Tal posicionamento do STF derrubaria um grande dique eleitoral contra o progressismo no Brasil, o que reduziria as chances de vitória em eleições do conservadorismo, e parte deste pode acabar tentando um golpe de Estado, talvez ao estilo da Ucrânia
Nicolas Chernavsky*
Quando Lula assumiu a presidência, em 2003, houve grande expectativa em relação aos resultados concretos do período progressista que se iniciava. Se este não tivesse sucesso quanto à melhoria do padrão de vida brasileiro, o conservadorismo poderia voltar rapidamente ao poder pela via eleitoral. O que se verificou, pelo contrário, foi um enorme sucesso das políticas econômicas, sociais e diplomáticas do governo progressista, reduzindo drasticamente a fome, a miséria e a pobreza e levando o Brasil a outro patamar de desenvolvimento. Seria de se esperar que, com isso, o progressismo brasileiro não encontrasse grande dificuldade para vencer o conservadorismo nas eleições presidenciais subsequentes.
O resultado da última eleição presidencial, na qual Dilma Rousseff teve 51,64% dos votos e Aécio Neves 48,36%, mostra que isso não aconteceu. Parte relevante disso ocorreu pelo fato da maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ter aceitado como verdadeira a acusação de desvio de dinheiro do Estado e de compra de votos no parlamento que acabou levando os petistas José Dirceu, José Genoino, João Paulo Cunha e Delúbio Soares a serem condenados por esta corte, apesar de terem sido inocentados por ela de formação de quadrilha e, no caso de João Paulo Cunha, de lavagem de dinheiro. A posição do STF foi bastante relevante porque antes dela, as acusações contra os petistas, apesar de veementes, eram apenas acusações, não sentenças do Judiciário.
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Para uma parte considerável do eleitorado, há uma clara diferença entre uma situação em que os meios de comunicação mais conservadores ou a oposição política fazem uma acusação de corrupção, e uma situação em que o STF a aceita, pelo menos parcialmente, como verdadeira. Por isso, se na revisão criminal, nos próximos anos, o STF concluir que o mensalão e o desvio de dinheiro do Estado não existiram por parte desses petistas, esse eleitorado poderá modificar seu entendimento geral sobre o PT, no sentido de perceber que essa acusação tão repetida contra o partido pareceria não ser verdadeira. Essa nova situação, somada à continuidade da elevação do padrão de vida do povo brasileiro durante os governos progressistas de Lula e Dilma, ambos de coalizões encabeçadas pelo PT, faria com que o progressismo aumentasse ainda mais sua força eleitoral.
Nesse caso, o conservadorismo brasileiro teria sua perspectiva de vitória eleitoral muito reduzida. A tendência poderia ser que parte do conservadorismo se lançasse para a tentativa de um golpe de Estado. Dada a experiência de fevereiro deste ano na Ucrânia, é possível que a tentativa de golpe de Estado se dê através de um processo semelhante, com manifestações de rua em que possa acabar ocorrendo violência.
É possível também que as Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro, entrem nesse contexto no sentido de atrair atenção internacional, especialmente se a tentativa de golpe dificultar a realização das Olimpíadas. Enfim, talvez chegue a hora em que cada brasileiro e cada brasileira tenha que decidir se quer um país com democracia ou não. Nos últimos 15 meses, Ucrânia, Egito e Tailândia, países de média influência mundial, tiveram seus governos democraticamente eleitos derrubados por golpes de Estado. Agora, o próximo passo da resistência à democratização mundial é um país de grande influência global, o Brasil.
*Nicolas Chernavsky é jornalista formado pela Universidade de São Paulo (USP), editor do Cultura Política e colaborador do Pragmatismo Político
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