No 1º dia de governo, Syriza prioriza revisão da dívida e anula leis e privatizações da troika. Funcionários públicos demitidos serão recontratados e salário mínimo terá aumento; na política externa, Grécia criticou novas sanções da UE à Rússia
No primeiro dia de governo, o Syriza, partido de esquerda que venceu as eleições do último domingo na Grécia, começa a responder às expectativas e promessas feitas durante a campanha eleitoral. A prioridade anunciada nesta quarta-feira (28/01) pela nova gestão foi a suspensão dos processos de privatização dos setores de energia, aviação e portos, além do o cancelamento de leis impostas pela troika em troca do resgate financeiro ao país, como a demissão de funcionários públicos.
A marca do novo gabinete nomeado ontem pelo premiê Alexis Tsipras é a forte relação dos ministros com o desenvolvimento de políticas para fortalecer a economia e as finanças do país. Alguns setores criticaram, no entanto, o fato de um partido de esquerda não ter nomeado nenhuma mulher entre os dez ministros.
Durante seu primeiro Conselho de Ministros, Tsipras reafirmou que uma das prioridades do novo governo de “salvação social” será “a renegociação da dívida grega com os sócios”, até se alcançar uma solução para o “benefício de todos”.
Ele disse ainda que a “Grécia está pronta para contribuir para uma solução para toda Europa” e que o governo do Syriza deverá “acabar com o clientelismo político e a corrupção”, além de aplicar as “reformas que não puderam ser feitas durante 40 anos”.
Fim das privatizações
O ministro de Reconstrução Produtiva, Meio Ambiente e Energia, Panayiotis Lafazanis, anunciou hoje que o governo cancelará, de forma progressiva, todas as leis aprovadas pelos membros da troika de credores (formada pela Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional). Em especial, será interrompido o processo de privatização de empresas estratégicas que estavam em andamento pela gestão anterior — a DEH (Empresa Pública de Energia), do qual o Estado grego ainda é o acionista majoritário, é delas. Agora, o sistema de fornecimento de energia elétrica “funcionará com critérios não lucrativos”, apontou o ministro.
Da mesma forma, o porto do Pireu, o maior da Grécia, também terá o processo de privatização suspensa, como afirmou o vice-ministro, Thodoris Dritsas. O governo anterior pretendia vender 67% da Autoridade Portuária do Pireu ao Grupo Cosco (chinês).
As demais redes de infraestrutura, como aeroportos, também permanecerão nas mãos do governo, afirmou o ministro adjunto para a Infraestrutura, Christos Spirtzis. Estava prevista a privatização de 14 aeroportos regionais e a venda de milhares de hectares do antigo aeroporto de Atenas.
Fim da austeridade
O fim das medidas de austeridade, que também aparecia como uma das maiores promessas de campanha do Syriza, começa a sair do papel. Na Grécia, esta política fiscal rígida significou aumento dos impostos para a população e corte nas políticas sociais.
O ministro do Trabalho, Panos Skurletis, anunciou que o governo irá “restabelecer o salário mínimo e o décimo terceiro das pensões mais baixas”.
Durante a campanha, o partido prometeu restaurar o salário mínimo para 751 euros brutos, que hoje está em 586 euros. “Além disso, restabeleceremos as negociações entre sindicatos e os patrões”, disse Skurletis.
Quanto aos funcionários públicos que perderam o emprego “por decisões inconstitucionais”, tal como definiu a Suprema Corte grega, terão seus cargos de volta. É o que garantiu o ministro do Interior e de Reconstrução Administrativa da Grécia, Nikos Vutsis.
Vutsis afirmou que a exigência da troika de demitir funcionários para que fosse alcançado um superávit primário “foi injusta e gerou um clima de insegurança entre todos os trabalhadores”. Eles protestam há meses em um acampamento improvisado em frente ao Ministério das Finanças.
“Não é possível continuar pagando, cinco anos depois da catástrofe que sofremos, com esta dívida insustentável. Tomaremos todas as medidas necessárias e fecharemos os acordos necessários para reduzir os pagamentos da dívida e conseguir um prazo (de devolução) mais longo que permita que o país fique de pé”, disse.
Reação
O setor financeiro tem encarado os anúncios econômicos com certo receio, o que levou a um terceiro dia de perdas nos mercados, constatou a Reuters. Diante das medidas que estão sendo defendidas pelo Syriza na Grécia, o ministro alemão de Economia, Sigmar Gabriel, vice-chanceler social-democrata da gestão Angela Merkel, pediu que o novo governo seja “justo” com “as pessoas da Alemanha e da Europa que ajudaram a Grécia no passado”.
Durante entrevista coletiva à imprensa, ele ressaltou que seu país respeita a eleição democrática grega e que o objetivo alemão é de que a Grécia permaneça na zona do euro. E disse ainda que, se a Grécia não quer realizar as reformas necessárias, “não é justo que os trabalhadores de outras partes do mundo tenham que pagar. Não posso explicar isso aos alemães, não é possível”, afirmou.
Política externa
Na política externa, o Syriza também sinaliza um rumo diferente ao que vinha sendo adotado pelo governo de Antónis Samarás, da conservadora Nova Democracia.
Hoje, o governo grego criticou a declaração feita ontem pela União Europeia na qual, além de ameaçar a Rússia com novas sanções, culpa Moscou pelo aumento da violência no leste da Ucrânia e pela deterioração da segurança, além do agravamento da situação humanitária no país.
De acordo com o vice-ministro de Assuntos Exteriores grego, Nikos Juntis, a declaração dos “Chefes de Estado e de governo” foi redigida “sem seguir os procedimentos estabelecidos, sem informar a Grécia, nem obter o consentimento do premiê Alexis Tsipras”.
Juntis também mostrou-se contrário ao ” espírito das sanções, que têm consequências negativas tanto na agricultura, como na economia de nosso país, e de maneira geral”.
A posição foi expressa, por telefone, à Alta Representante da UE para Assuntos Exteriores e Política de Segurança, Federica Mogherini nesta quarta.
Calendário político em fevereiro
O novo presidente da República será definido pelo parlamento grego no dia 13 de fevereiro. O nome do candidato ao posto ainda não foi revelado.
Em 5 de fevereiro os 300 deputados escolhidos nas eleições de domingo tomarão posse. No dia seguinte, será divulgado o calendário do novo parlamento.
Outra data importante divulgada hoje é que Tsipras participará pela primeira vez no Conselho Europeu, ao lado dos outros chefes de Estado e de governo da União Europeia em 12 de fevereiro, um dia antes do anúncio da presidência.
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