André Falcão*
Fico me perguntando… Não, na verdade não fico, porque não acredito que alguém em sã consciência possa honestamente crer no que vou objetar. Mas, para iniciar o texto, essa pergunta falseada, para construção do raciocínio a tanto se presta. Então, volto: Fico me perguntando se alguém pode realmente crer que a corrupção — que está sendo combatida nos tempos atuais, nos governos Lula e Dilma, inclusive atingindo alguns filiados ao próprio partido desses presidentes (que nem de longe são maioria) — seja obra e graça desses governos.
Ora, Dilma e Lula criaram — sim, foram eles! — os principais instrumentos de combate à corrupção. Isto é fato, não interpretação. A própria lei da delação premiada — despoticamente utilizada como instrumento de tortura— foi sancionada por Dilma. Ambos sempre prestigiaram os mais votados pela corporação dos procuradores federais. Diferentemente do outro, que lhe antecedeu. Isto também é fato. Escolheram os ministros do STF dentro de estrito espírito republicano, tanto e a tal ponto que muitos cinicamente usam isto como argumento para referendar eventuais equívocos da Corte, do que é exemplo o que diz: não reclame, porque foram Lula e Dilma que os escolheram. E aí devo dizer: realmente foram tão republicanos quanto ingênuos. Quem sabia escolher era FHC! Vide Gilmar. E a polícia federal? Tem atuado com tal liberdade ao ponto de reivindicar, pasmem, sua autonomia, como se algum governo pudesse (ou devesse) conferi-la a uma instituição policial.
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Mais! O principal órgão de oposição dos governos Lula e Dilma é a chamada grande mídia, que sequer foi incomodada. Deveria! Afinal, é a grande mídia que mente, escamoteia, manipula, falseia, distorce e até crimes pratica. Essa mídia jamais poderia receber um vintém de verbas federais. E esses governos deveriam ter promovido a sua regulação, ao menos nos moldes realizados por dois grandes expoentes do capital: os EUA e o Reino Unido. Nem isto. Mesmo apanhando dia e noite, desde quando Lula foi eleito. Mesmo como vítima de uma campanha diuturna desonesta, primeiro contra a sua reeleição; agora, por seu impeachment.
A polícia federal, sem que o seu inoperante então Ministro da Justiça e chefe sequer soubesse, participou ativamente de grampo realizado (e divulgado) de conversa íntima do ex-presidente com a atual presidente. Entre muitas outras coisas. Essa mesma polícia federal realizou, em todo o governo que lhes antecedeu, menos de meia centena de operações, enquanto agora já passa de 2.500. Que governo corrupto é este que deixa a sua polícia agir com tal liberdade e, pior, com inescondível atuação política contrária?
Então, por favor, não venha dizer que este é o governo da corrupção, porque se fizer estará sendo escancaradamente desonesto. No mínimo, intelectualmente desonesto. Ou corrupto, como vocês gostam de dizer, não raro sem moral para tanto.
*André Falcão é advogado e autor do Blog do André Falcão. Escreve semanalmente para Pragmatismo Político
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