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Não sou Charlie

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Repudio veementemente o ato que vitimou os cartunistas. Nem uma só peça de seu humor sem limites os faz merecedores do que sofreram. Mas esse humor está longe de ter o meu respeito. Por isto, não sou Charlie.

Charges e capas da revista Charlie Hebdo(Imagem: Pragmatismo Político)

André Falcão*

Este mundo é mesmo prenhe de hipocrisia, manipuladores e manipulados. Nessa esteira, parte da elite de meu país, que assim se imagina porque desconhece o que seja sê-lo, bem como de sua classe média, investe-se escancaradamente desses atributos.

Nesses últimos dias, dois fatos me inspiraram a vir derramar-lhes algumas tintas, pobres que sejam.

O primeiro, o da máfia das próteses. Não encontrei uma só manifestação de repúdio minimamente séria das associações de médicos contra esses marginais, tampouco dos aecistas de plantão. Vi-os, sim, omissos, como só os capitães da hipocrisia deslavada sabem ser. Sua indignação oca só existe contra os médicos cubanos, trazidos para cuidar de quem eles jamais se dispuseram a fazê-lo.

O outro, trata-se do ato terrorista contra a revista francesa Charlie Hebdo e seus cartunistas, infelizmente bandeira para manipulação hipócrita, capitaneada pela chamada mídia grande e repercutida por seus amestrados seguidores, conscientes ou não. A tônica é explorar a tragédia, na defesa de algo que querem transformar em dogma: a liberdade de expressão, propositadamente confundida com liberdade de imprensa, como se alho e bugalhos fossem a mesma coisa.

Leia aqui todos os textos de André Falcão

Sabia que a Charlie Hebdo primava pelo humor polêmico e politicamente incorreto, para alguns de péssimo gosto, para outros corajoso. Entretanto, hoje limita-se a professar o que diz combater, a intolerância religiosa, desrespeitando crenças e símbolos que são caros aos por ela atingidos com seu tipo de humor. Na decadente sociedade e cultura francesas, a religião islâmica, abraçada por mais de 6 milhões de muçulmanos naquele país, é seu alvo predileto.

Há quem a compare com o Pasquim brasileiro. Injustiça. Abstraindo o “humor”, está mais para a Veja. Ambas precisariam ser coibidas pela justiça. Lá, na França, a Charlie não o foi; aqui, a Veja não o é. Cada qual a seu modo, ofendem, caluniam, desrespeitam e seguem sem limites no exercício de sua ilimitada liberdade de expressão. Até que surge um fanático, e de fanáticos este mundo também está prenhe, embora menos do que de hipócritas falso moralistas, e a tragédia está pronta para ser explorada pelos surpreendidos de meia-tigela.

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Repudio veementemente o ato que vitimou os cartunistas, e me solidarizo com seus familiares; nada o justifica. Nem uma só peça de seu humor sem limites os faz merecedores do que sofreram. Mas esse humor está longe de ter o meu respeito. Por isto, não sou Charlie.

*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político

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