Imagem: Pragmatismo Político)

A imagem que flagrou o momento da queda do avião onde estava o candidato à Presidência da República pelo PSB Eduardo Campos, no último dia 13, em Santos, no litoral de São Paulo, reduz em duas as hipóteses para explicar o acidente, na avaliação do especialista em aviação comandante Décio Correa. Após analisar o vídeo, gravado pela câmera de segurança de um prédio em construção, o integrante do Fórum Brasileiro para o Desenvolvimento da Aviação Civil e piloto há mais de 40 anos foi categórico. Para ele, a colisão violenta do Cessna 560XL contra o solo, que provocou uma cratera de aproximadamente 3 m de profundidade, foi causada por estol (perda de sustentação da aeronave) ou pela “desorientação do piloto”.

VEJA TAMBÉM: Conheça as outras 6 vítimas do acidente que matou Eduardo Campos

“Ao falar que se precipitou para o solo em razão de um estol, o que pode acontecer? A aeronave, fazendo uma curva, a velocidade de estol aumenta violentamente em função de as asas não estarem niveladas. Dependendo do ângulo de inclinação que está dando nessa curva, você estola a asa de cima, a aeronave vira no dorso e vai para o chão. Isso pode ter acontecido, sim. Neste caso, o que teria levado (à queda) não seria uma desorientação do piloto, uma perda de controle, mas sim, um estol, que girou a aeronave para o dorso e ela foi para o chão”, afirmou.

Pragmatismo Político reproduz abaixo um material didático publicado pelo sítio Asas do Conhecimento com explicações sobre o que é um Estol. Confira a seguir.

Inclinação x Estol

Sergio Koch – TCel Av R/R

Já falamos algumas vezes que a falta de conhecimento da teoria aerodinâmica pode nos colocar em situações extremamente perigosas em voo e, dependendo da situação que coloquemos a aeronave, o que deveria ser apenas uma manobra simples pode se tornar um grande desespero para o comandante.

Curvas grandes ou acentuadas. Taí um bom exemplo para ser explorado para fazer valer a afirmação do parágrafo anterior. São manobras que exploram o arrojo do piloto e que dão uma boa mão para domar sua aeronave. Pode não parecer, mas este tipo de exercício fornece excelentes indícios para um bom observador sobre qual o nível de habilidade de um piloto.

Sem querer desprezar as curvas pequenas, o que realmente conta para identificar o “pé-e-mão” de um piloto são as curvas que têm inclinação lateral superiores a 45 graus. Um bom treinamento destes tipos de curva poderá livrá-lo de enrascadas, principalmente nas situações de emergência, quando no afã de se salvar do acidente, o piloto tentará utilizar todos os recursos disponíveis e cada experiência adicional incorporada à rotina de voo aumentará suas chances de sobreviver.

O que me fez realmente escrever esta matéria foram os vários acidentes decorrentes da tentativa de retorno à pista numa emergência após a decolagem. Com certeza estes pilotos desconheciam a relação existente entre a inclinação e o correspondente aumento da velocidade de estol.

Fato: Fazer uma “curva de grande” pode resultar em um estol!!!

Isso está claro, não? Mas de que maneira o aumento da inclinação pode influenciar minha sustentação de voo?

Tudo começa com a tendência da aeronave a permanecer no seu movimento original (Lei de Newton). Quando um avião entra em curva, toda a sua massa se contrapõe de tal forma a manter sua direção original. É por isso que durante grandes curvas você se sente forçado para baixo no assento.

Essa é a chamada força G que tem relação com a força gravitacional com que seu corpo é puxado para Terra.

Mais abaixo será apresentado um gráfico que representa o aumento na força G para uma determinada inclinação da aeronave.

Vamos supor que você pretenda fazer uma curva de 60 graus de inclinação. Você precisará gerar uma força de 2G para manter seu voo sustentado e nivelado, ou seja, você sentira seu peso dobrado durante esta manobra.

Assim, de acordo com o conceito acima, podemos concluir que dependendo do grau de inclinação da asa, deverá ser comandado uma pressão maior no manche no sentido de cabrar a fim de compensar a falta de sustentação ocasionada pela decomposição do vetor de sustentação.

Observe na figura abaixo como funciona na prática a redução da decomposição do vetor de sustentação quando a aeronave entra em curva. Observe que quanto mais a aeronave inclina, menor a resultante da decomposição da sustentação (colchete em vermelho).

Para manter um voo nivelado, a força de sustentação deve ser igual ao peso. Assim quanto maior a inclinação, maior deverá ser a força de cabrar para gerar uma sustentação maior para se equilibrar em força ao peso da aeronave (que nunca se altera). Repare que este procedimento implica num aumento do ângulo de ataque e aí teremos outro problema…

Estolar a aeronave!!!

Repare! Se você fizer uma curva muito acentuada, o avião poderá atingir seu ângulo de ataque crítico antes de produzir força de sustentação suficiente para o vôo. Se isto acontecer certamente sua aeronave entrará em estol. Se estiver voando em grandes altitudes basta ceder um pouco o manche para sair desta situação, ou ainda aplicar maior potência nos motores para ficar acima da velocidade de estol. Mas se estiver muito próximo do chão e sem potência disponível, suas chances serão remotas e você estará muito próximo de uma enrascada.

