O dia da alegria
André Falcão*
Não seria um dia qualquer. Dias antes, finda a última disputa na TV, viram-se tomados por uma sensação de relaxamento, ainda que parcial, afinal ainda se seguiria a matéria criminosa, porque falsa e eleitoreira, daquele periódico semanal.
Orgulhosamente envergada a camiseta vermelha com a imagem dela ainda jovem estampada no peito, saiu para o compromisso cívico tão esperado: ele e aquela “capitalista” mais socialista que já conhecera. Ela foi ao prédio daquela faculdade no litoral norte, cujas predileções do eleitorado não se faziam perceber. Ele, para uma zona eleitoral situada na talvez mais bonita orla marítima do país, onde, porém, instalados dos mais reacionários e politicamente atrasados eleitorados da região; o que naturalmente dava-lhe ainda mais prazer.
O horário de verão na capital federal sinalizava que a disputa se encerraria primeiramente na quase totalidade do nordeste, onde uma hora a menos. Contados os outros fusos horários, os primeiros resultados somente se fariam possível conhecer a partir das vinte horas (hora dali).
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Com dezenas de militantes, e com ela e um dos filhos dele que se achegara, aguardou. O batuque soava animado; desbordando do prédio já invadia a rua. Os semblantes, porém, variavam do otimismo, decerto forjado pelas cervejas paulatinamente bebidas, à tensão incontida espelhada na maioria. Quanto mais a hora se aproximava, mais a crueza da realidade contida na expectativa aflita fazia-se iluminada. Ela rezava, aflita; ele cuidava, disfarçando a aflição, preocupado com ela e com tudo. “Calma… É assim mesmo… Não der, não deu”, dizia-lhe, já preocupado, fingindo não ver as lágrimas em seus olhos.
Até que a hora finalmente chegou, e com ela a primeira parcial oficial. Fosse possível coexistirem a falta de silêncio e a absoluta ausência de respiração, este seria o quadro que lá se via. Algumas vozes euforicamente excitadas, outras nervosas, mesmo, faziam-se ouvir, mas como que num quadro surreal não se percebia o respirar de ninguém; como se, ali, o silêncio e o barulho coexistissem harmonicamente, ainda que num estado absurdo de tensão.
Estava à frente! Percentualmente a diferença era pequena e não confortável, mas estava. Abraçaram-se todos. Abraçaram-se os três. Abraçaram-se os dois. E ora abraçados, ora pulando e comemorando a cada nova parcial divulgada, veio finalmente o tão aguardado veredicto: a presidenta estava reeleita! Euforia! Alegria! Emoção! O país continuaria sendo do seu povo.
*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político