As razões fundamentais são duas, das quais derivam as outras: a primeira é que é o único partido do Brasil com eleições diretas dos seus filiados para escolher as candidaturas majoritárias e todos os cargos de direção, e a segunda é a liderança do Lula; assim, para não depender tanto de uma pessoa para proteger seu progressismo, o PT precisa implementar outros sistemas estruturais avançados, como o financiamento de campanhas só por pessoas físicas (sem esperar que o Estado obrigue a fazer isso), e a ampliação das prévias para incluir toda a população, e não só os filiados
Nicolas Chernavsky*
Depois da crise política de 2005 e das condenações no STF em 2012 de José Dirceu, José Genoino, João Paulo Cunha e Delúbio Soares, o PT passou a ser associado a corrupção de uma forma muito mais intensa do que anteriormente. Mesmo que posteriormente o STF os tenha inocentado de formação de quadrilha, e que tenha inocentado João Paulo Cunha de lavagem de dinheiro, isso não teve grande efeito na população, uma vez que as condenações por desvio de dinheiro do Estado e compra de votos no parlamento continuam em vigor, sendo que mesmo essas condenações podem acabar caindo em um futuro julgamento da revisão criminal. Assim, sem se deixar afetar pelo preconceito contra o PT, é preciso fazer uma análise objetivo do partido, à luz do panorama partidário brasileiro, para saber o que ele representa para o Brasil.
O que o PT tem de específico hoje em dia? Ou seja, o que o PT tem que os outros partidos brasileiros, mesmo os mais progressistas, com o PCdoB e o PSOL, não têm? Basicamente duas coisas. Uma delas é a possibilidade que os filiados têm de escolher através do voto direto os candidatos aos cargos majoritários, como presidente, governadores e prefeitos. Essa característica aumenta a influência dos filiados nas estruturas partidárias e nas candidaturas, aperfeiçoando a democracia interna ao aproximá-la, quanto a suas características, da democracia do Estado brasileiro. No mundo, uma das fronteiras em que a democracia vem avançando é justamente a realização de prévias tanto para os filiados dos partidos quanto para a população em geral. Assim, mesmo o PT tendo avançado em relação aos outros partidos do Brasil a ponto de realizar as prévias para todos os filiados, o partido poderia avançar mais, realizando prévias abertas a toda a população, como já ocorreu, por exemplo, na França, na Itália, nos Estados Unidos e na Argentina, sendo que inclusive, neste nosso país vizinho, as prévias partidárias foram institucionalizadas pelo Estado, transformando-se em uma espécie de “turno 0″, antes do primeiro turno da eleição geral.
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A outra característica fundamental que eleva consideravelmente o progressismo do PT é que a pessoa que fundou o partido e vem sendo seu principal líder desde 1980 é o Lula. Isso atraiu para o partido, ao longo das décadas, grande parte do que havia de mais avançado na política do país. O problema é que depender tanto assim de uma pessoa faz o partido ter certa fragilidade a médio prazo, já que o Lula, fisicamente, é somente um ser humano. Por isso, o partido, para poder manter ou mesmo avançar em seu nível de progressismo, teria que desenvolver novas características que lhe permitissem ser um instrumento do povo o mais eficiente possível. Assim, uma questão urgente desse ponto de vista é que o partido passe a financiar suas campanhas eleitorais através da contribuição somente de pessoas físicas, com um limite superior razoável. É possível que o Estado brasileiro, nos próximos anos, obrigue todos os partidos a financiarem suas campanhas dessa forma, mas o PT não precisa nem deve esperar que isso aconteça. Inclusive, os próprios candidatos do PT poderiam tomar a decisão de financiar suas campanhas dessa forma.
E quanto aos outros partidos? Da minha parte, torço para todos eles construírem essas estruturas progressistas, como as prévias abertas para toda a população e o financiamento de campanhas por pessoas físicas. Se o PCdoB, o PSOL ou qualquer outro partido implementar mudanças em seu funcionamento interno que o torne mais progressista que o PT, acharei excelente. E acharei melhor ainda se depois disso, o PT implementar novos avanços que o coloquem de novo como o partido mais progressista do Brasil. E assim por diante. Esse é o rumo do progresso, com cada partido avançando o máximo que puder e a população julgando nas eleições. O futuro da democracia não está escrito, ele será construído por nós. Por isso, para avançar mais, é preciso valorizar o que o Brasil construiu politicamente até hoje, e algo que merece ser valorizado como um dos maiores instrumentos civilizatórios do país é o Partido dos Trabalhadores.
*Nicolas Chernavsky é jornalista formado pela Universidade de São Paulo (USP), editor do Cultura Política e colaborador do Pragmatismo Político
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