Ricardo Noblat e Merval Pereira chamam militares para “colocar ordem no país”
A Rede Globo, que ajudou a implantar uma ditadura militar no Brasil e dela se beneficiou amplamente, construindo de mãos dadas com os generais o maior monopólio de comunicação do mundo, volta a flertar com os quartéis e utiliza dois de seus principais porta-vozes para passar o recado
A Rede Globo, que ajudou a implantar uma ditadura militar no Brasil e dela se beneficiou amplamente, construindo de mãos dadas com os generais o maior monopólio de comunicação do mundo, volta a flertar com os quartéis.
O grupo midiático usou dois de seus principais colunistas, Merval Pereira e Ricardo Noblat, para disseminar a tese de que os militares estariam prontos para colocar ordem na casa – assim como em 1964.
“Já há algum tempo, diante do agravamento da crise político-econômica, militares de alta patente estão conversando com lideranças civis de diversos setores da sociedade, e agora consideram que está na hora de o mundo político encontrar saídas constitucionais para o impasse em que estamos metidos, com o Congresso, que é o único caminho para uma solução em moldes democráticos, paralisado diante de sua própria crise”.
Merval diz ainda que “alguma coisa terá que ser feita, e rápido”
“A crise ganhou um novo componente. Ele veste farda e tem porte de arma. Sua entrada em cena, ontem, foi o fato mais importante do dia em que o país quase parou, surpreso com o que acontecia em São Paulo. Os generais estão temerosos com a conjugação das crises política e econômica e com o que possa derivar disso. Cobram insistentemente aos seus interlocutores do meio civil para que encontrem uma saída”, escreveu Noblat, que defendeu ainda que, no passado, a corrupção era mais ‘sadia’.
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“Precisamos voltar a níveis passados de incompetência e corrupção. Eram mais sadios”, afirmou.
Grotesco
O jornalista Mário Magalhães, do UOL, chama de “grotesco e perigoso” o retorno das vivandeiras, pedindo intervenção militar, em pleno 2016.
“Agora, elas chegaram ao jornalismo. Ou melhor, regressaram, décadas mais tarde”, diz ele em seu blog, em referência aos colunistas do Globo Merval Pereira e Ricardo Noblat, que no fim de semana clamaram pelas Forças Armadas.
Leia a seguir a íntegra do texto de Mário Magalhães:
O mundo gira, a lusitana roda, e as vivandeiras continuam na ativa. Pelo menos no Brasil.
Eu as supunhas extintas, como contei no ano passado, em post reproduzido abaixo.
Agora, elas chegaram ao jornalismo. Ou melhor, regressaram, décadas mais tarde.
Como no século XX, ninguém diz que quer intervenção militar para rasgar a Constituição.
As vivandeiras falam em proteger a ordem constitucional. Mas, cá entre nós, pode chamar de golpismo.
A essa altura do século 21, as vivandeiras são grotescas.
Podem ser também perigosas.
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Tudo é história: vivandeiras
Um bom método para avaliar se o Brasil melhorou ou piorou, e levantar um pouco o astral, é catar palavras que caíram em desuso.
Muitos jovens nunca ouviram falar em “anjinhos”. Não que eles não mais existam. Mas é cada vez mais difícil encontrá-los, graças à decadência da mortalidade infantil.
Anjinhos são bebês ou crianças mortos. Quase sempre por doenças associadas à desnutrição, ou à fome, para falar em bom português. Eram comuns nos cenários nordestinos.
Quantos brasileiros sem cabelos brancos sabem o que é “empastelamento”?
Houve uma época, no trepidante século XX, em que as autoridades empastelavam jornais. Isto é, fechavam na marra publicações que não acolhiam as ideias do poder.
E “vivandeira”, alguém ainda liga o nome à pessoa?
Na origem, como ensina o verbete do “Houaiss” reproduzido no alto, era a “mulher que acompanha uma tropa, vendendo ou levando mantimentos e bebidas”.
Mais tarde, ganhou outra conotação, a de quem incentiva a desinteligência entre militares. E atiça a sua intervenção ilegal e ilegítima na ordem constitucional, derrubando e promovendo governos.
As vivandeiras grassaram no país da década de 1920 à de 1980.
Eu as supunha extintas, como a varíola.
Lembrei-me delas por causa do assanhamento de um pessoal que anda provocando as Forças Armadas a fazerem o que, salve, salve, elas têm reiterado que não farão. Quer dizer, não pretendem estuprar a democracia.
Para frustração das, como é mesmo?… vivandeiras.