Eric Gil*, Pragmatismo Político
Outro dia chegou ao meu whatsapp um vídeo que tratava sobre como os impostos são um absurdo e como o governo rouba grande parte do seu dia através disto. Esse vídeo chegou na mesma semana que viralizaram vários memes tirando sarro com o discurso do MBL que dizia que sem a CLT os trabalhadores ganhariam muito mais dinheiro (afinal o seu patrão quer aumentar o teu salário, só não o faz por conta do governo).
Bem, o discurso contra impostos realmente é bastante sedutor. Basta parar pra conversar com qualquer trabalhador, que a princípio ele até concordará, apesar de ser usuário de grande parte dos serviços públicos.
Mas imposto é prescindível? Poderíamos abrir mão dele? É realmente um roubo?
Os impostos servem para financiar toda a estrutura e os serviços públicos de uma sociedade. Não esqueçamos com que financiamento são construídas ruas, calçadas, viadutos, hospitais, escolas e tantas outras coisas. Quando pedimos menos impostos, consequentemente podemos estar pedindo menos serviços públicos, ou ao menos é o objetivo de quem mais milita por isto (que coincidentemente é a parcela mais rica da sociedade, a que não usa serviços públicos).
Uma cidade como São Paulo, por exemplo, arrecada anualmente cerca de R$50 bilhões de reais. Já o estado de São Paulo arrecada quase R$200 bilhões. Isto não é, nem de longe, ruim. As universidades estaduais deste estado recebe, de forma fixa, 9,57% do que é arrecadado de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – o principal imposto estadual), o que permite às três estaduais de SP se posicionarem entre as principais universidades da América Latina.
O ideal é que todos os serviços públicos tivessem alto nível de financiamento, pois a sua qualidade é diretamente proporcional à quanto de dinheiro é investido em determinada área, sendo a qualidade das universidades estaduais paulistas um exemplo disto.
Obviamente o discurso da corrupção dá motivos ao cidadão não querer pagar impostos, pois crê que cada real que paga em imposto, uma parte vá para a bolsa de algum político corrupto. Mas o que deve ser tão combativo quanto a corrupção é outro tipo de roubo, a sonegação fiscal feita pelo empresariado. Segundo o Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, a sonegação é responsável por sete vezes mais retirada de dinheiro dos cofres públicos do que a corrupção. “Deixa-se de recolher 500 bilhões de reais por ano aos cofres públicos no País, ao passo que o custo anual médio da corrupção no Brasil, em valores de 2013, corresponde a 67 bilhões anuais” .
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Voltando à questão do imposto stricto sensu, o problema no Brasil não é o quanto se cobra, a chamada carga tributária. Na verdade o Brasil possui uma carga tributária próxima à média dos 34 países que compõe a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). O que deve ser mudado é a lógica tributária brasileira, de que quem tem mais renda paga menos impostos.
Ano passado escrevi nesta coluna sobre a estrutura tributária brasileira (leia aqui), sugerindo que o imposto saia da cobrança em cima do consumo e vá para a renda, além do país voltar à cobrar imposto em cima dos lucros (sim, o governo não tributa lucro de empresário no imposto de renda!).
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Mas isto nem sequer é cogitado pelo Executivo, Congresso ou pautado pelos grandes jornais, que só conseguem enxergar no dinheiro que vai pra Educação, Saúde, Previdência, Assistência Social e outros gastos sociais dinheiro em potencial para pagar juros da dívida pública, o superávit primário, materializando-se agora na PEC 241/16, que congela o crescimento dos gastos públicos e proibirá o aumento dos investimentos públicos por 20 anos (já imaginou termos a mesma educação ou sistema de saúde de 20 anos atrás?).
Então nos atentemos!
*Eric Gil é economista formado pela Universidade Federal da Paraíba, mestre e doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná; escreve quinzenalmente para Pragmatismo Político
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