Governo

O assassinato do Brasil

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Querem que acreditemos que o destino manifesto do Brasil é a subserviência às potências internacionais, é escancarar suas porteiras ao capital especulativo de curto prazo e a volta ao modelo primário-exportador

Legislativo, Executivo e Judiciário (reprodução)

Cássio Garcia Ribeiro*, Pragmatismo Político

Estão assassinando o Brasil pensado pela Assembleia Constituinte de 1988 e seu principal legado, a “Constituição Cidadã”. Querem que acreditemos que nosso destino manifesto é trabalhar até os 80 anos, que aceitemos serviços públicos cada vez mais precarizados, salários, aposentadorias e pensões arrochados, a privatização ampla do aparelho estatal e o recrudescimento da nossa obscena distribuição de renda. Querem que acreditemos que o destino manifesto do Brasil é a subserviência às potências internacionais, é escancarar suas porteiras ao capital especulativo de curto prazo e a volta ao modelo primário-exportador.

É importante frisar que uma parcela expressiva da população brasileira é co-autora desse assassinato. Ignorância, manipulação, interesses escusos e desprezo a valores democráticos são os principais ingredientes que permitiram o impeachment da Presidenta Dilma e a ascensão de Temer e sua “ponte para o futuro”. “Adeus querida”, “Não reclame, trabalhe”, “Nós não vamos pagar o pato”. Bem, na verdade não é de se estranhar esse tipo de visão de mundo em um país onde a mídia hegemônica, em conluio com o mercado, metralha incessantemente na cabeça das pessoas valores esquerdofóbicos e de culpabilizão do Estado pelos nossos problemas. Nesse contexto, cria-se um terreno fértil para as falácias da meritocracia e da tese de que o “Estado é igual a uma família, logo, não pode gastar mais do que ganha”.

Os “heróis” (como diria Brecht, “Infeliz a nação que precisa de heróis”) da lavajato nos prometem um país sem corrupção. Mas, o custo é alto: liberdades civis atacadas, empresas e empregos dizimados. Ao tentar dialogar com os adoradores da república de Curitiba, apontando os efeitos colaterais perniciosos da força-tarefa, não raro o debate é interditado com um sonoro “Vai pra Cuba!” É chocante a incapacidade de diálogo e o estado de torpor generalizado. É o fascismo brasileiro, autoritarista da porta para fora. Joga-se a criança com a água do banho e as pessoas aplaudem.

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Consumado o impeachment, percebe-se o quão grande era a sede daqueles que tomaram o poder. Venderam esperança, uma ponte para o futuro, mas na realidade estamos diante de uma agenda de terra arrasada. Instala-se no país, a olhos vistos, um desarranjo econômico, institucional e uma crise de legitimidade sem precedentes.

Transformamo-nos, ou melhor, nos transformaram numa verdadeira República da casa da mãe Joana. Flagrantes desrespeitos à Constituição, fichas-sujas e campeões em delações dando as cartas sobre o presente e o futuro do Brasil, guerra entre os poderes, presunção de culpa e humilhações a uns, afagos e sorrisos a outros, ataques às conquistas de 1988, decisões de longo prazo sendo propostas (e referendadas pela maioria dos nossos representantes no Congresso) por um governo sem qualquer legitimidade.

O poder instalado em Brasília, apesar de sua total e irrestrita crise de legitimidade, pisa no acelerador das reformas impopulares, com uma celeridade no processo de tramitação que daria inveja aos parlamentos mais eficientes do mundo, prescindindo de um debate mais amplo com a sociedade. Verdadeiros crimes lesa-pátria são praticados, tais como o desmonte do Estado e do nosso arremedo de bem-estar social e a mudança do marco regulatório do pré-sal. Não nos permitem sonhar. Não nos permitem argumentar. Não nos permitem protestar. Não há como não recordar de Bandeira: “O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. – Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? – Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”.

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*Cássio Garcia Ribeiro é professor do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e colaborou para Pragmatismo Político.

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