Aécio se exaltou ao ser confrontado com temas como a violência contra a mulher e o nepotismo. O candidato também não explicou por que tanto fala em 'meritocracia, se nunca dependeu dela para galgar posições
Lola Aranovich*, em seu blog
Se faltava alguma coisa para não votar em Aécio Neves (PSDB), agora, depois do debate de ontem (14), na Band, não falta mais. Não há nada de meritocracia, termo que ele repetiu inúmeras vezes, num candidato que, desde jovem, só dependeu de QI (quem indica) para galgar posições. Parece piada um filhinho de papai, neto de Tancredo, se colocar como modelo de mérito. Como alguém sugeriu no Twitter: a última vez que Aécio dependeu da meritocracia, ele era um espermatozoide.
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Contudo, para mim, o que chocou mais no debate foi o machismo escancarado de Aécio. O sorriso debochado com que tratou Dilma ecoou o dedo em riste a Luciana Genro no primeiro turno. O jeito com que Aécio se dirigiu aos eleitores, como “dona de casa” e “trabalhador”, soou como uma divisão de outro século. Como cereja no bolo, o tuíte de um de seus grandes apoiadores, Pastor Malafaia: “Já está saindo uma ordem de prisão a caminho da Band contra Aécio por espancamento à mulher, pede pra ele não matar Dilma kkkk”. Sim, esse tipo de piada no momento em que Dilma perguntou ao candidato tucano sobre a violência contra as mulheres. Isso num país em que 15 mulheres são mortas por dia, todos os dias, quase sempre pelo parceiro ou ex.
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Espero que Aécio tenha aproveitado bem a primeira semana após a arrancada espetacular do primeiro turno. Porque a semana passada foi a melhor semana. Ela não volta mais. Foi um clima de já ganhou (que já vimos com Marina e que não se concretizou), de todos juntos contra o PT, de pesquisa fraudulenta que lhe dava 17 pontos de vantagem, de tudo o que não vai se manter. Porque as pessoas vão ver que o governo realmente não está grande coisa, mas pode piorar muito com a volta do PSDB.
O trabalhador vai, sim, associar o PSDB com privatizações e terceirizações e queda do salário mínimo e aí não vai ter “alternância de poder é tão legal” que dê jeito. Tanto que soou como desespero messiânico Aécio dizer, no debate, que o povo lhe pede para “libertar” o país do PT.
Ontem foi mesmo o dia do desespero. Doeu aos ouvidos ouvir Aécio aplicar um teste do DNA no Bolsa Família para atestar que a paternidade do programa é de FHC e, a maternidade, de Ruth Cardoso. Dói porque vem de um partido que, quando não está em período eleitoral, chama o programa de “Bolsa Esmola”. E depois ainda fica indignado quando o povo suspeita que, com a volta do PSDB ao poder, o Bolsa Família pode ser chutado pra escanteio. O que faz o povo pensar assim? Seria o fato de que grande parte dos eleitores tucanos chama quem recebe o benefício de “vagabundos”?
É importantíssimo para a estratégia tucana desvencilhar Aécio do PSDB. Para isso, vale tudo: desde uma obsessão em não discutir o passado, em particular os anos FHC (“não vamos olhar no retrovisor, vamos olhar pro futuro”, repetiu no debate), ao discurso que sua candidatura está acima de um nome ou de um partido e representa todo um projeto (o projeto de tirar o PT do poder, mas ele não diz com todas as letras).
O anti-petismo é vendido com uma embalagem de “mudança”, de “nova política”. Ontem recebi uma mensagem de uma leitora que dizia:
“Eu eu era uma quase analfabeta política, apesar dos já 28 anos nas costas. Me interessava pouco, me declarava apolítica no maior orgulho. Eu tinha ódio do PT sem saber. Aquele ódio inexplicável típico da classe média confortável na alienação. Votei na Marina no primeiro turno, mas dizia que se desse Aécio com Dilma no segundo, eu votaria nele. Bom, aí veio o segundo turno e, com ele, as inúmeras discussões nas redes sociais. Percebi que as pessoas que defendem o PT são muito mais esclarecidas e politizadas do que os tucanos/anti-PT de plantão, que, muitas das vezes, caem em argumentação vazia e cheia de preconceito e ódio. Passei de Aécio para o voto nulo. E agora, finalmente, do voto nulo para Dilma. Estou imensamente feliz e aliviada de ter me libertado desse ódio irracional ao PT que, claro, é um partido que tem, sim, muitos problemas, mas que ainda é muito melhor para a população do que o PSDB.”
Acredito que essa racionalização ainda vá ocorrer com muita gente. Só espero que a tempo.
A desculpa mais esfarrapada que vi nessas eleições é para explicar o baixo número de votos de Aécio em Minas no primeiro turno. Afinal, Marina foi cobrada por jornalistas por não vencer nem no estado, o Acre (no final, ela acabou tendo o maior número de votos por lá). E é só ver o imenso peso que Eduardo Campos tem em Pernambuco (o único estado do Nordeste onde Dilma não ganhou).
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No entanto é formidável: Aécio foi governador de Minas entre 2003 e 2010. Foi eleito senador pelo estado. Tem toda a mídia mineira tradicional a favor. Qual a desculpa para que a população do estado não vote nele? Os correios! Foi o correio “corrupto” que não entregou os santinhos. Porque o cidadão precisa muito ser lembrado que um ex-governador concorre à Presidência da República.
Quando derrotar alguém é mais essencial que a vitória de um grupo (ou “projeto”, como preferem), a história raramente termina bem. Uma possível vitória do PSDB teria o sabor amargo da de Collor em 1989. Não veríamos comemoração alguma. Apenas a comemoração de derrotar o inimigo, mas não uma festa por ter vencido. Porque, como sabemos, se o PSDB voltar, não haverá vencedores.
Contudo, passado o susto do início do segundo turno, creio que não volta. Não pode voltar.
*Lola Aranovich é Professora da Universidade Federal do Ceará e cronista de cinema
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