Max Altman, Revista Samuel
Percebo certo nariz torcido da imprensa com relação à extraordinária repercussão da histórica visita do presidente Obama a Cuba.
O editor-executivo da Folha de S. Paulo Sérgio Dávila afirma que é “a primeira vez que um Castro é verdadeiramente questionado por um representante do jornalismo profissional em seu próprio país desde que a família tomou o poder, em 1959.”
Duas observações: em Cuba creio que é mesmo a primeira vez, embora o presidente Raúl Castro tenha respondido à imprensa internacional em várias outras ocasiões, inclusive no Brasil. Quão ardiloso e cínico se mostra Dávila quando diz que a “família [Castro] tomou o poder”. Por certo, o editor sabe que Fidel tomou o poder quando do triunfo da Revolução que comandou e que Raúl era um dos comandantes da revolução vitoriosa. Portanto, Raúl não está à testa de Cuba por ser irmão e sim na qualidade de dirigente histórico da Revolução. Por sinal, Raúl militou nas hostes da esquerda cubana antes que Fidel assumisse nítidas posições de esquerda.
Afirma ainda em seu artigo que “segundo Ben Rodhes, da Casa Branca, não era certo, até momento antes da coletiva, que o dirigente cubano aceitaria responder a perguntas dos repórteres, mas ele acabou aceitando.” À parte a especulação, cumpre lembrar que as visitas do ex-presidente Jimmy Carter, do papa João Paulo II, do papa Francisco, por exemplo, e seus pronunciamentos foram amplamente divulgados pela imprensa, rádio e televisão locais. O mesmo ocorre com a visita de Obama. Todos os seus passos e manifestações estão sendo ampla e livremente difundidos pela mídia cubana e as repercussões na imprensa internacional transmitidas abertamente ao público cubano.
“Só isso já mostra que Cuba, de fato, começa a mudar”. A Folha também poderia começar a mudar. Por exemplo, deixar de apresentar invariavelmente o presidente Raúl Castro como ditador ao mesmo tempo em que trata delicadamente de príncipe a Salman el Saud, chefe de Estado, de governo, de tudo da monarquia absoluta da Arábia Saudita.
Nossa imprensa insiste que a aproximação Cuba-Estados Unidos fará com que a ilha se afaste da Venezuela, deixando-a sozinha com seus dramáticos problemas. O indício dessa situação é que Nicolás Maduro foi a Cuba, retornando às pressas a Caracas antes que Obama pousasse em Havana.
As notícias informam algo diferente. O presidente Raúl Castro se reuniu com Maduro e constataram “o excelente estado dos vínculos bilaterais e ratificaram a vontade de continuar fortalecendo os programas de cooperação, paradigma de vínculos fraternais, solidários e mutuamente benéficos”.
E ainda de Havana nos vem a notícia de que o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, manteve histórico encontro com as FARC em Cuba. E atenção, Kerry não é membro do Foro de São Paulo.
Kerry chegou à ilha junto com Obama, reunindo-se no dia seguinte com as FARC. A guerrilha e o governo da Colômbia negociam em Havana um acordo de paz para terminar com mais de meio século de enfrentamento armado. “A paz na Colômbia avança” escreveu no Twitter Iván Márquez, chefe da equipe de negociação dos rebeldes.
Resta a Kerry convencer o ex-presidente colombiano Uribe que a vez de uma paz honrosa e justa chegou e que a hora dos narcoterroristas acabou, para a alegria do povo colombiano.
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