André Falcão*
Ainda hoje o país se ressente da ditadura que se instalou no país de 1964 a 1985, embora eleições diretas só experimentou em 1990. É que aqui a ditadura não foi cabalmente derrotada, como na maioria dos países latino-americanos. Aqui findou por um acordo, que redundou na lei da anistia. Permitiu-se o regresso ao país de todos os sobreviventes expatriados tidos como “inimigos da pátria” pelos golpistas de farda, mediante a paga do preço de serem juridicamente perdoados todos os crimes que estes praticaram.
Assim, à míngua de uma derrota acachapante, o jornal Folha de São Paulo, por exemplo, em editorial, ousou referir-se a ela como “ditabranda” (não teria sido tão dura assim), para um ministro do STF um mal necessário, e remanesce, em um número talvez expressivo de jovens ou adultos, o surpreendente desejo de um novo golpe militar. Além desses, a imensa maioria pouco ou nada conhece daquele período. Alguns até ainda a ele se reportam como o do “milagre econômico”, onde não havia corrupção e os crimes foram um mal menor. A ignorância é triste. Muito triste.
Recentemente, no Chile, o povo saiu às ruas para comemorar o falecimento de um dos maiores algozes da ditadura que lá se instalara. Morreu de velho e de doenças. Mas os crimes que praticou não foram anistiados, antes foram apurados e seus agentes punidos. Daí que o povo não se conteve e comemorou. Assim também se deu na Argentina, no Uruguai e por aí afora. Uma simples conversa com um irmão latino-americano é o suficiente para constatar o grau superlativo de nossa ignorância e, junto com ela, porque filho dela, o preconceito.
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Hoje o Brasil tem como presidente eleito uma mulher. Alvísssaras! Uma sobrevivente da ditadura, que sofreu as mais abjetas, covardes e cruéis torturas, sem jamais ter capitulado para dedurar um só de seus companheiros. Incrível! Uma filha, mãe, avó e servidora pública sem uma só nódoa que pudesse manchar sua biografia. Admirável!
Sei, ela comete erros na condução política do governo, certamente também na econômica (para uns, por políticas mais à direita; para outros, ao contrário). Ela também por vezes tropeça nas palavras. Mas ela é uma presidenta digna, que ama o seu país e tem olhos e ações (e como as tem!) para o seu povo. Por isto e por mais um tanto de razões, tenho muito orgulho dela. E agradeço pelo povo brasileiro, a despeito de todos os ataques e mentiras desferidos na última campanha eleitoral por seus adversários, tê-la reconduzido à presidência do meu país. Agradeço a cada dia.
*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político
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