Carrasco arrependido. Supervisor de execuções de prisioneiros se aposenta e se sente livre para manifestar pela primeira vez em público seu repúdio às sentenças de morte
Frank Thompson supervisionava execuções de prisioneiros nos Estados Unidos. Agora, faz campanha contra a pena de morte.
O policial aposentado americano conduziu a execução de dois condenados quando estava à frente da Penitenciária do Estado de Oregon, no fim da década de 90.
Ele trabalhou no sistema penitenciário até 2010, quando se aposentou. Foi então que se sentiu livre para se manifestar pela primeira vez em público contra as sentenças de morte.
“Quando uma pessoa é executada, vem aquele sentimento de ‘justiça sendo feita’. Há um lado emocional em relação à pena de morte. Mas acredito que política pública não deve ser emocional“, afirma Thompson.
Em entrevista à BBC, Thompson conta que foi designado a conduzir a primeira execução na Penitenciária do Estado de Oregon em 32 anos.
O preso tinha sido condenado à morte pelo assassinato de um sem-teto em uma reserva indigena. E, momentos antes de ser executado, também confessou um crime que não tinha sido solucionado: a morte de uma criança.
“Não tinha ninguém no Estado de Oregon com essa experiência. Eu também nunca tinha feito uma execução antes. Não havia protocolos para executar alguém com injeção letal. A última execução tinha ocorrido há 32 anos e tinha sido feita com gás“, relembra.
“De repente, eu era responsável por recrutar, treinar e reescrever o protocolo“, completa.
Inicialmente, Thompson via a pena de morte como parte do sistema criminal de Justiça – sentença apropriada para “indivíduos que tivessem violado severamente as leis“. Mas ele diz que se envolveu tanto com o processo de execução que começou a refletir de maneira profunda sobre o que estava fazendo.
“Durante esse procedimento, todas as falhas no processo de execução me desafiaram: a discriminação contra pobres e execuções desproporcionais de minorias, particularmente negros e hispânicos“, relata.
Na sua opinião, a pena de morte não faz uma comunidade mais segura.
“Eu não acredito em tirar vidas, a menos que você possa mostrar que tirar a vida era necessário para levar segurança pública à comunidade em geral“, declara.
Um ‘bom soldado’
A segunda execução comandada por Thompson foi de um prisioneiro condenado por matar duas pessoas em uma reunião de família.
Mas, diante da constatação acima, como seria possível permanecer na função? O policial aposentado se define como “um bom soldado“.
“Eu fui treinado como um soldado. Há muitos soldados que lutam em guerras em que não acreditam. Alguns se manifestam quando saem delas. Acredito que uma sociedade estável deve ter profissionais que precisam fazer o trabalho duro, mesmo quando não acreditam nele“, afirma.
Estresse pós-traumático
Thompson diz não ter sofrido de estresse pós-traumático, diferentemente de alguns colegas. Segundo ele, muitos desenvolveram alcoolismo, apresentaram problemas domésticos ou de saúde mental após conduzir execuções.
“Quando você veste o uniforme, você é um profissional. É difícil para muitas pessoas admitir que têm problema para realizar um trabalho para o qual foram designadas“, avalia.
Ele revela então a forma que encontrou para conviver com essa experiência: “Quando me dei conta de que era contra a pena de morte, botei na cabeça que iria me tornar um ativista na primeira oportunidade que tivesse“.
“Acredito que minha experiência ajuda a levar consciência ao público, de pensar duas vezes sobre uma política pública que não funciona. Sinto que estou contribuindo com a sociedade“, finaliza.
Desde 2011, há uma moratória na aplicação da pena capital no Estado do Oregon. E, segundo a ONG americana Death Penalty Information Center, o número de execuções por ano nos EUA caiu de 98 em 1999 para 28 em 2015 – em 2016, 20 prisioneiros tinham sido executados até o início de dezembro.
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BBC
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