Redação Pragmatismo
Democratização Comunicação 05/Mar/2015 às 15:40 COMENTÁRIOS
Democratização Comunicação

Aprenda a denunciar conteúdos abusivos da TV

Publicado em 05 Mar, 2015 às 15h40

Discussões ganharam as redes sociais no Brasil após Alexandre Frota confessar, em rede nacional, ter cometido um suposto estupro. Qualquer cidadão que considerar ter se deparado com conteúdos impróprios nas programações de TV pode protocolar uma denúncia. Saiba como fazer

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O que fazer quando a programação de TV e Rádio veicula conteúdos impróprios ou considerados ofensivos? Pela Constituição Federal, os veículos, que operam concessões públicas, devem privilegiar conteúdos educativos, artísticos, culturais e informativos, mas nem sempre é assim. Para o procurador regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo, Jefferson Dias, do Ministério Público Federal (MPF), “muitas emissoras acabam adotando uma prática que é colocar no ar conteúdo bastante questionável que, em alguns momentos, tangenciam para atos ilícitos“, avalia.

Essa discussão ganhou as redes sociais no país após a veiculação, na última quarta-feira (25), de entrevista do ator Alexandre Frota ao programa “Agora é tarde”, apresentado por Rafinha Bastos na Rede Bandeirantes de Televisão. Na ocasião, o entrevistado narra o suposto estupro de uma mãe de santo, em meio a risos do apresentador e da plateia. Exibida originalmente em maio do ano passado, a entrevista foi reprisada e gerou grande número de manifestações na web que consideraram o conteúdo ofensivo e criminoso para mulheres e representantes de religiões afro-brasileiras. Após questionamento de uma internauta, o apresentador alegou se tratar de uma história fictícia.

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Uma petição online foi criada por meio da plataforma Change.org com o objetivo de reunir assinaturas e encaminhar como denúncia ao Ministério Público. “Esta petição, encaminhada ao Ministério Público, solicita a rigorosa investigação dos fatos narrados por Alexandre Frota com incentivo do apresentador Rafinha Bastos, além da severa punição, seja para o caso de estupro, seja para o caso de apologia à violência sexual“, diz o texto.

Qualquer cidadão que avaliar que emissoras cometeram abusos em sua programação pode protocolar uma denúncia ao Ministério Público Federal. A partir daí, cabe ao MPF pedir esclarecimentos à emissora e ao Ministério das Comunicações com relação ao conteúdo que foi veiculado – o ministério também recebe denúncias pelo email [email protected]. Em seguida, é iniciado um diálogo com a emissora no sentido de uma retratação ou abrir espaço em sua programação para veicular campanhas educativas ou que possam dar voz aos grupos que se sentiram atingidos pelo conteúdo. A entrevista com Alexandre Frota ao “Agora é tarde”, até o fechamento desta reportagem, não gerou denúncia.

Se não for possível um acordo com a emissora, o MPF parte para uma ação civil pública com o objetivo de aplicar sanções.“Nós atuamos em relação à emissora, pra impor sanções e também com relação ao Ministério das Comunicações, pra que ele atue de forma a fiscalizar esses abusos”, aponta Dias.

Fiscalização

Como as emissoras de Televisão no país são concessões públicas, cabe ao Ministério das Comunicações o papel de fiscalizar para que o conteúdo veiculado respeite as leis do setor existentes no país. “Nos casos de programas editados, me parece que a responsabilidade da emissora é maior ainda porque tem a possibilidade de colocar ou não no ar e opta por colocar. Cabe ao Ministério das Comunicações impor sanções a essa emissora”, enfatiza o procurador Jefferson Dias.

Apesar de considerar que pontos da atual legislação que tratam do setor das comunicações no país precisem de regulamentação, Dias avalia que a legislação atual é suficiente para punir conteúdos considerados abusivos. “Com relação ao aspecto de veiculação dos programas de baixa qualidade, ou ofensivos a legislação vigente já seria apta a fundamentar a adoção de medidas cabíveis. Nós podemos adotar não só a Constituição, mas todas as outras leis que de alguma forma tratam de concessão de emissoras de TV e também que tratam da veiculação de imagens de programas pelas emissoras, sem contar as portarias do Ministério das Comunicações”, considera.

Essa é também a posição do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Em documento entregue ao Ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, em fevereiro deste ano, a entidade cobra ações que já poderiam ser tomadas pelo órgão com base na legislação vigente, como a responsabilização das emissoras por violações de direitos humanos na programação.

No processo de fiscalização das obrigações de conteúdo, além de não realizar um acompanhamento sistemático do que é veiculado, o Minicom orienta a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) a considerar apenas as normas dispostas do CBT (Código Brasileiro de Televisão) e no regulamento do serviço de radiodifusão”, aponta o documento.

Para o FNDC, ao adotar apenas essas duas legislações, o ministério ignora demais leis e tratados internacionais ratificados pelo Brasil que tratam do tema, como o Estatuto da Igualdade Racial, que prevê que o poder público deve garantir medidas para “coibir a utilização dos meios de comunicação social para a difusão de proposições, imagens ou abordagens que exponham pessoa ou grupo de ódio ou ao desprezo por motivos fundados na religiosidade de matrizes africanas”.

O CBT afirma que constitui abuso no exercício da radiodifusão e emprego dos meios de comunicação para a prática de crime ou contravenção, incluindo a propaganda de guerra; a ofensa à moral familiar, pública ou aos bons costumes; e a promoção de campanha discriminatória de classe, cor, raça ou religião.

O Decreto Presidencial 52.795/63 proíbe as concessionárias de “transmitir programas que atentem contra o sentimento público, expondo pessoas a situações que, de alguma forma, redundem em constrangimento, ainda que seu objetivo seja jornalístico”. Já a Constituição Federal de 1988 prevê que a legislação deve “estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão“.

Caso João Kleber

Em 2005 a sede da RedeTV na capital paulista foi lacrada por ordem da juíza Rosana Ferri Vidor, que aceitou pedido de liminar do Ministério Público Federal. A emissora foi punida por descumprir uma ordem judicial anterior que determinava que fosse retirado do ar o programa Tarde Quente, do apresentador João Kleber, acusado de adotar “atitudes claramente depreciativas, preconceituosas e deturpadas de esteriótipos de minorias, tais como homossexuais, idosos, mulheres, deficientes físicos e crianças”.

A ação civil pública, assinada pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão, Sérgio Suiama, e seis organizações da sociedade civil obteve um direito de resposta contra a Rede TV! E o programa Tarde Quente. Em decisão inédita na Justiça Brasileira, durante 30 dias a emissora foi obrigada a exibir programação elaborada pelo grupos ofendidos pelo conteúdo.

Procurados pela reportagem, o Ministério das Comunicações, o Grupo Bandeirantes e a Associação Brasileira de Rádio e TV (Abert), não se pronunciaram sobre o assunto.

Leandro Melito, EBC

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