Cientista que ajudou a mãe a morrer vira referência mundial em defesa do suicídio assistido. Preso e julgado pela justiça, pela mídia e pela sociedade, Sean Davison hoje é um ativista pró-eutanásia
O cientista neozelandês Sean Davison virou uma referência mundial em defesa do suicídio assistido.
Em 2006, ele macerou 18 tabletes de morfina e os diluiu em um copo d’água. Deu a bebida para a mãe, doente terminal de câncer cervical. Uma hora depois ela perdeu a habilidade de falar e dormiu. “Eu também dormi e, quando acordei, ela havia morrido” conta.
Preso e julgado em 2011 na Nova Zelândia por homicídio doloso — aquele em que há intenção de matar — Davison revela sua mãe havia pedido para que ele a ajudasse a morrer. Depois de refletir dias sobre o pedido, ele chegou à conclusão que a decisão não era dele, e sim dela. As informações são da BBC World Service.
Patricia, a mãe de Davison, era médica. E, durante sua agonia, recusou tratamento. Ficou paralítica e perdeu o paladar, o que a levou a fazer uma greve de fome para tentar acelerar sua morte.
A condenação de Davison gerou enorme polêmica no país, já que sua pena foi revertida para o crime de incentivo de suicídio, que levou a uma punição branda: cinco meses de prisão domiciliar.
Desde então, o cientista passou a ganhar notoriedade como um ativista pró-eutanásia e fundou a Dignity S.A (Dignidade S.A), ONG que faz lobby na África do Sul para a criação de uma lei que permita a eutanásia.
Davison escreveu um diário relatando a experiência, que enviou para uma irmã. Confira abaixo algumas falas do cientista:
“Quando minha mãe estava doente, minha cabeça estava voltada para mantê-la viva, mesmo com sua saúde se deteriorando na minha frente. O dia em que ela me pediu que a ajudasse a morrer foi um choque. Passei dias refletindo sobre o pedido, até que finalmente percebi que a decisão não era minha e, sim, de minha mãe. Quem era eu para dizer para a minha mãe que ela não poderia morrer e que teria de continuar apodrecendo em uma cama?”
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“Ela não conseguia mais ler e pintar, que eram seus principais hobbies, porque também perdeu a habilidade de mover os braços. Quando ela parou de se alimentar e pediu que não a levássemos para um hospital, achei que sua morte seria rápida. Mas cinco semanas se passaram e ela ainda continuou viva.”
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“Ela me disse: ‘você tem de publicar isso’ (o diário). Era um documento do que tinha passado. Foi uma forma de lidar com o estresse de tudo o que aconteceu. Minha irmã é assistente social e várias vezes tinha se deparado com casos em que parentes ajudaram entes queridos a morrer. Ela achava que tornar minha experiência pública poderia ajudá-los a ver que não estavam sozinhos”
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“Não achei que precisava consultar meus irmãos. Primeiramente, porque todos sabiam que minha mãe não queria ir para o hospital. Segundo porque nenhum deles estava cuidando dela. Eu é que estava sozinho com ela, testemunhando sua agonia. Também não era uma decisão deles. Era da minha mãe.”
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“Não fui julgado apenas pela Justiça, mas pela mídia e pela sociedade. Para aqueles que me criticam, só peço que se coloquem no meu lugar antes de emitir opiniões.”
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“A Nova Zelândia é um país muito religioso e o suicídio assistido é uma questão delicada. As pessoas não param para pensar na morte, a não ser na hora em que precisam lidar com ela. Não acho que ninguém precisa deixar de ser preocupar com a vida, mas ter consciência de questões relacionadas à morte é importante”