Até onde vão as ligações de Marina com a família Setubal? O maior banco privado brasileiro, o Itaú Unibanco, teve um lucro líquido de quase R$ 16 bilhões em 2013, 15,5% a mais que no anterior
José Carlos Peliano*
A morte trágica e prematura de Eduardo Campos mudou o cenário político nacional para a próxima eleição presidencial. Aparentemente sua saída abrupta da disputa trouxe sua vice à tona com chances de aumentar o percentual de votos da antiga dupla.
Aparentemente por que? Porque há muitas coisas em jogo a partir de agora que tanto podem realmente ajudar na contagem de intenções de voto, quanto, ao contrário, podem embaralhar os lances de uma tal maneira que, ao final, suas chances de boa performance podem acabar apenas em solenes intenções.
Começando pelo início, como convém, o que sugere o apoio integral da família Setúbal, leia-se banco Itaú Unibanco, a campanha de Marina? A amizade antiga deu lastro à continuidade da relação entre a candidata e a família, em especial Maria Alice, herdeira. Agora no programa eleitoral, trazendo-a para mais para perto, exatamente na coordenação financeira da campanha.
A princípio, nada contra, não fosse por uma relação de amizade com política e, certamente, com compromissos de ambas as partes. E as intenções da candidata reveladas muitas vezes em suas aparições públicas não são nem de longe as mesmas do grupo bancário.
O maior banco privado brasileiro, o Itaú Unibanco, teve um lucro líquido de quase R$ 16 bilhões em 2013, 15,5% a mais que no anterior. Sua pujança financeira e seu poder de mercado não vão deixar barato o apoio incondicional à candidata.
Se Marina lograr o paraíso, o banco vai querer continuar no topo, abarcar mais praças e negócios, servir de constante termômetro da situação da economia e influenciar diretamente as políticas monetária, cambial e fiscal. Como um cão de guarda e de caça.
Outro amigo antigo e companheiro de ideias, Walter Feldman, de passagens pelo PC do B, PMDB, acabou seguindo viagem na fundação do PSDB e ainda por lá. Também amigo de José Serra, ele se tornou o coordenador adjunto de campanha da candidata.
Erundina, política discreta e respeitada, é nominalmente a coordenadora, mas, desde sempre, todos nós, querendo ou não, sabemos que, ao fim e ao cabo, a amizade, ou quem indica, pesa mais que o conhecimento. E aí, as cartas serão dadas por quem?
Outro nome que chegou do exterior para formar a equipe é André Lara Rezende, sim, aquele mesmo, um dos formuladores do Plano Real no governo de FHC. Amigo deste, hoje banqueiro também, dá as mãos à candidata para traçar e planejar o meio ambiente da economia brasileira no plano de governo do PSB/Rede.
Mas nem tudo o que cai na rede é peixe. Como visto até aqui, três dos principais pilares da equipe da candidata não têm cheiro de povo. O mesmo cheiro que incomodava Figueiredo, o militar feito presidente. O cheiro é outro, vem de outro grupo amigo e apoiador, a Natura.
Ela foi classificada pela Revista Exame entre as 20 maiores e melhores empresas do País em 2014, especialmente entre aquelas que pagaram mais dividendos por suas ações. Além disso, juntamente com o banco Itaú Unibanco, a empresa está entre as três consideradas de melhor reputação no exterior.
A ex-senadora, professora e ambientalista traz para montar seu programa de governo, entre outros e outras, a nata dos bancos brasileiros, uma filha de um dos maiores banqueiros brasileiro, um banqueiro ex-arquiteto do Plano Real e uma companhia das 20 mais importantes do Brasil. Ambientalistas, seringueiros e seringais combinam com capitalismo?
De boas intenções, já diziam nossos avós, o inferno está cheio. Não combinam os ideais e ideias da candidata, aquariana, com os propósitos e os fins de banqueiros e empresários, contadores de juros e lucros, pelo menos para o senso comum. Ou será que outros sensos estão por trás dessa empreitada?
A única coisa em comum entre a candidata e seus auxiliares mencionados é a Academia. Todos passaram por universidades. Os campus universitários os prepararam para chegar até aqui. Experimentaram aulas, livros e debates, mas só puseram as mãos na massa mais tarde, ao contrário, entre tantos, milhões, de seringueiros, trabalhadores sem terra, trabalhadores sem teto, trabalhadores rurais e urbanos, .
Numa situação antagônica como essa, ideais de sustentabilidade de um lado versus interesses objetivos de rentabilidade de outro, nem as sagradas escrituras ajudam. Nada contra o ganho econômico e financeiro, nem contra a proteção do meio ambiente. Ocorre que as duas pontas da corda não se juntam, cada um puxa para o seu lado. A realidade brasileira é rica em situações como essa.
É do ar do campus que vem as ideias do programa da candidata. Não do ex-cabeça de chapa tragicamente morto. Mas do campus onde todos os sonhos se formam e se mostram possíveis, até que levam tropeços e tapas da realidade.
É das ruas, dos grotões, dos becos, dos canaviais, dos barracos debaixo das pontes. Da luta diária entre acordar de madrugada para ir ao trabalho e chegar à noite para dormir pouco e recomeçar tudo de novo dia seguinte. É desse mundo que um programa de governo, dito sustentável, deve contemplar e tirar umas de suas principais guias de norteamento.
O apoio político que o partido hoje da candidata, o PSB, pode lhe dar é reduzido no Congresso Nacional e fora dele. Somados 4 governadores, 4 senadores e 37 deputados federais, todos eles juntos não fazem verão. Será que verão coerência no programa de governo em elaboração com banqueiros e empresários tomando conta para falar de sustentabilidade? O que a história do partido deles tem a dizer sobre isto?
A aproximação da candidata com o PSDB traz de volta para a cena política nacional os criadores do Plano Real. Um plano feito para ganhar tempo e enrolar meio mundo, fazendo definhar muitos investimentos e riquezas com uma das maiores desvalorizações já feitas da moeda nacional. Para não dizer das privatizações, mal vistas e pouco investigadas até hoje.
A proposta de governo da candidata será para dar sustentabilidade a isto? Se for, os ambientalistas podem se rebelar e dar sustentabilidade a outro programa, a outra proposta.
*José Carlos Peliano é Economista.