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Como a ditadura militar agia nas favelas do Rio de Janeiro

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Comissão da Verdade aponta como a repressão atuou nas favelas do Rio de Janeiro durante a ditadura militar. Relatório também detalha os abusos cometidos na época

Remoções foram forma recorrente de violação de direitos

“Nos últimos três anos, a UPMMR [União Pró-Melhoramentos dos Moradores da Rocinha] apresentou diversas queixas e denúncias sobre violências e arbitrariedades cometidas por policiais na Rocinha, tais como: cobertura sistemática dada a grileiros da favela, que procuravam se apossar das terras, expulsando famílias que lá viviam; invasão de barracos; arrombamento de residências; espancamentos de moradores e prisões ilegais; diversos tipos de extorsões cometidas contra trabalhadores ou marginais.

Foram abertas algumas sindicâncias, que não deram em nada, devido à má vontade das pessoas que as dirigiam, e às pressões e intimidações feitas contra as testemunhas”.

“Dentro dessa comunidade aqui, os caras quando entravam aqui entravam com olhar assim de: ‘todo mundo é bandido’. Aquelas rondas, aquelas blitz dentro do morro, eles entravam com suporte militar, entravam e desciam com a gente amarrado tipo arrastão de peixe, que você joga aquele espinhal. Todo mundo amarrado na mesma corda, descendo o morro”.

As situações descritas nos dois trechos acima bem que poderiam ter acontecido na semana passada, mas se referem a episódios que ocorreram durante a ditadura militar. O primeiro é um panfleto de 1981 da União Pró-Melhoramentos dos Moradores da Rocinha (UPMMR), localizado no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ). O segundo é parte do depoimento de José Fernandes, o Xavante, liderança da Rocinha, prestado à Comissão da Verdade do Rio.

Os dois fragmentos fazem parte do capítulo A Ditadura nas Favelas Cariocas do Relatório Final da Comissão da Verdade do Rio (CEV-Rio)

Escrito em colaboração com os pesquisadores Marco Pestana e Juliana Oakim, a análise mostra que as remoções foram uma forma recorrente de violação de direitos. Somente entre 1964 e 1973, atingiram mais de 100.000 pessoas no Rio de Janeiro.

Vigilância

Outro aspecto levantado é que o regime se utilizava de mentiras – o medo de que moradores de favelas poderiam atuar como base para uma revolução comunista – para legitimar suas ações nestes locais, para além do auxílio às remoções: “consolidou-se, assim, uma presença não apenas ostensiva e repressiva, como também voltada para o desenvolvimento de uma ampla vigilância e de exaustivas investigações sobre os indivíduos e grupos politicamente atuantes nas favelas cariocas durante a ditadura”, aponta o relatório.

O Relatório Final da Comissão, instalada com o objetivo de esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas entre 1946 e 1988, apresenta o resultado de dois anos e oito meses de trabalho. Engloba, entre outros aspectos, pesquisas a respeito do empresariado e da violência aos trabalhadores rurais e urbanos, aos militares perseguidos, aos moradores de favela, à população negra, às mulheres e aos setores LGBT.

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Renata Sequeira, Brasil de Fato

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