Assim como no golpe de 1964 as Forças Armadas foram apresentadas pelo conservadorismo como uma instituição “imparcial por natureza”, em 2016 é o Poder Judiciário que é apresentado pelo conservadorismo como uma instituição “imparcial por natureza”; entretanto, os jingles que carros de som nas grandes cidades tocam em apoio a Sérgio Moro e as camisetas com frases em inglês vendidas em lojas chiques nos shoppings em apoio ao juiz deixam mais óbvia que nunca a politização do Judiciário
Nicolas Chernavsky*
Quanto mais o tempo passa mais clara fica a estratégia conservadora no Brasil atual: impedir a candidatura presidencial de Lula em 2018 e fechar o PT utilizando o Poder Judiciário, apresentando este último como uma instituição “imparcial por natureza”. No golpe de 1964, estratégia semelhante foi usada em relação às Forças Armadas, cuja suposta “imparcialidade natural” foi até indicada na posse do primeiro ditador, Castelo Branco, que em seu discurso negou se posicionar tanto à “direita” quanto à “esquerda”.
Em 2016, o discurso da “imparcialidade natural” do Judiciário fica evidente quando se ouvem os jingles profissionalmente produzidos que carros de som tocam no centro das grandes cidades hoje em dia tentando convencer a população de que Sérgio Moro é um juiz imparcial. É interessante que a mesma musiquinha que tenta convencer o povo de que Moro é imparcial trata o juiz em muitos aspectos como se fosse um político. Há até camisetas com frases em inglês apoiando Moro sendo vendidas em lojas chiques nos shoppings.
O discurso de 1964 de que as Forças Armadas seriam uma instituição “imparcial por natureza”, que poderia tomar o poder sem favorecer nem o progressismo nem o conservadorismo, jogou o país em mais de duas décadas de ditadura conservadora. Assim, ficou óbvio para a sociedade brasileira que as Forças Armadas só são imparciais se se subordinarem ao poder democraticamente eleito. Se não, são conservadoras. Quanto ao Judiciário, este só é imparcial se os membros de seus tribunais superiores forem escolhidos pelos poderes democraticamente eleitos, com tempos de mandato adequados à democracia, ou se estes membros forem eleitos democraticamente de forma direta. Do jeito que se estrutura no Brasil hoje, com o STJ praticamente se autoescolhendo e com os ministros do STF e desembargadores tendo mandatos que podem chegar a 35 anos, o Judiciário não é imparcial, e sim conservador. Por isso, é a escolha óbvia do conservadorismo para facilitar sua chegada ao poder, uma vez que através do Executivo e do Legislativo, o progressismo, ao vencer quatro eleições presidenciais seguidas (em um país presidencialista) vem se mantendo no poder no Brasil.
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Uma vez que só a democracia pode tornar o Judiciário de fato relativamente imparcial, é preciso utilizar os instrumentos democráticos em relação ao Judiciário, pelo menos estabelecendo mandatos adequados aos períodos democráticos (4 ou 5 anos) para os(as) juízes(as) dos tribunais superiores, e implementando um sistema de escolha dos(as) juízes(as) do STJ através das instituições democraticamente eleitas (como no STF) ou através do voto direto da população. Quanto à atual tentativa conservadora de impedir a candidatura presidencial de Lula em 2018 e fechar o PT através do Judiciário, enquanto não fazemos as reformas democráticas como as mencionadas acima no Judiciário a saída é mostrar através de grandes manifestações de massa e mobilização popular nas ruas e nas redes que o progressismo compensará nas urnas, em 2016 e 2018, qualquer inclinação conservadora do Judiciário.
*Nicolas Chernavsky é jornalista formado pela Universidade de São Paulo (USP), editor do CulturaPolítica.info e colaborador do Pragmatismo Político
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