Ex-blogueiro da Veja afirma que mulheres que apanham em relacionamentos abusivos têm responsabilidade sobre a situação: “muitas sentem gozo pela postura de vítima”, defende Constantino. No Brasil, quase 5 mil mulheres são mortas por ano em decorrência de violência doméstica, uma média de treze a cada dia
“Muitas escolhem essa situação não pelos filhos ou pelos próprios parceiros, e sim pelo gozo que sentem na postura de vítima”. A frase foi escrita pelo ex-blogueiro da revista Veja Rodrigo Constantino no texto [leia abaixo] em que coloca parte da culpa nas mulheres vítimas de violência doméstica pelas agressões que sofreram.
No artigo, publicado em seu blogue nesta segunda-feira (23), Constantino se pergunta “até que ponto a vítima de agressões recorrentes não faz parte do problema”.
Sua tese é de que mulheres têm a chance de abandonar relacionamentos abusivos e violentos e que, se não o fazem, têm responsabilidade sobre a situação.
O blogueiro nasceu e foi criado no Brasil, onde está a maioria absoluta de seus leitores, onde 4.762 mulheres foram mortas somente em 2013, uma média de treze a cada dia, segundo o Mapa da Violência 2015.
O estudo revelou que 55,3% desses crimes aconteceram no ambiente doméstico, sendo 33,2% cometidos por parceiros ou ex-parceiros das vítimas. Além disso, entre 2003 e 2013, os homicídios de mulheres negras aumentaram 54%, passando de 1.864 a 2.875.
Leia abaixo o texto de Constantino:
Por que tantas mulheres agredidas continuam com seus agressores?
Acabei de publicar um texto sobre um idoso agredido por seu caseiro, e fui ler o artigo de Ligia Bahia no GLOBO. Ela defende que a agressão a mulher não é uma questão individual ou sequer legal, e sim um problema de saúde pública.
Em seguida, diz que a pergunta de por que as mulheres permanecem em relações conjugais violentas deve ser substituída pela “escuta”, ou seja, não devemos tratar essa mulher como conivente em sua desgraça, e sim como vítima apenas.
Pensei: se o proprietário do restaurante que foi agredido pelo caseiro aceitasse um simples pedido de desculpas e uma promessa de mudança, colocando-o novamente para cuidar da casa, será que ele teria alguma parcela de responsabilidade num eventual novo caso de agressão?
Até que ponto a vítima de agressões recorrentes não faz parte do problema? A “escuta” que Ligia Bahia sugere para transformar a mulher que apanha somente em vítima foi feita durante vários anos pelo psiquiatra britânico Theodore Dalrymple. Sua conclusão é diametralmente oposta à da professora da UFRJ.
Dalrymple considera desumano e sensacionalista isentar a mulher totalmente de culpa ou responsabilidade, quando ela é vítima recorrente de agressões. Ele conheceu várias, e perguntava por que não abandonavam os parceiros agressores. As respostas variavam, mas sempre em torno de uma vitimização que trazia algum gozo a elas.
O namorado era um pobre coitado que finalmente iria mudar. Ele precisava muito dela, pois sem ela ele estaria perdido de vez na vida. Preservar o parceiro em casa era melhor para os filhos, mesmo que ela tenha que pagar o preço de apanhar de vez em quando. E por aí vai.
Tais desculpas jamais convenceram o psiquiatra, que cobrava delas uma postura de responsabilidade nesses atos. Elas, no fundo, sabiam que seriam vítimas novamente das agressões. Dalrymple, que é o contrário de sensacionalista, nunca deu moleza para que essas mulheres agredidas pudessem bancar as eternas vítimas, como fazem intelectuais de esquerda.
Ninguém vai sustentar que é muito fácil se livrar do parceiro agressor, ou que o próprio medo não seja um fator envolvido na escolha. Mas eis o ponto central aqui: há escolha! Por mais difícil que ela seja, existe a possibilidade de escolha. E acredito, com Dalrymple, que muitas escolhem essa situação não pelos filhos ou pelos próprios parceiros, e sim pelo gozo que sentem na postura de vítima.
O caso do candidato do PMDB à prefeitura do Rio, Pedro Paulo, trouxe à tona uma vez mais o assunto, e as duas agressões relatadas e conhecidas são suficientes para enterrar seu sonho de concorrer de fato ao cargo do companheiro Eduardo Paes. Não se pode aceitar alguém que bate na própria mulher. Sua carreira política merece ser destruída.
Mas é preciso lembrar que sua mulher, a mesma que foi agredida ao menos duas vezes, continua com ele. A esperança venceu a experiência? Eis a pergunta que deixo no ar para o leitor, então: se houvesse um terceiro episódio, ela estaria totalmente isenta de responsabilidade nele?
Esquerdistas como Ligia Bahia querem que o estado cuide de tudo como tema de “saúde pública”. Direitistas como Theodore Dalrymple cobram maior responsabilidade individual, sem vitimizar pessoas que, mal ou bem, escolhem seus destinos sempre como eternas vítimas. Quem está com a razão? A visão que transforma a mulher agredida em vítima indefesa incapaz de reagir, ainda que legalmente ou pulando fora da relação doentia, não vai contra o feminismo tradicional que tenta fortalecer as mulheres?
Acompanhe Pragmatismo Político no Twitter e no Facebook