Mas existe outro fator que muita gente desconhece que é o aumento da velocidade de estol quando em curva.

Isso mesmo!!! Aumento de velocidade de estol quando estiver em curva!!! Aquela frase decorada “A velocidade de estol da minha aeronave é de xxKT”, não se aplica quando a aeronave é colocada em grandes inclinações.

Repare no gráfico abaixo e tire suas conclusões!!!

No exemplo acima podemos observar que para uma inclinação de 60 graus a nossa velocidade de estol aumenta em 40%. Imagine então que sua velocidade de estol em situação normal seja de 70KT. Numa eventual manobra de inclinação de 60 graus elevará sua velocidade de estol para 98KT.

A título de reforço deste conceito acima, veja o que prevê o AFM (Airplane Flight Manual) da aeronave Phenom 100.

Pois é justamente este conceito que muita gente, por puro desconhecimento, acaba negligenciando e comanda inadvertidamente sua aeronave para uma situação crítica com sérias consequências, mas o pior de tudo, sem entender como isto foi acontecer…

Imagine então que você acaba de decolar com seu Sêneca e sofre uma parada de motor…

Apesar de termos estudado desde nosso PP que no caso de pane após a decolagem devemos procurar algum local numa referência de 45 graus para os dois lados, há quem tente, por instinto desesperado, retornar para a pista de onde acabou de decolar.

O piloto olha para o velocímetro e nota que está com velocidade acima da velocidade de estol e decide entrar em curva para tentar seu retorno sem se dar conta das três lições que aprendemos hoje.

1 – Com a inclinação eu devo aumentar meu ângulo de ataque e minha carga G para ter uma sustentação adequada;

2 – Com o aumento da carga G e sem potência adicional disponível, a velocidade da aeronave diminui; e

3 – Minha velocidade de estol vai aumentar significativamente com o aumento da inclinação.

Assim, basta que a velocidade de estol aumente e a velocidade no ar diminua o suficiente para que as duas se encontrarem e então você entrará num estol e será difícil recuperar o descontrole gerado.

Via de regra, a tentativa de retorno à pista se mostra a mais inadequada para este tipo de emergência. E observe que estamos falando apenas sobre o aspecto da inclinação da aeronave, pois se combinarmos fatores como peso da aeronave, temperatura, densidade e pressão, a gravidade da situação pode ser aumentada exageradamente.

Como você já deve ter percebido, esta matéria tem por objetivo alertar os pilotos de aeronaves onde a potência disponível é reduzida para compensar os efeitos de se voar em curva, principalmente em se tratando de aeronaves convencionais, pois na maioria dos casos, o aumento na velocidade ajuda a evitar um estol. É claro que se o avião não tiver um motor potente, talvez não consiga produzir o empuxo necessário para manter a velocidade alta, a fim de evitar um estol durante uma curva acentuada.

Assim lembre-se, caso não haja potência suficiente, você não poderá sair por aí fazendo curvas acentuadas à baixa altura.

Vamos explicar de outra forma…

Suponha que você tenha entrado com sua aeronave convencional em uma inclinação lateral de 45 graus e adicionado potência total para manter a velocidade no ar. Pronto!!! Você estará em curva nivelada, coordenada e sustentada.

Daí você resolve fazer uma curva realmente acentuada e inclina para 60 graus. Nesse ângulo de inclinação lateral, sua velocidade de estol aumenta de 50 para 70 nós (lembre-se do aumento de 40%). A pergunta é: “Você tem potência suficiente para manter a velocidade no ar acima de 70 nós em uma curva com inclinação lateral de 60 graus?”. A única forma de descobrir é tentar e experimentar isso a uma altitude segura. Quando você faz essa experiência, descobre que a velocidade no ar diminui, mesmo com potência total. Por quê? Porque aviões pequenos não têm potência extra para superar o enorme aumento no arrasto associado ao aumento necessário no ângulo de ataque.

Este conceito pouco difundido é que coloca seus comandantes em sérias enrascadas.

Voltemos finalmente à emergência após a decolagem. Ao manobrar para tentar um retorno à pista, uma grande inclinação é comandada para se alinhar à pista. Logo após identificar a emergência o piloto aplica a potência máxima na aeronave, portanto não tem mais nada disponível.

Então depois de iniciar a inclinação para o retorno à pista ele percebe que sua velocidade aerodinâmica começa a baixar, devido à grande inclinação lateral. Durante uma curva acentuada, a velocidade de estol aumenta por causa do aumento da força G e a velocidade no ar diminui por causa do aumento do arrasto. Quando a velocidade no ar e a velocidade de estol se encontram, o avião entra em estol e dependendo da altitude as consequências podem ser fatais.

Como última recomendação, pratique em grandes altitudes exercícios que reproduzam estes momentos críticos, de tal forma que te capacitem a tomar decisões sempre mais adequadas, a fim de preservar o bem de maior valor para você…

Sua vida!!!

Sergio Koch