Sob pressão, João Doria (PSDB) antecipa programa de grafite e se contradiz sobre 23 de Maio. Prefeito de São Paulo e sua equipe parecem ter sentido a pressão da reação negativa à política
Gil Alessi, El País
Mais de uma semana após declarar guerra a pichadores e grafiteiros pintando de cinza vários murais pela cidade, o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB) e sua equipe parecem ter sentido a pressão da reação negativa à política. A gestão não só antecipou um programa que pretende subsidiar a feitura de grafites pela cidade como parece não se entender com relação aos destinos da avenida 23 de Maio, que teve obras apagadas e virou o símbolo da maré cinza da administração.
Na segunda-feira o secretário municipal de Cultura, André Sturm, fez um balanço crítico sobre a remoção das obras na 23 de Maio: “Ficou muito cinza e há uma vontade de fazer [novos trabalhos de grafite]“. Segundo ele, a via deveria voltar a receber grafites ainda no primeiro semestre deste ano, com a realização de um festival de arte. Nesta quinta, Doria contradisse Sturm, e afirmou que não serão realizados novos grafites no local, que será alocado para um novo projeto que não foi detalhado.
A pintura de grafites e pichações pela cidade faz parte do programa Cidade Linda, que prevê o reparo de calçadas e a limpeza de muros. Nos últimos dias só tem crescido a repercussão negativa à ação, que inclui a mobilização de artistas de rua famosos como Os Gêmeos, que disseram que apagar as obras da 23 de Maio foi um ato de “desrespeito”. Em resposta, o tucano anunciou a criação do programa Museu de Arte de Rua, que originalmente estava previsto para março, segundo a prefeitura. A iniciativa propõe a cada três meses a liberação de muros públicos e privados para a realização de grafites. O programa, que deve custar em torno de 800.000 reais, começará na região do Baixo Augusta, no centro de São Paulo, e caberá à pasta da Cultura fazer a curadoria dos artistas, que receberão uma remuneração ainda não divulgada e tintas.
No anúncio, feito na 23 de Maio, desapareceu a menção a outra iniciativa do prefeito. Na semana passada, Doria havia dito que iria criar uma área específica para os grafites (chamada por ele de “grafitódromo”) na região da Mooca, zona leste de São Paulo, nos moldes do que ocorre no bairro de Wynwood, em Miami.
Guerra de paciência
A cruzada de Doria contra os pichadores provocou uma onda de retaliação com novas inscrições contra o prefeito pela cidade. A nova dinâmica parecer ter polarizado também grafiteiros – em geral, defendidos pelo tucano_ e pichadores, que até então conviviam de forma relativamente harmoniosa nos muros de São Paulo – sem atropelar, na maioria das vezes, o trabalho uns dos outros. Alguns artistas que tiveram suas obras poupadas pelo prefeito na 23 de Maio sofreram: o painel de Eduardo Kobra, artista frequentemente elogiado pelo tucano, foi pichado de cinza. Um cartaz lambe-lambe com o rosto de Doria segurando um compressor de tinta também foi colado sobre a obra, que mostrava uma rua de São Paulo na década de 30.
Na avenida Paulista um grupo desconhecido jogou tinta colorida no asfalto em frente à Fiesp e um jovem foi preso por jogar ovos com tinta colorida sobre a estátua do apóstolo Paulo, na Praça da Sé, no centro da capital. Na ciclovia da avenida Sumaré foram escritas frases ofendendo o prefeito, e o muro do estádio do Pacaembu foi pichado com “Chora, Doria“.
Por ora, a escala não dá sinais de arrefecer. Doria afirmou que irá conversar com vereadores para tentar endurecer as multas previstas na lei para quem pichar. “[Pichadores] são agressores, são destruidores. Não vamos fraquejar contra os pichadores. Ou mudam de profissão ou mudam de cidade”, afirmou na quarta-feira. Especialistas e pichadores ouvidos pelo EL PAÍS afirmaram que a estratégia de confrontação adotada pela gestão tucana pode ser um tiro no pé, e incentivar mais jovens a pichar. Os ativistas também temem que a repressão à prática também seja endurecida.
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