André Falcão*
Nasci em 1964, ainda no alvorecer funesto do golpe. Meus pais não tinham militância na esquerda. Nem na direita. Tinham medo, suponho, como a maioria da população brasileira, que (pouco) ouvia falar do que acontecia nos porões dos DOI-CODIs e similares espalhados pelo país.
Somente lá pelos 14 anos, é que me vi torcendo pelo candidato ao Senado, Moura Rocha, que ganhou, mas não levou — é que pelas regras dos golpistas de então seria eleito o mais votado do partido que, somados os votos de seus candidatos, tivesse a maior votação: a ARENA vencia. Porém, elegeu-se para a Câmara o meu hoje amigo querido José Costa (MDB), por quem também torci. Também Mendonça Neto (MDB). Como somente podiam existir esses dois partidos, na “democracia” militar, todos do MDB nos pareciam de esquerda. E a gente queria ser de esquerda. E, claro, contra a ditadura militar. Ali, não sabia, mas já estava decretado de que lado eu estaria em toda a minha vida. Uma escolha realizada, então, quase que apenas intuitiva (ou seria orgânica?).
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Eleição seguinte (1982), então estudando Engenharia Civil na UFPE — que depois abandonei para fazer vestibular para Direito para a mesma universidade —, fiz campanha para Marcos Freire, governador; aqui, para José Costa, e para o Senado em Moura Rocha; todos derrotados. Foi por essa época que iniciei minhas incipientes leituras de Marx, e era leitor voraz da Tribuna da Luta Operária, a que fui aconselhado pelo meu pai a não assinar. Ele temia por mim.
Em 1986, foi eleito o bravo comunista alagoano, Eduardo Bomfim, constituinte nota 10 da Constituição vigente, de 1988, pelo honrado e imprescindível PCdoB de Alagoas. De lá pra cá, o povo brasileiro elegeu o presidente mais respeitado e homenageado da história deste país, e uma mulher valente, corajosa e digna de todo o respeito e admiração: Lula e Dilma. As Forças Armadas, por sua vez, evoluíram e voltaram a merecer o respeito que a sua genuína e imprescindível missão exigem.
E hoje, conhecidos de há muito os crimes de porão tingidos de verde-oliva e sangue, surpreendo-me e entristeço-me quando vejo brasileiros defendendo a volta do regime militar, ou o impedimento da presidenta eleita do Brasil (tentativa golpista travestida de legalista). Mas alegro-me ao constatar a força dos que defendem a democracia tão arduamente conquistada e, de consequência, o mandato legitimamente conquistado da presidenta — inclusive nas ruas, como pude ver (e participar). Definitivamente, o povo vê. E, se necessário, vai à luta.
*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político
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