Por que Moro mandou soltar Mantega 5 horas depois do 'espetáculo'?
Após a repercussão negativa, Sergio Moro voltou atrás e colocou Guido Mantega em liberdade. Juiz da Lava Jato disse que não sabia do estado de saúde da esposa do ex-ministro. Entenda a celeuma
O juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, revogou a “prisão preventiva” de Guido Mantega cinco horas depois de o ex-ministro da Fazendo ter sido detido ontem (22) pela Polícia Federal no momento em que acompanhava a mulher, com câncer, em cirurgia no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.
Em seu despacho revogatório, o juiz da Lava Jato anotou que ele, a Procuradoria e a Polícia Federal desconheciam que “o ex-ministro acompanhava o cônjuge acometido de doença grave em cirurgia.”
A prisão havia sido pedida pela Procuradoria da República sob alegação de “riscos à ordem pública” e de destruição de provas. No despacho, emitido às 12h20 de quinta-feira, o juiz reviu essa interpretação, afirmando estarem “esvaziados os riscos de interferência da colheita das provas nesse momento”.
Sequestro
O advogado José Roberto Batochio, que defende o ex-ministro, disse que a prisão foi absolutamente desnecessária.
“As liberdades públicas e individuais estão sequestradas no Brasil e o cativeiro delas é no estado do Paraná, em Curitiba”, afirmou.
Segundo ele, os policiais estiveram às 6h no apartamento de Mantega, em Pinheiros, zona oeste da capital paulista, mas encontraram apenas o filho adolescente e a empregada.
Batochio orientou, por telefone, que Mantega deixasse o centro cirúrgico e descesse ao saguão. “Eu disse: é melhor sair daí, senão vai gerar um tumulto”, contou. O ex-ministro recebeu voz de prisão quando já estava no saguão.
Acusações
A defesa de Mantega negou as acusações do empresário Eike Batista de que Guido Mantega, à época presidente do Conselho de Administração da Petrobras, teria pedido R$ 5 milhões para o PT, para pagamento de uma dívida de campanha de 2010.
“Ele (Eike) propôs delação contra alguém de visibilidade, que fosse importante, para que o delatado fosse preso e não ele”, disse o advogado.
“O ministro tem, por obrigação, uma agenda pública, em permanente contato e diálogo com toda a cadeia produtiva brasileira, no sentido de discutir políticas públicas em todos os setores. O ministro da Fazenda é obrigado a conversar com todos os empresários, mas jamais tratou de doação de qualquer valor”, reiterou.
Esposa
Guido Mantega estava ao lado da mulher, já pré-anestesiada e sendo conduzida na maca rolante para o centro cirúrgico do Hospital Albert Einstein, quando recebeu o telefonema com a notícia de que estava sendo preso.
“Não sei se ela entendeu o que aconteceu, porque eu tive que sair abruptamente, ou o que falei por telefone. Espero em Deus que não”, disse o ex-ministro ao seu advogado, José Roberto Batochio, por telefone.
Segundo o advogado, Mantega ficou “profundamente consternado” por não poder acompanhar a esposa até o local onde ela iria passar por uma delicada cirurgia no cérebro.
Erro
De acordo com o editor Fábio Zanini, da Folha de S.Paulo, a Operação Lava Jato erra quando a prisão ganha mais destaque que o mérito. “A operação sofreu uma derrota quando a forma da prisão chamou mais atenção que o mérito do caso”, diz.
Zanini lembra ainda que isso também ocorreu na denúncia contra o Lula, quando a forma como o ex-presidente foi denunciado chegou a virar memes na internet, colocando a acusação em segundo plano.
Para o colunista Bernardo Mello Franco, do mesmo jornal, a prisão de Mantega teve como principal objetivo gerar uma sangria no PT às vésperas da eleição. Mello afirmou que as pesquisas de intenção de voto mais recentes já estavam apontado dificuldades para o partido nas principais capitais do país.
Lula
Ao comentar a prisão e soltura do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, em mais uma ação midiática da Operação Lava Jato, o ex-presidente Lula classificou a medida como autoritária e alegou “questões humanitárias”, já que Mantega, que tem residência fixa, acompanhava a mulher em um procedimento cirúrgico.
“Não tem desculpa. Isso se chama autoritarismo, chama-se prepotência e arrogância”, disse o ex-metalúrgico.
“O Guido é um homem que foi ministro da Fazenda, tem residência fixa, portanto as pessoas deveriam tratá-lo como o ser humano deve ser tratado. Eu não sou de acreditar nas delações. (…) O que é preciso é que as pessoas não sejam julgadas pelas manchetes de jornais antes de se apurar se houve crime ou não. Porque se a pessoa for condenada pela manchete, ela pode ser inocentada depois, mas ela estará condenada publicamente”, declarou Lula.
Gilmar Mendes
O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes, afirmou que a decretação da prisão temporária de Guido Mantega, revogada cinco horas depois pelo Juiz Sérgio Moro, foi um episódio que gerou constrangimento.
“Claro que ninguém vê isso com bons olhos. Todos esses episódios são extremamente tristes e não há o que comemorar aqui. É um constrangimento para todos”, disse o presidente do TSE.
Rui Falcão
O presidente nacional do PT, Rui Falcão, afirmou que a prisão do ex-ministro Guido Mantega foi “arbitrária, desumana e desnecessária”.
De acordo com ele, a 34ª fase da Operação Lava Jato, denominada Arquivo X, deveria se chamar “Operação Boca de Urna”, uma vez que acontece às vésperas das eleições municipais.
Falcão lembrou que Mantega é ex-ministro, tem endereço fixo e nunca se negou a dar esclarecimentos, sendo assim midiática a prisão em um hospital.
Eike Batista
O empresário Eike Batista, que seria, na teoria, o principal alvo da 34ª fase da Operação Lava Jato, denominada Arquivo X, continua em liberdade.
A divulgação do vídeo (veja aqui) em que consta o depoimento do empresário aos procuradores da Lava Jato revelou a parcialidade da investigação.
Na gravação, Eike tenta entregar três vezes à Lava Jato a lista de doações feitas ao PSDB e a outros partidos políticos. Os procuradores da Operação ignoraram, depois desconversaram e devolveram o documento.