Deprimente Brasil, cujo presidente da República, por temer ser vaiado, anuncia que não irá ao velório na Arena Condá, percebe a covardia pelos jornais, muda de ideia, e se esconde, mudo, em sua insignificância na pungente cerimônia em Chapecó. Os três poderes estão em crise e o futebol não poderia ser exceção [...]
Quanto mais gente ama um clube, ainda mais gente passa a odiá-lo.
Acontece com o Flamengo, acontece com o Corinthians.
Por serem os de maior audiência, são também chamados de os times da imprensa, ou da Globo.
Quando ganham é por isso, na opinião das minorias que, juntas, são maioria.
Quando perdem é porque não foram ajudados pelos de sempre, mídia e arbitragens.
Não importa se um teve Zico e o outro, Tite. Saber perder é artigo em falta. Mas, no fenômeno que transforma rivais em inimigos, há cartolas que ajudam a demonizar clubes.
O Fluminense é o time do tapetão, o Vasco é o do Eurico Miranda, o Corinthians é o do PT.
Verdade que houve, para o bem, o Botafogo do Mané e o Santos de Pelé.
Nem um, nem outro, porém, de enormes massas torcedoras.
Para o mal, o São Paulo do governador paulista da ditadura sentado no banco de reservas.
Não é menos verdade que houve o Corinthians da Democracia Corinthiana, que acumulou simpatias pelo país afora, capitaneado pelo Dom Quixote Sócrates, cuja morte ontem fez cinco anos —e, atenção, Quixote aqui é elogio.
Fenômeno igual à Chapecoense é inédito.
Era mesmo o Brasil na Copa SulAmericana e passou a ser, na Terra globalizada, um clube mundial.
Para tanto, o exemplo veio da Colômbia, do Atlético Nacional de Medellín que, pode apostar, terá a torcida brasileira com ele no próximo Mundial de Clubes, provavelmente, e tomara, numa final com o Real Madrid, este planetário não é de hoje.
Porque o clube colombiano foi além de manter a rivalidade sadia entre adversários. Transformou-a em amizade, como um dia, em homenagem à beleza do futebol, os mexicanos, na Copa de 1970, adotaram a Seleção Brasileira.
Ora, o Fluminense já foi a Máquina do Horta, o presidente tricolor que fez história nos anos de 1970. O Vasco era o Expresso da Vitória nos anos de 1940, assim como o time dos negros. O Cruzeiro de Tostão, o Galo de Reinaldo e o Inter de Falcão encantaram todas as torcidas.
Eis que o Inter virou a bola da vez da antipatia nacional, porque, num oportunismo inqualificável, por intermédio de cartolas impensáveis, tentou se aproveitar da tragédia da Chapecoense.
Até seus jogadores, qual marionetes, entraram na dança num festival estapafúrdio de declarações insensatas.
Pobre Brasil, cujo mais alto mandatário do futebol se ausenta de representá-lo, numa hora dessas, na exemplar Colômbia, por receio de ser preso.
Deprimente Brasil, cujo presidente da República, por temer ser vaiado, anuncia que não irá ao velório na Arena Condá, percebe a covardia pelos jornais, muda de ideia, e se esconde, mudo, em sua insignificância na pungente cerimônia em Chapecó.
O Inter não tem culpa de ser representado por cartolas desqualificados. Nem o Brasil.
O que nos falta é uma verdadeira democracia, tanto no futebol como no sistema político, viciado pela força do capital despudorado.
Os três poderes estão em crise e o futebol não poderia ser exceção.
Resta torcer, utopicamente, que os tsunamis que se abateram sobre o país, o trágico e o de afeto, mexam nas mentes e nos corações brasileiros.
Porque a esperança é verde.
Os torcedores brasileiros se acostumaram a trocar a rivalidade pela inimizade. Será que dá para mudar?
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Juca Kfouri, FolhaPress
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