André Falcão*
O Brasil deve ser um país que exerce enorme fascínio aos estudiosos sociais de todo o mundo contemporâneo. De um lado, conseguiu tornar-se independente sem precisar dar um só tiro, e somente precisou entrar em guerra com uma única das nações que lhe fazem fronteira, e só uma vez. Um país cujo povo tem a mestiçagem, a alegria, a criatividade e a hospitalidade como características reconhecidas por todos.
De outro lado, é também o país que assassinou crianças paraguaias mandadas à guerra por um ditador louco e cruel; que, no ocidente, resistiu por derradeiro à libertação dos escravos, e que teve a segunda mais longa ditadura militar da América Latina. Um país cuja parcela de seu povo é capaz de queimar miseráveis que dormem nas ruas, e é intolerante com as diversas diferenças, seletivo na sua indignação com a corrupção, e insensível às desigualdades sociais. Um país que não leu Marx, e pensa conhecer Jesus; que não estuda história, e idolatra as atrações consumistas que lhe batem à porta.
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Porém, é ainda o país que, finda a ditadura, elegeu (e reelegeu) presidente um humilde nordestino, metalúrgico e sindicalista, e em seguida elegeu (e reelegeu) uma mulher de classe média, forjada nas lutas contra a ditadura militar, sobrevivente corajosa às mais atrozes e covardes torturas físicas e psicológicas.
Pois bem, é esse também o país que a partir de oito de outubro último tem como Ministro da Defesa o comunista alagoano e deputado federal por São Paulo, por seis legislaturas, Aldo Rebelo, do PCdoB.
Numa solenidade simples, mas emocionante e muito prestigiada por representantes de inúmeros países, inclusive dos EUA, de integrantes das três Forças, inclusive de seu alto escalão e da reserva, de políticos que iam do próprio PCdoB ao PSDB, de membros da igreja, além de amigos e familiares do Ministro, fora momento histórico de extrema importância para o país. Donde é fácil constatar enquanto parcela da sociedade politicamente regrediu, ou permaneceu em 1964, os militares experimentaram inegável e alvissareiro amadurecimento político. Recomendo a todos que se deem o direito de assisti-la: basta acessar o You Tube.
E a espingarda? Bem, é que o Ministro, ao final de suas palavras, reportou-se a uma espingarda de caça que fora do Marechal Floriano Peixoto, e que adquirira quando soube estava para ser leiloada pela família. Não, ele não a guardou para si. Doou-a ao Museu do Exército do Forte de Copacabana. Como bom comunista.
*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político
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