Pais de meninos derrotados não aceitam vitória de time feminino
Time feminino de futebol conquista título contra garotos em campeonato masculino. Pais dos meninos não souberam lidar com a derrota e tentaram elaborar justificativas diversas
Um dos principais celeiros de jogadoras de futebol feminino no País, o Centro Olímpico de São Paulo resolveu arriscar. Sem torneios de base para jogar, pediu autorização para disputar a tradicional Copa Moleque Travesso, disputada no Juventus da Mooca. O que ninguém esperava é que a equipe fosse deixar para trás times de camisa como São Paulo, Corinthians, Portuguesa e Flamengo para faturar o título no sub-13.
“Existia uma cobrança de certa forma exagerada em relação às derrotas dos meninos para as meninas. Eu acho que também é uma coisa que a gente cutucou uma ferida que, no Brasil, ainda não é coisa bem explicada. A gente invadiu um campeonato que [achavam que] a gente não tinha, talvez, que se meter naquilo e causou um certo mal-estar”, afirma Lucas Piccinato, treinador do Centro Olímpico.
“Como a diferença física é bem grande, a gente propôs entrar com um time um ano mais velho e eles aceitaram, só uma equipe se opôs. A maioria dos times super apoiou a ideia, disse que tinha que permitir a integração das meninas”, disse o treinador.
Do elenco de 18 jogadoras do Centro Olímpico, sete eram nascidas em 2002, enquanto as demais 11 são da geração 2003. Têm, portanto, a mesma idade máxima dos jogadores dos times masculinos.
Para o treinador, o título foi consequência do talento das meninas do Centro Olímpico. Se na fase de grupos elas sofreram duas derrotas e só venceram três dos sete jogos, no mata-mata as meninas venceram os dois times dos quais haviam perdido. Na final, venceram o São Paulo Piloto por 3 a 0.
Perder pra qualquer um, menos pra elas
Piccinato contou ainda que percebeu que havia um consenso entre os demais times de que não poderiam perder para uma equipe feminina. Os pais dos meninos também tinham dificuldades para assimilar. Mas não descontavam nas meninas e, sim, nos próprios filhos. A cobrança era por perder uma dividida, tomar um drible ou ser menos veloz.
“Eu não condeno, Eu acho que todo o Brasil tem que melhorar em relação ao preconceito. A gente acabou invadindo o espaço de uma competição masculina. Mas, de certa forma, os pais dos garotos, sempre que havia uma derrota, não lidavam de uma forma muito positiva.”
O treinador declarou que pais dos jogadores diziam que os meninos não entravam forte por medo de machucar as adversárias. O pico da discórdia ocorreu quando foi dito que futebol não era coisa de meninas.
Na semifinal do campeonato, as meninas ganharam a partida por 3 a 1. Os adversários ficaram bem irritados com a derrota e houve uma dose extra de frustração por tratar-se de uma equipe feminina. Nas arquibancadas, os pais das garotas ouviram mais uma vez que havia medo de machucar as atletas e que futebol não é para elas. Também escutaram que o resultado ocorreu por causa das atletas de 14 anos.
“Em alguns momentos, os pais das outras equipes – principalmente nos jogos da final e semifinal – usaram isso como muleta. Só que ao mesmo tempo essas duas mesmas equipes durante a competição nos jogos da fase regular venceram a gente com essas mesmas sete meninas jogando”.
O que chamou atenção também foi o engajamento dos pais das meninas. Não apenas por fazerem camisetas para as fases finais, mas pela defesa do direito das mulheres jogarem bola.
“Acabava que os pais passavam para nossas atletas uma certa luta, uma resistência contra todo o preconceito em volta”, concluiu o técnico.
as informações são da Agência Estado e de Felipe Pereira/UOL/SP