A bicicleta é um importante meio de transporte na Alemanha, sendo usada para percorrer em média 10% de todas as distâncias no país. Em algumas cidades, são quase 30%. Mas, antes de chegar a esse grau de utilização, ela enfrentou resistências, assim como no Brasil.
A primeira ciclovia da Alemanha foi construída em 1935 em Berlim, visando os Jogos Olímpicos do ano seguinte. O objetivo era tirar os ciclistas das ruas e abrir espaço para os carros. Assim surgiu também a tendência de priorizar o carro como meio de transporte nas cidades alemãs. Somente na década de 1980 essa visão começou a mudar, e a bicicleta deixou de ser um objeto de recreação para ser vista como um meio de transporte. Mas essa mudança não se deu sem resistências.
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“Durante muito tempo, andar de bicicleta era visto como uma atividade turística marginal ou uma recreação para crianças e jovens. Apenas nos últimos anos, a visão de que a bicicleta pode resolver uma grande parcela de problemas políticos e sociais conseguiu se impor“, afirma Stephanie Krone, porta-voz do ADFC, a principal associação de ciclistas da Alemanha.
Em Berlim, conflitos entre motoristas e ciclistas ainda existem, e de vez em quando há resistência à abertura de ciclovias, por exemplo quando elas preveem o fechamento de ruas destinadas aos carros ou o fim de vagas de estacionamentos. Em julho do ano passado, um ciclista foi espancado pelo motorista de um carro, numa das avenidas mais movimentadas da cidade, após a bicicleta, que seguia na ciclovia localizada no lado direito da rua, ter esbarrado no veículo.
Políticas para a bicicleta
Para evitar uma guerra no trânsito, a prefeitura berlinense desenvolve campanhas educativas para estimular o respeito mútuo. Além disso, monitora o trânsito para identificar complicações e fazer ajustes para melhorar o fluxo. Em 2014, lançou uma campanha na internet para identificar pontos de risco para os ciclistas, e os próprios moradores podiam informar onde esses pontos ficavam.
Quando vagas de estacionamento para carros são eliminadas, a prefeitura procura compensar a perda com estacionamentos subterrâneos ou em prédios, caso haja necessidade. “Nós incentivamos a bicicleta, que é um meio de transporte saudável e bom para o meio ambiente e, por isso, achamos correto, em alguns casos, tirar vagas de estacionamento para construir ciclovias. A prioridade das políticas de mobilidade urbana em Berlim não está somente com os veículos automotores, mas também com as bicicletas“, afirma Petra Rohland, porta-voz da secretaria.
Ela diz que a atual prioridade é ampliar o sistema de ciclovias, com o objetivo de permitir que o ciclista se locomova por toda a cidade de forma rápida e segurança. Essa rede integra caminhos que cortam parques e praças e também passam por ruas.
Ampla malha cicloviária
Um dos aspectos que facilitam e estimulam o uso da bicicleta na Alemanha é a ampla rede de ciclovias, para curtas e longas distâncias. A construção é dividida entre os governos federal, estadual e municipal. As prefeituras são responsáveis pela criação e manutenção dos caminhos nas cidades, enquanto aos governos federal e estaduais cabem as ciclovias ao longo de rodovias federais e estaduais. Como não há um órgão de controle central, não se conhece o tamanho da malha cicloviária no país, segundo o ADFC. Há apenas dados locais.
Em Berlim, por exemplo, são 670 quilômetros de ciclovias e, com o aumento da demanda nos últimos anos, a prefeitura prevê expandir ainda mais a rede. De acordo com a Secretaria Estadual para Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, entre 2001 e 2013 houve um aumento de 44% no trânsito de bicicletas na cidade. “O ciclismo está crescendo, por isso é preciso dar mais espaço para a bicicleta, ampliando a infraestrutura. Berlim já é uma cidade de bicicletas, mas nós queremos melhorar as condições para que se torne a cidade amiga da bicicleta na Europa“, afirma Rohland.
No Brasil, o incentivo ao uso da bicicleta como um meio de transporte também vem crescendo em algumas cidades, mas ainda há muito para ser feito. Além da falta de infraestrutura, de políticas públicas e de investimentos, ciclistas reclamam que a bicicleta não é vista como um meio de transporte para o uso cotidiano nas ruas.
“Só a estrutura em si não é suficiente para mudar essa cultura. É preciso que os investimentos nessa área venham acompanhados de planejamento, da mudança de comportamento e de campanhas de promoção da bicicleta nas escolas e empresas“, reforça Luis Cláudio Patrício, um dos fundadores da União de Ciclistas do Brasil.
Além de reduzir o trânsito e a poluição, andar de bicicleta faz bem à saúde. Na Alemanha, estudos mostram que ela pode reduzir em cerca de 2 mil euros por pessoa o gasto com tratamentos de doenças provocadas pela obesidade ou falta de exercício físico.
Clarissa Neher, DW
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