"As pessoas podem trabalhar, pesquisar e socializar juntas. Mas apenas em termos de moradia, devem ficar separadas". Escritora japonesa causa polêmica ao defender segregação racial
A escritora e colunista Ayako Sono causou polêmica e alimentou acaloradas discussões nas redes sociais no Japão ao sugerir que o governo adote um sistema de segregação racial, forçando os imigrantes a viver separados por zona de acordo com sua raça.
Aos 83 anos, a japonesa publica regularmente seus artigos no conservador jornal Sankei, um dos mais importantes jornais do país – 4º maior em circulação, com 1,6 milhões de cópias diárias.
Na edição do dia 11 de fevereiro, no espaço do periódico destinado aos intelectuais, o título dizia: “Escassez de trabalho e imigrantes: permiti-los mas mantendo ‘distância adequada'”.
Sono começa o texto admitindo que o país precisa de mão de obra estrangeira por causa da queda contínua da população japonesa.
Mas logo depois emenda: “Eu acho que o país deve sim aceitar os imigrantes, mas fazer com que eles morem separados, divididos por raça”.
“As pessoas podem trabalhar, pesquisar e socializar juntas. Mas apenas em termos de moradia, devem ficar separadas”, defendeu a escritora.
“Pode parecer contraditório, mas é uma tarefa quase impossível entender os estrangeiros se você dividir o espaço com eles.”
Polêmica antiga
A escritora é conhecida por defender causas consideradas conservadoras. Em 2000, por exemplo, ela hospedou em sua casa o ex-presidente peruano Alberto Fujimori, que fugiu do país durante um escândalo de corrupção no seu governo.
Sono chegou a ser indicada pelo primeiro-ministro Shinzo Abe para participar de um conselho em 2013 para discutir a reforma da educação.
Naquele mesmo ano, ela publicou um artigo em uma revista semanal criticando as mulheres que continuam a trabalhar depois de terem filhos. Para ela, as japonesas deveriam se dedicar exclusivamente aos cuidados dos filhos e da casa.
O pensamento dela de encontro ao que Abe defende. O primeiro-ministro quer que até 2020 cerca de 30% dos cargos de liderança no país sejam ocupados por mulheres.
Sono justificou sua mais recente ideia com o exemplo da África do Sul de 20 ou 30 anos atrás.
“Desde que entendi a realidade da África do Sul, passei a achar que brancos, asiáticos e negros deveriam viver separados”, diz.
Ela citou um condomínio para brancos em Johanesburgo para o qual uma família de negros se mudou após o fim do apartheid. Segundo ela, a mudança teria sido um problema, porque os negros – na visão da colunista – têm famílias numerosas.
“Para os brancos e asiáticos, é bom senso que um casal e dois filhos vivam em um apartamento. Mas os negros acabaram levando de 20 a 30 membros da família para viver lá”, escreveu.
Isso teria levado a água a escassear, levando brancos a se mudar, segundo Sono.
Polêmica
As palavras de Ayako foram alvo de muita crítica e ganharam destaque nas redes sociais e também na mídia.
Discussões acaloradas no Twitter, Facebook, Line e Mixi, as redes sociais mais acessadas no Japão, continuaram até o final de semana, quando o embaixador da África do Sul no Japão, Mohau Pheko, criticou a escritora.
O diplomata enviou uma carta de protesto ao jornal Sankei e disse que o apartheid é um crime contra a humanidade, que não pode ser justificado no século 21.
“Discriminação com base na cor da pele é inaceitável em qualquer país”, reforçou o embaixador.
O jornal Sankei divulgou uma nota dizendo que publica a coluna de Ayako Sono regularmente e que o que ela escreve reflete apenas a sua opinião. “É natural que haja muitas opiniões diferentes sobre o assunto”, defende o periódico.
Entre os comentários, muitos usuários condenaram o texto de Sono, chamando-as de “mau gosto”, “vergonhoso” e “racista”.
Apesar de a grande maioria criticar a sugestão da escritora, outros a defenderam. “A coluna de Ayako Sano é incrível”, defendeu um leitor. “O Japão deve abdicar desta política migratória e manter-se firme como a nação de uma só raça”, escreveu outro.
Brasileiros que vivem no Japão também entraram na discussão. “Infeliz declaração da colunista (…). Incita o preconceito e a discriminação já existentes no país”, lamentou um leitor.
BBC Brasil